Mercado brasileiro de carbono mistura terra de cegos com cowboys

mercado de carbono brasileiro

Os vários artigos sobre um eventual mercado de carbono brasileiro repetem frases que podem se tornar “verdades”, apesar de serem, no mínimo, discutíveis.

O mercado voluntário internacional existe há quase 3 décadas e as principais certificadoras que emitem créditos de carbono têm regras claras, metodologias científicas para medir os efeitos de projetos, sejam de redução ou de emissões evitadas, e de sequestro de CO2 da atmosfera. Há milhares de projetos registrados no mundo gerando milhões de créditos de carbono. Não é, nem de longe, uma atividade nova, um terreno a desbravar.

Ao contrário do que escrevem Fernanda Trisotto e Eliane Oliveira, n’O Globo, que, no Brasil,  “não há previsão de uma regulamentação que estabeleça padrões e critérios de verificação”, estes padrões e critérios de verificação existem e são internacionalmente aceitos.

Rubens Barbosa, diplomata reconhecido, escreveu a respeito no Estadão, também falando do potencial crescente do mercado de carbono. Comete, no entanto, duas imprecisões. Diz que “os certificados florestais serão os maiores atores, pois a manutenção de áreas florestais preservadas será indispensável”, quando este tema é controverso a ponto das negociações climáticas internacionais evitarem tocar no assunto. Barbosa, como muitos por aqui, dão isto como favas contadas. Ele escreve também que as fontes limpas de energia poderão receber créditos de carbono, quando os principais atores no mercado voluntário decidiram anos atrás não aceitar mais este tipo de projeto. Isto porque o preço da energia gerada por fontes eólicas e fotovoltaicas caiu a ponto destas atividades deixaram de serem tidas como adicionais.

Já Edison Fernandes, no Valor, escreve que “as diversas e vastas áreas de vegetação, nativas ou não, em Terras Públicas têm o efeito de sequestrar carbono da atmosfera e, com isso, propiciar créditos de carbono para a compensação de atividades emissoras. Portanto, as árvores em pé têm também enorme potencial de gerar recursos públicos.” Não têm. O balanço de carbono de florestas e matas maduras é praticamente nulo. E a área citada em um loteamento no litoral norte de São Paulo é, provavelmente pequena, e o pouco carbono que sequestra não pagaria os custos de transação de um projeto de carbono.

Mais conhecedores dos problemas, Pedro Veiga e Sandra Polónia Rios, do Cindes, escreveram no Estadão sobre o potencial impacto da iniciativa europeia de taxar o carbono nos produtos que importa. Dizem que ferro e aço poderão ser taxados, mas o serão menos do que os concorrentes chineses e indianos, cuja matriz energética emite bem mais do que a nossa. O grupo agro – soja, milho, carne – poderá ser penalizado pelas emissões associadas ao desmatamento. “Por outro lado, se o país concentrar sua produção de commodities agropecuárias em áreas livres de desmatamento, pode vir a consolidar-se como beneficiário deste novo cenário regulatório mundial”. Touché.

 

ClimaInfo, 1º de fevereiro de 2022.

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