Bancos prometem “net-zero” enquanto investem bilhões em gás nos EUA

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Gary Cameron/Reuters

Até o final desta década, a costa do Golfo do México nos Estados Unidos poderá ter até 12 novos terminais de gás natural liquefeito (GNL). Essa expansão vai triplicar a atual quantidade de gás que o país exporta. E queimar todo esse combustível fóssil significa emitir anualmente gases de efeito estufa em quantidade equivalente às emissões atmosféricas de mais de 200 termelétricas movidas a carvão.

Terminais de GNL não saem do papel sem dinheiro. E é aqui que começa a contradição de instituições financeiras que anunciam planos de trabalhar para que o planeta atinja emissões líquidas zero, mas financiam essas estruturas. Como ressalta o Guardian, tais projetos precisam de recursos de megabancos que estabeleceram metas climáticas. Os financiadores, porém, isentam explicitamente desses objetivos os projetos de gás liquefeito, um combustível fóssil.

Os bancos argumentam que o GNL ajuda a reduzir as emissões, ao substituir o carvão. Entretanto, críticos dizem que as emissões totais das exportações, incluindo produção e movimentação do combustível em todo o mundo, tornam o cálculo questionável. “A expansão dos combustíveis fósseis é incompatível com o cumprimento de meta líquida zero”, frisou Adele Shraiman, representante do projeto Fossil-Free Finance do Sierra Club.

A maior parte dos custos de construção do GNL ao longo da costa do Golfo dos EUA foi financiada por 20 bancos, informa o Louisiana Illuminator. Até o final de 2022, essas instituições financeiras haviam concedido empréstimos ou subscrição de títulos, combinados, de mais de US$ 110 bilhões, segundo dados compilados pelo Sierra Club. Mais US$ 14 bilhões foram financiados neste ano.

Cerca de um quarto dos US$ 110 bilhões veio de três instituições financeiras japonesas: SMBC, Mizuho e MUFG. A necessidade de GNL do Japão após o desastre nuclear de Fukushima estimulou esses investimentos. Contudo, embora esses megabancos japoneses tenham se comprometido a reduzir as emissões de carbono, não fizeram promessas em relação ao gás liquefeito.

Já na Europa, o cerco se fecha em torno de bancos e fundos que se definem como “sustentáveis”, mas cujas estratégias de investimento não são claras o suficiente para comprovar isso. O Fórum Europeu de Investimento Sustentável (Eurosif, na sigla em inglês), cuja estimativa mais recente avaliou o mercado em US$ 12 trilhões, está desenvolvendo uma metodologia revisada para calcular seu tamanho real. Que, por isso, deve diminuir. 

O presidente do fórum, Will Oulton, disse à Bloomberg, em matéria traduzida pelo Valor,  que à medida que “as expectativas vão além de uma integração ESG básica ou de um modelo simples de exclusões de setores, haverá uma recalibração inevitável do que constitui um investimento sustentável”.

A próxima avaliação do Eurosif vai descartar estratégias “vagas” de integração ESG, afirmou o professor Timo Busch, da Universidade de Hamburgo, que está trabalhando para o fórum e atualmente desenvolve uma metodologia para garantir que o valor final exclua estratégias ESG duvidosas. E os fundos que simplesmente excluem setores polêmicos também ficarão de fora, completou.

Em tempo: Proteger a biodiversidade do planeta não será barato, mas esse custo é muito menor do que não agir, aponta uma análise da BloombergNEF. Segundo a consultoria, o financiamento para proteger e restaurar os recursos naturais mais frágeis do planeta é hoje de US$ 166 bilhões por ano – menos de um sexto do investimento anual na transição energética. Entretanto, essa cifra precisa chegar a quase US$ 1 trilhão até 2030. É muito, mas insignificante se comparado ao custo econômico da perda de biodiversidade. Pelas estimativas conservadoras do Banco Mundial, a deterioração de processos naturais como a polinização selvagem e recursos como a pesca marinha pode fazer com que o PIB global fique US$ 2,7 trilhões anuais abaixo dos níveis previstos até 2030.

ClimaInfo, 6 de abril de 2023.

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