À medida que as ações contra a mudança do clima vão ganhando corpo, investidores por todo o mundo estão preocupados com o valor de seus ativos fósseis. Muitos estão desinvestindo – ou seja, retirando investimentos – de empresas envolvidas em produção, uso ou financiamento de carvão, gás e petróleo.
A vasta maioria das emissões de dióxido de carbono causadas pelos humanos é gerada pela queima de combustíveis fósseis.[1] O comprometimento da comunidade internacional em limitar o aumento da temperatura global em níveis „bem abaixo dos 2°C“, seguindo o acordo da mudança do clima de 2015[2], em Paris, sugere que seu uso provavelmente cairá de modo dramático durante as próximas décadas.[3] Quase toda a reserva de carvão do mundo, e uma significativa parcela das reservas de petróleo e de gás, não poderão ser queimadas se o mundo se ativer aos compromissos feitos em Paris.[4]
Isso é mais ou menos a mesma coisa que dizer que os recursos fósseis vão ficar „encalhados», não serão mais capazes de gerar retornos lucrativos. Os investidores arriscam-se à exposição a uma «bolha de carvão» conforme o valor de seus investimentos caem.[5] Mais de 2 trilhões de dólares em ativos de carvão, petróleo e gás, globalmente, podem ficar encalhados, de acordo com o think tank Carbon Tracker.[6] Muitos investidores também demonstram um senso de responsabilidade moral em relação ao financiamento de atividades que causem mudanças no clima. A combinação desses dois fatores sugere que muitos estão considerando o desinvestimento.
Os impactos do desinvestimento
Os desinvestimentos têm causado impacto direto no valor das empresas de combustíveis fósseis. Quando o Fundo Soberano de investimentos da Noruega propôs terminar com os investimentos em petróleo e gás, em novembro de 2017, o preço das ações das maiores companhias de petróleo e gás caíram imediatamente – a Shell caiu em 2,5% e a ExxonMobil, em 1,3% (ver imagem abaixo).[7] Após os fundos de pensão da Califórnia anunciarem a sua retirada de investimentos do carvão, em 2015, o preço das ações das maiores empresas mineradoras locais despencaram, incluindo a Peabody Energy, em 8,8%, e a Arch Coal, em 11%.[8]
Os investidores que migraram dos combustíveis fósseis, de modo geral, se tornaram muito mais rentáveis. O Fundo Soberano da Noruega cresceu 0,78% em 10 anos em função do seu desinvestimento das companhias de carvão e de outras que causavam danos ambientais.[9] Índices que excluem combustíveis fósseis também superaram a performance de seus equivalentes que incluíam companhias de combustíveis fósseis.[10]
O desinvestimento em combustíveis fósseis libera os investimentos para a energia limpa. Por exemplo, o Fundo de Pensão holandês PFZW, que vale 161 bilhões de euros, comprometeu-se a desinvestir dos fósseis ao mesmo tempo que quadruplicaria os seus investimentos em soluções para a mudança do clima.[11] Após retirar os fundos do carvão, e petróleo e gás de xisto e areias asfálticas, a BNP Paribas aumentou seus financiamentos em energias renováveis em aproximadamente 8 bilhões de euros.[12]
O desinvestimento de combustíveis fósseis também equivale a menores riscos para a estabilidade do sistema financeiro em relação à bolha de carbono .[13] Finalmente, a atenção voltou-se para a não-sustentabilidade da indústria dos combustíveis fósseis. O principal propósito do desinvestimento é questionar a aceitação pública das indústrias de carvão, petróleo e gás – particularmente quando os menores investidores desistem dos combustíveis fósseis e encorajam os maiores investidores a fazerem o mesmo.
Índice de energia STOXX 600 após a proposta do Fundo Soberano da Noruega de abandonar o petróleo e o gás (fonte)
Desinvestimentos ganhando impulso
Até o momento, 811 instituições com ativos no valor de 5,58 trilhões de dólares – o tamanho da economia do Japão – anunciaram que estão retirando fundos dos combustíveis fósseis.[14] Além disso, mais de 58.000 pessoas sacaram um total de 5,2 bilhões de dólares das empresas de combustíveis fósseis.[15]
Os maiores anúncios de desinvestimentos recentes incluem:
- Em junho de 2015, o Parlamento da Noruega votou pela venda dos investimentos em carvão de seu Fundo Soberano de 900 bilhões de dólares,[16] o maior do mundo. Até 2017, já havia excluído 69 empresas em função de sua dependência do carvão.[17] Em novembro de 2017, o Banco Central Norueguês, que gerencia o fundo, propôs que também abandonem ativos de petróleo e gás.[18]
- Em novembro de 2017, o maior fundo de pensão privada da Noruega, o Storebrand, lançou um novo fundo livre de combustível fóssil no valor de 1,1 bilhão de euros e fortaleceu os seus critérios de desinvestimento em carvão.[19]
- O BNP Paribas anunciou em outubro de 2017 que deixaria de prover fundos para companhias ligadas à extração de petróleo e gás de xisto e de areias asfálticas. Eles já haviam anunciado previamente que não fundeariam mais projetos de carvão.[20]
- Em junho de 2017, o CaISTRS, o maior fundo de pensão da Califórnia, anunciou que iria desinvestir de térmicas a carvão estrangeiras.[21]
- Em abril de 2017, o PKA, o maior fundo de pensão Dinamarquês, que possui 35 bilhões de dólares em ativos, vendeu seus investimentos em seis companhias produtoras de petróleo e está considerando futuros desinvestimentos.[22]
- O maior fundo nacional de pensão da Suécia, o AP7, anunciou, em março de 2017, a venda de seus ativos em seis companhias que foram acusadas de terem violado o Acordo de Paris.[23]
- O Parlamento da Irlanda votou por abandonar seus ativos de carvão, petróleo e gás de seu Fundo Soberano, em janeiro de 2017.[24]
- Em janeiro de 2017, o Banco Holandês anunciou que cessaria os financiamentos de novo projetos de carvão e iria buscar reduzir sua exposição a recursos de carvão.[25]
- Em 2016, os maiores 37 bancos da Austrália, Canadá, China, Europa, EUA e Japão reduziram seus investimentos em recursos de combustível fóssil em 22%.[26]
- Em março de 2016, a financiadora e banqueira JPMorgan anunciou que cortaria novos investimentos de carvão em países desenvolvidos.[27]
- Em novembro de 2015, a seguradora Allianz anunciou que iria desinvestir de empresas de carvão até março de 2016.[28]
- Em junho de 2017, a Divulgação Financeira da Força Tarefa sobre o Clima (TCFD, Task Force on Climate Related Financial Disclosures, em inglês)[29] publicou recomendações para as empresas divulgassem seus riscos climáticos e as estratégias para lidar com esses riscos. Se os investidores seguirem as recomendações do TCFD, trilhões de dólares serão desviados dos combustíveis fósseis para a energia limpa.[30]
Os diferentes critérios de desinvestimento
Os investidores utilizam diferentes critérios para decidir sobre em quais companhias irão desinvestir, como por exemplo:
- O Fundo Soberano da Noruega exclui empresas que possuem pelo menos 30% do seu faturamento ou atividades em térmicas a carvão.[31]
- A Storebrand exclui empresas de serviços com significativa geração de energia a carvão e empresas de qualquer tipo que planejem construir plantas a carvão com 1GW de capacidade, além de empresas com mais de 30% de faturamento advindo de carvão.[32]
- A BNP Paribas exclui companhias cujos maiores negócios sejam em petróleo de xisto ou gás de areias asfálticas. Ela também não financia mais projetos de petróleo e gás no Ártico, minas de carvão ou plantas de energia movidas a carvão.[33]
- A Zurich exclui empresas que dependam de carvão para pelo menos 50% do seu negócio.[34]
Alguns investidores argumentam que trabalhar junto com as empresas de combustível fóssil é uma maneira melhor para se reduzir as emissões. Por exemplo, em maio de 2017, os acionistas da ExxonMobil apoiaram uma resolução que requeria que as maiores empresas petrolíferas publicassem uma análise anual do impacto das políticas climáticas em seus negócios. O tamanho do voto a favor indica que todos todos os três maiores acionistas da Exxon, Vanguard, BlackRock e State Street, apoiaram a resolução.[35]
Entretanto, há controvérsias sobre se essa abordagem coloca pressão suficiente nas empresas cujos modelos de negócios dependem altamente do uso dos combustíveis fósseis.[36] Alguns dos maiores investidores, tais como Aviva[37] e Legal & General[38], disseram estar preparados para desinvestir das empresas que não corresponderem aos seus compromissos.
[1] https://www.earth-syst-sci-data-discuss.net/essd-2017-123/essd-2017-123.pdf
[2] https://unfccc.int/resource/docs/2015/cop21/eng/l09.pdf
[3] https://www.carbonbrief.org/iea-world-can-reach-net-zero-emissions-by-2060-meet-paris-climate-goals
[4] https://www.nature.com/articles/nature14016
[5] https://www.carbontracker.org/reports/stranded-assets-danger-zone/
[6] https://www.carbontracker.org/wp-content/uploads/2017/08/CAR3817_Synthesis_Report_24.11.15_WEB2.pdf
[7] https://www.ft.com/content/611c2e9e-cad9-11e7-aa33-c63fdc9b8c6c
[8] http://www.stltoday.com/business/local/peabody-shares-hit-as-it-s-booted-from-index-and/article_fa934882-1aef-58a5-afe1-51465a3dea36.html
[9] https://uk.reuters.com/article/uk-norway-swf/norways-wealth-fund-says-ethics-profile-has-cost-1-4-billion-in-a-decade-idUKKBN16S13D
[10] https://cdn.friendsoftheearth.uk/sites/default/files/downloads/local%20authority%20pension%20activist%20briefing%20NOV%202017%20FINAL_0.pdf
[11] https://www.ipe.com/countries/netherlands/dutch-pension-fund-pfzw-vows-to-halve-carbon-footprint/10010787.fullarticle
[12] https://group.bnpparibas/en/press-release/bnp-paribas-dedicates-e15bn-financing-renewable-energy-reinforces-carbon-risk-management-policies
[13] https://www.cbd.int/financial/doc/carbon-bubble.pdf
[14] https://gofossilfree.org/divestment/commitments/
[15] https://gofossilfree.org/divestment/commitments/
[16] https://www.reuters.com/article/idUSL5N0YR2WP20150605
[17] https://www.reuters.com/article/us-norway-swf-ethics/exclusive-norways-wealth-fund-may-blacklist-firms-over-emissions-corruption-risk-idUSKBN16G0YQ?il=0
[18] https://www.theguardian.com/business/2017/nov/16/oil-and-gas-shares-dip-as-norways-central-bank-advises-oslo-to-divest
[19] https://www.businessgreen.com/bg/news/3009072/norwegian-pension-giant-storebrand-launches-eur11bn-fossil-free-fund
[20] https://www.ft.com/content/709650a4-adf9-11e7-aab9-abaa44b1e130
[21] https://www.reuters.com/article/us-california-calstrs-coal/calstrs-agrees-to-divest-non-u-s-thermal-coal-assets-idUSKBN18Z044
[22] https://www.ft.com/content/389032d8-203c-11e7-b7d3-163f5a7f229c
[23] https://www.reuters.com/article/us-climatechange-investment-sweden/swedish-pension-fund-sells-out-of-six-firms-it-says-breach-paris-climate-deal-idUSKBN1962CC
[24] http://www.climatechangenews.com/2017/01/26/irish-lawmakers-vote-to-divest-from-fossil-fuels/
[25] http://www.mining.com/deutsche-bank-wont-finance-any-coal-projects-any-longer/
[26] http://priceofoil.org/content/uploads/2017/06/Banking_On_Climate_Change_2017.pdf
[27] https://www.bloomberg.com/news/articles/2016-03-07/jpmorgan-won-t-finance-new-coal-mines-that-worsen-climate-change
[28] https://www.allianz.com/v_1448622620000/media/responsibility/Energy_Guideline_PublicVersion_final.pdf
[29] https://www.fsb-tcfd.org/wp-content/uploads/2017/06/FINAL-TCFD-Report-062817.pdf
[30] https://www.euractiv.com/section/energy-environment/news/business-leaders-back-g20-task-force-recommendations-on-climate-risk-disclosure/
[31] https://www.nbim.no/en/transparency/news-list/2016/first-coal-exclusions-from-the-government-pension-fund-global/
[32] https://www.mynewsdesk.com/no/storebrand-asa/pressreleases/storebrand-excludes-another-10-coal-companies-2277254
[33] http://www.bnpparibas.com.cn/en/2017/10/11/bnp-paribas-takes-further-measures-to-accelerate-its-support-of-the-energy-transition/
[34] https://unfriendcoal.com/2017/11/15/leading-insurance-companies-divest-20b-from-coal-and-end-underwriting/
[35] https://www.ceres.org/news-center/press-releases/exxonmobil-investors-make-history-majority-vote-climate-risk-disclosure
[36] https://cdn.friendsoftheearth.uk/sites/default/files/downloads/local%20authority%20pension%20activist%20briefing%20NOV%202017%20FINAL_0.pdf
[37] https://www.aviva.com/content/dam/aviva-corporate/documents/socialpurpose/pdfs/Avivas_strategic_response_to_climate_change_-_2016_update_ysSf6TN.pdf, p29
[38] http://www.legalandgeneralgroup.com/media-centre/press-releases/press-releases.asp?newsid=2973