Existe limite para a desobediência civil contra a inação climática?

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Na última 6ª feira (14/10), uma dupla de jovens chamou a atenção ao redor do mundo por um ato impensável, ao menos para os amantes das artes plásticas: jogar uma lata de sopa de tomate no quadro “Girassóis”, do mestre Vincent Van Gogh, em exposição na National Gallery de Londres. Para alguns, um absurdo completo. Para outros, uma ação justa se considerarmos a importância da causa climática. “Uma obra de arte vale mais do que a vida das pessoas?”, questionaram os jovens.

Esse tipo de ação tem se repetido nos últimos tempos, principalmente na Europa: ativistas climáticos se colam às telas ou às paredes de museus e salas de arte para exigir mais urgência dos governos no esforço contra a mudança do clima. Seguindo uma tradição antiga de desobediência pública em defesa de direitos civis, eles recorrem a medidas chamativas para alertar a população sobre a gravidade da crise climática e a necessidade de os governos assumirem maior responsabilidade.

Nos EUA, ficaram marcados os sit-ins, quando ativistas negros entravam em massa em estabelecimentos segregados para protestar contra as leis racistas nos estados sulistas, só para depois serem arrancados violentamente pela polícia. Mais recentemente, intervenções em instalações da indústria fóssil, como plataformas de petróleo e refinarias, também foram promovidas com o mesmo propósito, o de chamar a atenção do público para um problema pouco discutido.

Mas o ato de “vandalismo” contra o quadro de Van Gogh inseriu uma tensão nessa estratégia. No Washington Post, Shannon Osaka chamou o momento de “bizarro” e raciocinou que, com a gravidade crescente da mudança do clima, os ativistas estão apelando para ações cada vez mais chamativas – e, por isso, incômodas para algumas pessoas. Se o objetivo é chamar a atenção, eles conseguiram; por outro lado, no contexto das redes sociais, em que as grandes reflexões acabam sendo atropeladas pelos memes, fica complicado saber “para o quê” exatamente eles chamaram a atenção.

Mas essa incerteza não significa que ações deste tipo são inúteis. Pelo contrário: elas refletem uma frustração pública que precisa encontrar vazão em alguma coisa. Protestos “limpinhos” podem até ser mais bonitinhos, mas não comportam a frustração que a juventude está acumulando com o inação dos adultos. “Se você não gosta de protestos em museus, organize algo melhor”, disse o escritor Jeff Sparrow no Guardian àqueles que reclamaram da ação.

Em tempo: A tela “Girassóis”, como praticamente todas as grandes obras dos maiores pintores do mundo, está protegida por uma placa de vidro resistente. O máximo de problema que os ativistas causaram à obra foi retirá-la da parede para limpar a sopa de tomates. Desde sábado, ela voltou à exibição pública na National Gallery.

 

ClimaInfo, 19 de outubro de 2022.

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