Crise elétrica: negacionismo pode custar caro ao Brasil

crise do setor elétrico

Um estudo recém-lançado do Instituto Clima e Sociedade (iCS) mostra que o Brasil não pode abrir mão de um planejamento energético estruturado, e não pode expandir seu parque gerador às custas de mais emissões e mais aquecimento global, fenômeno responsável, ao menos em parte, por esta e futuras crises hídricas. O governo faz de conta que está em outro planeta ao dizer que a crise está sob controle e que mais térmicas a gás fazem bem para todos.

José Goldemberg, Luiz Eduardo Barata e Amanda Ohara, autores do trabalho, classificam o governo como negacionista. No seminário de lançamento do estudo, Goldemberg disse: “A pior coisa que o governo está fazendo no momento é não preparar o brasileiro para as contingências que vamos ter no final do ano. Pelo contrário, está tranquilizando as pessoas. É uma coisa parecida com a pandemia da COVID.”

O estudo reforça a importância das fontes renováveis diante de uma crise climática cada vez mais aguda. Queimar fósseis não é mais opção. O papel do planejamento do setor é, agora, ainda mais importante do que quando foi pensado para um sistema de poucas hidrelétricas com grandes reservatórios. Vale a leitura das matérias do Valor e da Folha.

Para Heber Galarce, do Instituto Nacional de Energia Limpa, afirma no Valor que a crise poderia ter sido evitada ou, ao menos, mitigada, caso o governo tivesse promovido as fontes limpas. Mas no toma-lá, dá-cá, acabou sancionando os jabutis que criaram uma reserva de mercado para o uso do gás. Já Pedro Cortês (USP) reforçou no Estadão o aviso de que o clima mudou e as chuvas não serão mais como antes. Ironicamente, o acionamento de termelétricas contribui para mais acionamento de termelétricas.

A Folha e o Poder 360 contam que o governo abriu a contratação de energia de térmicas sem contrato e de mais energia importada dos vizinhos. O Valor conta que o ONS (Operador Nacional do Sistema) está pedindo para donos de térmicas adiarem as manutenções preventivas regulares e deixá-las em operação total.

Mais gente volta a falar no desperdício de energia neste momento de crise. Marcel Haratz, no Estadão, relembra que o último Plano Decenal de Energia alertava que “os setores de Indústria e Serviços serão responsáveis, em 2029, por um desperdício de energia […] equivalente a quase 40% da geração de Itaipu no ano passado”.

A recuperação parcial da economia pós-pandemia também contribui para agudizar a crise. Um crescimento potencial do PIB na casa de 5%  implica aumento de carga de 4,6%, o que esvaziaria ainda mais rapidamente os reservatórios, segundo cálculos mostrados pelo Poder 360. O Valor também comentou o drama da recuperação parcial da economia e da crise.

Quem está feliz com a situação aqui e na Argentina são os produtores de gás de fracking norte-americanos. A Argentina também depende das hidrelétricas da bacia do Prata, incluindo as do quase seco Rio Paraná. De mãos dadas, os dois países estão contratando a importação de gás natural liquefeito de campos do Texas, aqueles que quase fecharam no ano passado. A Exame contou a história.

Outro agente feliz é a Norte Energia, dona da usina de Belo Monte. Segundo a UOL, um desembargador de Brasília se referiu à crise para cassar uma liminar que obrigava a empresa a reduzir a vazão da usina para garantir um mínimo sustentável para a população ribeirinha e indígena na Volta Grande do Xingu. Para o desembargador e para o governo, a vida dos outros é apenas a vida dos outros.

 

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ClimaInfo, 29 de julho de 2021.

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