Portos no rio Tapajós dobram em 10 anos sob suspeitas de irregularidades e omissões no licenciamento

porto rio Tapajós
M'Boia Produçãoes/Terra de Direitos via APublica

Quase todos os 27 portos no Tapajós em operação em três municípios paraenses cometeram alguma irregularidade no licenciamento ambiental, mostra estudo da Terra de Direitos.

O rio Tapajós costuma ser lembrado por causa da paradisíaca Alter do Chão, chamada de “Caribe da Amazônia”, eleita internacionalmente como um dos mais belos destinos turísticos do Brasil. Entretanto, o curso d’água, que nasce no Mato Grosso, atravessa o Pará e deságua no rio Amazonas, também é usado para escoar a produção agrícola do Centro-Oeste. E é nessa atividade que mora o perigo.

As margens do Tapajós no oeste paraense foram tomadas por instalações portuárias projetadas para o transporte de grãos. O crescimento acelerado – principalmente após a Lei de Portos (nº 12.815/2013) – ocorreu com uma série de lacunas e irregularidades nos processos de licenciamento, como a não realização de estudos de impacto ambiental e a falta de consulta prévia e informada a indígenas, que contribuíram com as violações de Direitos de Povos e Comunidades Tradicionais.

É o que mostra o estudo “Portos e Licenciamento Ambiental no Tapajós: irregularidades e violação de direitos”, lançado pela organização Terra de Direitos. O dossiê integra uma plataforma online sobre o tema.

A pesquisa analisa empreendimentos portuários em Santarém, Itaituba e Rurópolis, cidades-chave na cadeia logística do agronegócio e que são o ponto final de escoamento da produção graneleira exportada para o mercado internacional. Foram considerados apenas portos de cargas (grãos, fertilizantes e outros insumos do setor), excluindo-se portos para turismo ou transporte de pessoas.

O estudo identificou um total de 41 portos (entre previstos, em construção e em operação) nos três municípios até outubro de 2023. Ou seja, mais que o dobro dos 20 empreendimentos portuários em projeto ou operação nessas cidades dez anos antes, em 2013, destacam Agência Pública e ((o))eco.

Dos portos atuais, 27 estão em operação. Mas apenas 5 possuem a documentação completa do processo de licenciamento ambiental – que inclui, nessa ordem, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), a Licença Prévia (LP), a Licença de Instalação (LI) e a Licença de Operação (LO).

O estudo verificou várias irregularidades. Assim, entre as instalações portuárias operantes, 16 possuem LO sem apresentar Licenças Prévia ou de Instalação. Outros 4 portos possuem as 3 licenças – prévia, de instalação e de operação – completas, mas sem apresentar os estudos de impacto ambiental.  

A análise das licenças ambientais partiu de informações do site da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (SEMAS) e por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). A busca apresentou baixo retorno e resultados, o que dá indícios de que as licenças não existem. Além disso, todos os processos de licenciamento analisados apresentaram irregularidades que contrariam algum dispositivo da legislação do Pará.

A falta de disponibilização, transparência e divulgação dos documentos necessários para a concessão das licenças é uma das importantes violações de direitos apontadas no estudo.

“O licenciamento é um instrumento de garantia de direitos socioambientais e que deve ter início sempre que forem pautados projetos com potencial poluidor ou degradador da natureza. E essa natureza tem gente. Sem os ritos necessários e sem o amplo comprometimento e transparência do Estado e das empresas para mensurar, avaliar e reparar o potencial de degradação dos portos, as falhas nas etapas de licenciamento ambiental seguiram violando não somente determinações jurídicas brasileiras, mas tendo efeitos devastadores ao meio ambiente, o clima, e à vida de Povos Tradicionais. Os portos construídos e ainda previstos para a região do Tapajós vêm demonstrando que os interesses das transnacionais se sobrepõem aos de milhares de pessoas que vivem na região”, destacam Bruna Balbi e Lanna Paula Ramos, respectivamente assessora jurídica e jornalista da Terra de Direitos, em artigo no Le Monde Diplomatique.

Em tempo: Após investigar denúncias de pescadores e ribeirinhos, a Polícia Civil do Pará indiciou a empresa Barra do Pará pelo completo desaparecimento da ilha Camará, com cerca de 13 hectares, na Reserva Extrativista (RESEX) Marinha Mestre Lucindo. A RESEX fica em Marapanim, na região costeira conhecida como salgado paraense, a cerca de 165 km de Belém. De acordo com um laudo científico da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), feito a pedido da Polícia Civil, o sumiço da ilha foi provocado por erosão pela passagem de lanchas de praticagem da empresa Barra do Pará em alta velocidade pelo rio Cajutuba, onde a ilha estava localizada. Com isso, Camará foi se decompondo até ficar submersa, informam g1 e Diário do Centro do Mundo.

 

ClimaInfo, 2 de maio de 2024.

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