ClimaInfo, 13 de dezembro de 2018

13 de dezembro de 2018

Acordo de Paris: Bolsonaro se equivoca em gênero, número e grau

Em uma de suas já conhecidas lives no Facebook, o presidente eleito disse ontem que o Acordo de Paris “exige que o Brasil faça um reflorestamento de uma área enorme, algumas vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro”. Bolsonaro está totalmente equivocado. O Acordo não “exige” nada. Pelo contrário, ele foi montado com base nas promessas feitas soberanamente pelos países (as Contribuições Nacionalmente Determinadas – NDC). E tudo o que o Estado brasileiro colocou em sua NDC foi resultado de consultas feitas pelo então governo junto a vários setores da sociedade, incluindo indústria e agronegócio. Além disso, a NDC brasileira não promete reflorestar uma área várias vezes maior que a do estado do Rio de Janeiro. Na verdade, no capítulo sobre Meios de Implantação, a NDC brasileira fala em reflorestar 12 milhões de hectares, menos de ⅓ da área do Rio. Este reflorestamento é bom para o país e para a economia, e está sendo feito já em grande parte pelo próprio agronegócio, por meio da técnica de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF).

Bolsonaro disse também que não é possível cumprir esta meta e que as “sanções vêm aí: num primeiro momento sanção política, num segundo momento sanção econômica, num terceiro momento sanção de força”. Gostaríamos de saber do presidente eleito quais são as sanções previstas no Acordo, pois a equipe do ClimaInfo as desconhece. Aliás, se existe alguma crítica a ser feita ao Acordo é que as NDCs propostas inicialmente pelos países são fracas demais para que seus objetivos de longo prazo sejam alcançados e que o Acordo não é legalmente vinculante; não existe em seu texto previsão de sanção de qualquer espécie.

Bolsonaro também disse: “Vamos sugerir mudanças no Acordo de Paris. Se não mudar, sai fora (sic). Quantos países não assinaram? Por que o Brasil tem que dar uma de politicamente correto?”. Alguém precisa dizer para ele que 195 países assinaram o Acordo.

O Globo reportou a live e faz algumas observações sobre as falas do presidente eleito. O Estadão também escreveu sobre a live.

 

Três problemas autoimpostos por uma eventual saída do Brasil do Acordo de Paris

Um dos principais negociadores norte-americanos da era Obama, Jonathan Pershing, listou ao Valor três problemas que o Brasil terá que enfrentar caso a dupla Bolsonaro-Araújo decida tirar o país do Acordo de Paris. O primeiro diz respeito à mudança climática em si, em função da vulnerabilidade climática da produção agropecuária e de sua importância para a economia nacional. O segundo é a perda de relevância do país no contexto internacional, já que o Brasil sempre foi protagonista nas negociações climáticas e influenciou várias decisões; sair do Acordo é deixar que outros decidam o que, de uma forma ou de outra, terá que ser feito. O último diz respeito aos negócios; empresas e países cada vez mais engajados na luta pela estabilização do clima darão preferência a quem estiver batalhando lado a lado.

 

Fim de feira no Congresso quer reduzir a área de 3 Unidades de Conservação

Faltando menos de dez dias para o encerramento desta legislatura, uma comissão mista do congresso aprovou, a toque de caixa, ‘jabutis’ que reduzem o tamanho dos parques nacionais de São Joaquim e de Brasília e da Floresta Nacional de Brasília. Os textos foram inseridos numa Medida Provisória feita para cuidar de propriedades da extinta Rede Ferroviária Federal apresentada pelo governo em setembro. Segundo o WWF, “existe, ao menos, um problema jurídico nessas emendas: a alteração do grau de proteção, a extinção ou a redução dos limites de parques nacionais e outras unidades de conservação (UCs) não podem ser realizadas por meio de medida provisória.” Caso o plenário do congresso aprove essa medida, com certeza o caso irá parar na justiça.

 

Futuro Ministro do Meio Ambiente dos ruralistas enfrentará as cortes

Ricardo Salles, indicado por Bolsonaro para o MMA, é réu em um processo por improbidade administrativa referente ao curto período em que foi secretário do meio ambiente do estado de São Paulo. Acabou perdendo o posto por causa deste processo. Ontem, o Ministério Público Eleitoral ajuizou uma outra ação no Tribunal Regional Eleitoral contra Salles por abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social nas eleições de 2018. O futuro ministro começou sua campanha para a câmara antes do início do período eleitoral.

Bruno Boghossian escreveu na Folha que as declarações de Salles deixam claro que o meio ambiente estará subordinado aos ruralistas. Como se ainda fosse preciso confirmação, a futura ministra da agricultura, Tereza Cristina, afirmou ontem que os produtores rurais poderão contar com um ministério do meio ambiente mais alinhado com a agricultura.

 

A Total quer explorar petróleo no mar da Guiana Francesa

Na semana passada, o Ibama negou a licença para a petroleira francesa Total iniciar a exploração nas proximidades dos recifes de coral da foz do rio Amazonas. O Ibama entendeu que as explicações dadas sobre os riscos não foram suficientes. Ontem, a Total fez um convite a ONGs para que estas acompanhem os trabalhos de exploração que fará um pouco ao norte das área originais, mas já em águas da Guiana Francesa. Junto com o convite, a Total não muito simpaticamente lembrou que a legislação francesa proíbe a navegação de qualquer embarcação não autorizada a uma distância inferior a 500 metros dos poços. E acrescentou que “o recife mais próximo identificado está a 30 quilômetros do ponto de perfuração e não é um coral.”

Bem, no mapa, a exploração parece estar muito próxima dos corais.

 

A eletrificação da Volkswagen

A Volkswagen anunciou que lançará em 2026 sua última linha de motores a combustão. A empresa não acredita que veículo híbrido seja uma tecnologia de passagem razoável e irá direto do motor a combustão interna para o elétrico puro. A empresa separou US$ 70 bilhões para o desenvolvimento dos veículos elétricos, principalmente para as baterias, e fez uma joint-venture com a cadeia de supermercados Tesco para a instalação de estações de recarga grátis em 600 lojas da cadeia no Reino Unido. A VW faz parte da Iniciativa EV (veículo elétrico), junto com outras montadoras e fabricantes de equipamentos.

 

O carvão perde espaço e é um risco para o mundo financeiro

O Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento decidiu parar de investir e financiar operações que envolvam carvão, desde projetos de exploração até usinas termelétricas. “Mascarar o carvão como se fosse uma salvação para os mais pobres é uma ofensa a eles. Existem maneiras mais baratas para levar eletricidade para quem ainda não a tem”, disse Rachel Kyte, especialista em energia da ONU.

Enquanto investidores europeus querem cada vez mais distância do carvão, os norte-americanos continuam muito expostos. A BlackRock tem, em seu portfólio de investimentos, a maior reserva de carvão do mundo. Segundo a Axios, 42% das térmicas a carvão do mundo dão prejuízo e, nos EUA, 25% do carvão vendido vai para plantas que anunciaram que fecharão em breve. Isso sem falar na imagem ambiental negativa destas operações.

A indústria acha que sua boia de salvação é o desenvolvimento da tecnologia de captura e armazenamento de carbono. Estima-se que o preço deste desenvolvimento seja da ordem de US$ 100 bilhões por ano, algo que as carvoeiras não conseguirão bancar. A indústria norte-americana do carvão está apelando para que o governo Trump banque a conta. A Bloomberg não foi muito simpática à ideia: “alguns dos maiores produtores de combustíveis fósseis do mundo pedem aos contribuintes ajuda para se livrar do seu vício poluidor”.

 

Maior energética alemã bate o recorde de geração renovável do país

A e.on, a maior empresa de eletricidade da Alemanha, deve fechar o ano com a geração de 200 TWh (bilhões de kWh) a partir de fontes limpas, 5 TWh a mais do que no ano passado. Para comparação, o consumo de eletricidade no Brasil, no ano passado, foi de 530 TWh, dos quais 43 TWh vieram das eólicas e fotovoltaicas.

 

A transição justa e os mercados de carbono

O conflito com os “coletes amarelos” franceses deixou clara a necessidade de diálogo com os vários segmentos da sociedade para o uso dos preços dos combustíveis como instrumento para a contenção do aquecimento global. Aliás, a greve dos caminhoneiros de maio mostrou o estrago que pode acontecer, mesmo sem a desculpa climática por trás. Sergio Leitão, do Escolhas, escreveu um artigo relevante para esta discussão: “o dilema vivido pelo presidente francês mostra como é complexa a tarefa da transição global para uma economia de baixo carbono frente ao desafio climático. Afinal, ninguém quer pagar essa conta.” Leitão aproveita para comentar o que transparece sobre o novo governo: “A exemplo dos Estados Unidos, o novo governo brasileiro tem dado sinais contrários a essa agenda, negando as mudanças climáticas e qualquer iniciativa que busque estimular uma economia de baixo carbono (…) Agora, frente aos desafios das mudanças climáticas e a necessidade da redução da dependência dos combustíveis fósseis, basta saber se o novo governo vai ter a mesma determinação ou continuará negando o problema.”

O tema da precificação das emissões por meio de mecanismos de mercado foi tratado de forma genérica no texto do Acordo de Paris. Espera-se que o Livro de Regras para a implantação do Acordo seja fechado na COP24. Este conterá um capítulo especial sobre este mercado. Países com potencial de geração de créditos de carbono, como o Brasil, a China e a Índia, pressionam pela criação de um mercado global. Os europeus, que têm muita experiência com seu mercado, colocam obstáculos dizendo que é preciso zelar pela integridade ambiental destes créditos e eliminar o risco de dupla contagem na redução de emissões. A jornalista Daniela Chiaretti disse no Valor que é preciso evitar “que o que não foi emitido pelo país que vendeu os créditos seja contabilizado pelo comprador e também pelo vendedor”.

Esta semana, o The Guardian publicou duas notícias sobre os créditos de carbono gerados sob o manto do Protocolo de Quioto. A Nova Zelândia decidiu que não aceitaria esses créditos para o cumprimento de suas metas climáticas. A justificativa aponta para a contabilidade duvidosa gerada por esses créditos. Já a Austrália, às voltas com um governo conservador comprometido com a indústria do carvão, vê nesses mesmos créditos um jeito para se limpar mais verde – fazer greenwashing. O país, nas palavras do Guardian, “parece inclinado a usar a controversa brecha de Quioto”.

 

Entre as paredes da COP24

– O presidente do IPCC, Hoesung Lee, disse aos delegados nacionais que o mundo precisa “fazer mais e urgentemente” para evitar impactos piores da mudança do clima. Segundo a AP,  ao falar sobre o Relatório 1,5oC, Lee avisou que “o relatório mostra a necessidade, não apenas de ações justas, como de ações urgentes”.

– Numa demonstração de pouco interesse dos mais de 130 países presentes, apenas 4 chefes de estado estão na Polônia. Os demais estão representados por ministros. Dentre eles, o Brasil. Para a Reuters, é muito pouco para o tamanho do problema climático.

– A discussão sobre o tema das “Perdas e Danos” empacou. Segundo a EuroActiv, o desentendimento é sobre como se reconhece um impacto climático no Livro de Regras, e se e como compensar países pobres pelos seus efeitos.

 

Mudança do clima é provavelmente uma das forças que empurram a caravana de migrantes da América Central para os EUA

A mudança do clima tem sido negligenciada como possível fato gerador da caravana de migrantes da América Central para os EUA, segundo relata a CNN: “O ‘corredor da seca’ da América Central, que inclui partes de Honduras, Guatemala, El Salvador e Nicarágua, tem sofrido uma seca incomum nos últimos cinco anos. As colheitas estão quebrando. A fome está à espreita. Mais de dois milhões de pessoas estão em risco de fome na região, de acordo com um relatório de agosto da FAO, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação.” A CNN acrescenta que essa seca foi mais longa e intensa do que as observadas anteriormente e, enquanto estudos “não atribuem definitivamente esta seca especial à mudança climática (…) modelos computacionais mostram que secas como a que está acontecendo agora estão se tornando mais comuns enquanto o mundo aquece.”

Por conta desta e de muitas outras crises migratórias passadas e futuras, 165 países assinaram o Pacto Global para Migração Segura, Ordenada e Regular sob auspícios da ONU. O Brasil assinou, mas, logo a seguir, o futuro chanceler Ernesto Araújo declarou, nada diplomaticamente, que “o governo Bolsonaro se desassociará do pacto global de migração, um instrumento inadequado para lidar com o problema. A imigração não deve ser tratada como questão global, mas sim de acordo com a realidade e a soberania de cada país”.

 

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