Gás natural não é transição nem aqui nem na Europa

gás natural

A pregação de que o gás natural é “o” combustível de transição para uma matriz 100% renovável segue com trabalhos que, por um lado, falam da importância de um sistema complementar às plantas eólicas e solares e, por outro, afirmam que é preciso que as térmicas a gás funcionem o tempo todo para serem rentáveis.

Pesquisadores da PUC-RJ e da UFRJ assinam um artigo no Valor no qual defendem o gás natural nacional dizendo que o gás importado é muito caro e que é, em parte, responsável pela alta nas tarifas de eletricidade e pela falta de competitividade da indústria nacional. Mas os autores não dizem que parte importante do gás encontrado no pré-sal tem alta concentração de CO2 e só serve para ser reinjetado nos poços para a extração de mais petróleo. Até a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), em seu Plano Decenal 2029, destaca a competitividade do Gás Natural Liquefeito (GNL) importado frente ao gás nacional.

Os atores também não dizem que as usinas térmicas têm uma vida útil de pelo menos 40 anos, facilmente esticada por mais tempo. O que quer dizer que uma planta que comece a operar em 2025 estará em plena forma em 2050, quando boa parte do mundo deverá ter feito a transição para matrizes energéticas sem emissões de carbono. Se a vontade dos autores prevalecer, o Brasil, “país mais renovável do mundo” terá ficado para trás.

Um pouco deste mesmo tom aparece no relatório “O gás numa encruzilhada”, do Global Energy Monitor (GEM), que analisa criticamente o mercado europeu. À diferença da nossa situação, a infraestrutura para o gás na Europa (gasodutos, armazenagem, terminais de regaseificação etc.) tem o dobro da capacidade requerida para demanda atual. A principal crítica apresentada pelo relatório diz que os europeus orçaram 117 bilhões de euros (cerca de R$ 550 bilhões) para aumentar em 30% a capacidade de uma infraestrutura já sobredimensionada. Ted Nace, da GEM, falou à Earther: “Dizer que o poder da indústria existente influencia o processo é na verdade um eufemismo (…) A indústria direciona o processo todo.” Lá, também, a infraestrutura dura mais de 40 anos e, portanto, as centenas de bilhões de euros garantirão que a Europa dificilmente neutralizará suas emissões em 2050, conforme planejado.

 

ClimaInfo, 06 de fevereiro de 2020.

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