ClimaInfo, 18 de março de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Bolsonaro nos EUA

A viagem de Bolsonaro aos EUA ocupará um bom espaço da mídia nesta semana, mas trará poucos resultados e muitos riscos. Um dos resultados esperados é o acordo militar para alugar/emprestar a base de Alcântara para lançamento de satélites. Espera-se também a criação de um fórum de discussão de oportunidades de investimento em energia, especialmente nas áreas de petróleo, gás e energia nuclear.

Por falar em energia e relações internacionais, na semana passada o governo falou em abrir a extração de urânio no país a empresas internacionais. Esse era um anátema até há pouco, pelo valor estratégico-militar visto pelos militares no programa nuclear brasileiro. O ministro das minas e energia disse que o país não tem recursos para explorar suas reservas e que terá que atrair parceiros estrangeiros para tanto. Bento Albuquerque deve estar olhando principalmente para as ocorrências associadas a outros minerais, como aqueles encontrados no Amazonas, e para as promissoras áreas nas proximidades de Carajás, no Pará. Reuters, Exame, DCI e Bloomberg deram a notícia. Segundo a Bloomberg, talvez futuras usinas nucleares façam parte do cardápio da viagem.

Em tempo: esperava-se que a viagem de Bolsonaro aos EUA pudesse ajudar o produtor brasileiro de carne, mas o assunto nem entrou na pauta.

 

Acordo comercial EUA-China ameaça o agro-pop-tech-tudo

Os EUA e a China devem assinar um acordo para encerrar a guerra comercial iniciada por Trump. Neste, a China deve prometer aumentar as importações de produtos do agronegócio dos norte-americanos. Com isso, o consumidor chinês pagará mais caro pelos produtos e o produtor brasileiro perderá – ao menos em parte – seu melhor freguês. Para Marcos Jank, o acordo traz riscos sérios para a pauta exportadora do agronegócio brasileiro: “Se esse acordo se concretizar, poderemos estar entrando numa era de ‘comércio administrado’ caso a caso, sob a égide de interesses geopolíticos, que pode reduzir o nosso acesso à China, ao Brics e a outros mercados emergentes. Aí, sim, estaríamos entregando a nossa alma.” Esta tal “alma” apareceu também na semana passada numa fala do chanceler Ernesto Araújo: “Nós queremos vender soja e minério de ferro, mas não vamos vender nossa alma. Isso é um princípio muito claro. Querem reduzir nossa política externa simplesmente a uma questão comercial, isso não acontecerá”. Ruralistas reclamaram desta nova investida contra seu negócio, eles que vêm lutando em frentes: contra o antiglobalismo, que se alinha automaticamente aos EUA, seu maior concorrente, e contra a agenda do ministro da economia que quer retirar do setor subsídios e privilégios. A esse respeito, Jank disse que “precisamos nos libertar da dependência do crédito rural subsidiado, de tabelamentos e subsídios de fretes, de assentamentos rurais desnecessários e da ideia anacrônica da taxar exportações”, mas ele pede que a libertação seja lenta e gradual para que não prejudique demais os produtores.

Há pouco mais de um ano, ele escrevia que “investimentos em tecnologia, ganhos de escala e subsídios a insumos modernos transformaram a China em uma potência agrícola. O país virou o 3o maior exportador de agro do mundo, à frente do Brasil (…) Estamos condenados a nos casar com a China, de alguma forma. Mas até aqui foi ela quem deu corda e dominou a relação, pois pensa estrategicamente e sabe perfeitamente o que quer. Nós somos o oposto da China: ansiosos, imediatistas, individualistas e meio esquizofrênicos”. Jank não imaginava o quanto.

 

Em Nairobi, Salles anuncia como novidade acordo feito pelo MMA com os EUA no ano passado

O ministro Salles aproveitou o palco de Nairobi para fazer um anúncio um tanto confuso. À Dani Chiaretti, do Valor, ele disse que “queremos financiar atividades privadas. Não é governo nem ONGs. O foco é o pessoal do setor privado, pequenos empreendedores. Estamos pensando em trabalhar com entidades representativas de diferentes setores – o pessoal da castanha, da borracha, da madeira, do manejo florestal. Pensamos que seja uma boa iniciativa trazer para o mercado pessoas que têm bons projetos, boas ideias, mas não têm recursos. Não é doação. O empreendedor é responsável pela devolução do recurso.”

Salles contou que serão disponibilizados recursos da ordem de US$ 100 milhões, vindos da Amazon Impact Investment Partnership na forma de financiamento de empreendimentos do setor privado com prazo de carência e juros baixos. O que Salles não disse é que a iniciativa vem sendo maturada há alguns anos, e que duas organizações da sociedade civil, Sitawi e Idesam, estão à sua frente. Salles também não contou que, em agosto passado, o MMA assinou um acordo com os EUA para um “programa de cooperação técnica Brasil-Estados Unidos (que) intensificará a atuação na conservação dos recursos biológicos da Amazônia, investindo até 80 milhões de dólares nos próximos cinco anos.”

 

Fapesp ajuda a publicar a ciência para todos

Dia desses comentamos sobre as editoras de publicações científicas não abrirem os papers ao público, muitos deles financiados com dinheiro público. Na semana passada, a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que investe muitos recursos em pesquisa acadêmicas, anunciou uma nova política: “autores de artigos que resultem de projetos e bolsas financiados pela Fundação devem assegurar que uma cópia dos trabalhos fique disponível em repositórios públicos”. Para isso, precisam divulgá-los em revistas que permitam deixar uma cópia dos artigos em um repositório público, onde possa ser consultado na web por qualquer pessoa.

 

Balanço da greve dos estudantes da 6a feira: fosse o clima um banco, já teria sido salvo

Estima-se que 1,4 milhão de estudantes deixaram de ir à escola para protestar contra a inação climática de governantes na 6a feira passada, 15 de março de 2019. Os manifestantes exigiram ação já. Houve manifestações em quase duas mil cidades de mais de cem países. O site de apoio à organização tem um mapa coalhado de pontos onde ocorreram manifestações. Também é possível encontrar relatos de muitos deles. O título desta nota foi tomado de uma das frases mais eloquentes que estiveram estampadas em cartazes nas manifestações. O site da Vox publicou uma longa e impressionante coleção de fotos das manifestações de todo o mundo. A mídia mundial deu muitas matérias a respeito, vale destacar, lá fora, a CNN, o The Guardian e o New York Times. No Brasil, aconteceram manifestações em várias cidades, mas modestas se comparadas ao que aconteceu lá fora. Bárbara Lopes, do Colabora, e Ana Carolina Amaral, da Folha, falaram com jovens que participaram do movimento e analisaram a pouca receptividade da bandeira por aqui. Marcelo Leite também escreveu sobre o movimento.

Na edição da sexta de manhã, Giovana Girardi explicou porque o movimento conseguiu mobilizar o mundo todo. Giovana conversou com a menina sueca Greta Thünberg, aquela que, em agosto do ano passado, começou a faltar às aulas para se sentar na frente do Parlamento sueco com cartazes dizendo:“Algumas pessoas dizem que nós deveríamos estar na escola. Mas por que deveríamos estar estudando por um futuro que em breve não mais existirá e enquanto ninguém está fazendo nada para salvar esse futuro? Qual é o sentido de aprender informações no sistema educacional, quando as informações mais importantes dadas pelos melhores cientistas desse mesmo sistema educacional claramente não significam nada para os nossos políticos e a nossa sociedade?” Giovana perguntou sobre as expectativas de Greta para o movimento: “Tudo o que devemos fazer agora é continuar em frente. Não importa o que acreditamos ou se há esperança. Tudo o que temos de focar é em continuar fazendo essas ações até que a mudança real comece a acontecer”. O Globo também deu destaque ao movimento.

 

Sobre a Assembleia da ONU Meio Ambiente

Terminou na 6a feira a reunião da Assembleia da ONU Meio Ambiente em Nairóbi. A reunião começou sob o trauma provocado pelo acidente com o avião da Ethiopean, no qual morreram cientistas e delegados que estavam a caminho da reunião. Durante a semana foram lançados trabalhos importantes sobre a crise dos recursos naturais, sobre a situação atual e as perspectivas para o futuro. Sobre este último estudo, a ONU destaca que “o relatório, produzido por 250 cientistas de mais de 70 países, afirma que, se não ampliarmos drasticamente a proteção ambiental, cidades e regiões na Ásia, no Oriente Médio e na África poderão testemunhar milhões de mortes prematuras até a metade do século. A publicação também alerta que os poluentes presentes em nossos sistemas de água potável farão com que a resistência antimicrobiana se torne a maior causa de mortes até 2050 e com que disruptores endócrinos afetem as fertilidades masculina e feminina, bem como o desenvolvimento neurológico infantil”. A propósito do relatório, Dani Chiaretti, do Valor, escreve que “bastariam, contudo, investimentos da ordem de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) global em decisões ambientalmente sustentáveis para enfrentar os danos das mudanças climáticas, da escassez hídrica e da perda de biodiversidade.” Daniela traz outro ponto importante para a compreensão da situação atual: “Existem 100 mil produtos químicos em uso, e menos da metade destes teve seus impactos testados. Perto de ⅖ das pessoas não têm acesso a aterros sanitários. As perdas de alimento chegam a mais de 36% do que se produz, sendo 55% nos países ricos. Dietas com menor consumo de carne e redução no desperdício de comida poderiam diminuir em 50% a necessidade de produção de alimentos para mais de 9 bilhões de pessoas em 2050”. Joyce Msuya, diretora interina da ONU Meio Ambiente, disse que “chegamos aos limites do planeta (…) Não podemos mais atrasar ações para proteger as pessoas e o planeta. Não podemos mais crescer agora e deixar para limpar depois”.

Das resoluções que não foram aprovadas na Assembleia, destacam-se:

– uma em prol do desmatamento zero, que não avançou porque o Brasil insistiu em colocar a palavra “ilegal” antes do “zero”, coisa que os europeus não aceitaram;

– a criação de um grupo de trabalho que proporia um esquema de governança para as experiências e o desenvolvimentos de tecnologias de geoengenharia, que não avançou porque os EUA não querem compartilhar conhecimentos e alegaram tratar-se de um tema afeito à Convenção do Clima,  como se o clima fosse uma entidade separada do meio ambiente; e

– a proposta de um instrumento vinculante para a restrição do uso de plásticos, porque os EUA e o Japão pediram mais estudos, o que, na prática, adia qualquer decisão para um futuro não muito próximo.

 

Banco Mundial e AfDB alocam US$ 47 bilhões para a África enfrentar a mudança do clima

O Banco Mundial e o AfDB (Banco Africano de Desenvolvimento) anunciaram que colocarão US$ 47 bilhões para ajudar o continente a enfrentar as mudanças climáticas. A África é, junto com uma parte do Sudeste da Ásia, a região mais vulnerável do planeta às mudanças do clima. O AfDB disponibilizará US$ 25 bilhões para projetos de energia renovável até 2025. O presidente do AfDB, Akinwumi Adesina, disse que, desde 2015, 95% do portfólio de operações do banco é dedicado às energias limpas. O Banco Mundial também apoia a difusão das fontes limpas, mas separa recursos para capacitar os países a enfrentar situações de emergência climática, buscando aumentar a resiliência de países e comunidades por meio de investimentos em monitoramento e prevenção, no reforço de estruturas para pronto atendimento de emergências e na reconstrução da infraestrutura e de abrigos.

 

Usina solar flutuante alimenta mina de cobre no Chile

Uma das principais minas de cobre do Chile, a Los Bronces, começa a receber eletricidade de 256 painéis fotovoltaicos que flutuam na superfície do lago de sua barragem de rejeitos. Além dos 86 kWp, os painéis reduzem a evaporação da água que é reutilizada em aplicações industriais. O Ministro de Minas chileno, Baldo Prokurica, declarou que “é uma excelente alternativa para gerar energia e melhorar o uso da água.”

 

O inevitável aquecimento do Ártico

Mesmo se o mundo cumprir o Acordo de Paris, a temperatura média no inverno Ártico vai, irremediavelmente, subir de 3 a 5°C até 2050, e de 5 a 9°C até 2080, diz o Global Linkages- A graphic look at the changing Artic, relatório sobre o aquecimento do Ártico lançado na semana passada na reunião da ONU Meio Ambiente. Além do aquecimento, o extremo norte do planeta ainda sofrerá os impactos da acidificação dos mares, da fuligem vinda da queima de combustíveis e da poluição em geral, incluindo a por plásticos. O Ministro do Meio Ambiente, Energia e Habitação da Finlândia, Kimmo Tiilikainen, disse que “precisamos de um corte substancial e imediato nas emissões de gases de efeito estufa, de carbono negro (fuligem) e outros assim chamados poluentes climáticos de vida curta no mundo todo”. O impacto do aquecimento no Ártico reverbera ao redor do mundo. A continuar na toada atual, quase metade do permafrost ártico derrete, liberando uma quantidade inimaginável de metano e dióxido de carbono para a atmosfera. Mesmo não levando isso em conta, até 2030, o gelo desaparecerá nos verões árticos e, junto com o derretimento de geleiras na Groenlândia, responderá por ⅓ do aumento do nível do mar. A acidificação do oceano aumentou 30% desde o início da era industrial e contribui para a redução de quantidade de vários organismos marinhos como plânctons, moluscos e ouriços que estão na base de várias cadeias alimentares. O pessoal d’O Eco fez uma matéria em português à respeito. A ONU Meio Ambiente e o Carbon Brief, também, mas em inglês.

 

O Dia Nacional de Conscientização sobre Mudanças Climáticas foi sábado passado. Alguém ficou sabendo?

Desde 2011 que no dia 16 de março comemora-se o Dia Nacional de Conscientização sobre Mudanças Climáticas. A lei define que, “nesse dia, as escolas promoverão atos, eventos, debates e mobilizações relacionados a medidas de proteção dos ecossistemas brasileiros”.

 

O ClimaInfo é importante para você? Então nos ajude a melhorá-lo. Sugira melhorias, comente o que gosta e o que não gosta. Você não faz ideia de como pode ajudar a melhorar o ClimaInfo!

Escreva para [email protected]

 

Assine aqui para receber o ClimaInfo diariamente na sua caixa de entrada e siga o ClimaInfo nas redes sociais: www.facebook.com/climainfo e www.twitter.com/climainfonews