Cúpula da Amazônia abre caminhos contra desmatamento, mas esbarra em divisões políticas

Cúpula da Amazônia Declaração de Florestas
Ricardo Stuckert / Presidência

Declaração de Belém impulsiona uma nova fase da cooperação entre países amazônicos, mas não consegue superar divergências importantes em temas como desmatamento e petróleo.

Encerrada na 4ª feira (9/8) em Belém (PA), a Cúpula da Amazônia representou uma retomada da cooperação entre os países amazônicos depois de mais de uma década de frustrações. Mas as dificuldades para uma atuação concertada dos governos da região seguem expressivas, refletidas nas lacunas da Declaração de Belém no que diz respeito ao fim da exploração petrolífera e à meta comum de redução do desmatamento.

A Folha ouviu especialistas e fez um balanço final da reunião na capital paraense. Pelo copo meio cheio, o principal destaque está na reativação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), que pode finalmente servir como um vetor do diálogo e do entendimento entre os países amazônicos nos próximos anos.

Os governos amazônicos concordaram em negociar um protocolo adicional ao tratado fundador da OTCA para que os presidentes dos países-membros possam tomar decisões de forma colegiada, o que dará mais poder de iniciativa aos governos da região. “[Isso] significa criar uma instância de deliberação na qual os países têm que negociar e tomar decisões concretas – é o momento em que se pode estabelecer metas, por exemplo, ou políticas comuns vinculando os diferentes governos”, explicou Antônio Maués, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Mesmo sem a definição de uma meta comum para reduzir o desmatamento amazônico, o coordenador da iniciativa MapBiomas, Tasso Azevedo, pontuou na VEJA que a declaração final traz um reconhecimento importante por parte dos governos da região sobre a vulnerabilidade ecossistêmica da floresta. “As frustrações são menores em relação ao grande avanço: o reconhecimento por parte dos oito países de que há um ponto de não retorno na Amazônia, que esse ponto está próximo e que precisamos agir para evitá-lo.”

Outro ponto positivo da Cúpula da Amazônia foi o esforço diplomático do governo brasileiro para articular uma resposta além dos países amazônicos nas discussões internacionais sobre florestas. A presença de representantes de nações como Indonésia, Congo e República Democrática do Congo nas conversas em Belém indica a possibilidade de surgir um novo bloco geopolítico dentro das negociações climáticas da ONU, reunindo os grandes países florestais. No Valor, Daniela Chiaretti abordou essa movimentação e as perspectivas desse “bloco verde” para a COP28 de Dubai, no final do ano.

No entanto, o copo meio vazio das conversas em Belém incomoda. A indisposição dos governos amazônicos de discutir a exploração de petróleo e gás na floresta e de definir uma meta comum contra o desmatamento, dois temas bastante pontuados por ativistas indígenas e ambientalistas nas discussões paralelas à Cúpula, mostra que o caminho da cooperação amazônica deve ser acidentado.

Ao Estadão, o professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas, Eduardo Viola, classificou como “fraca” a Declaração de Belém. “Apenas um amontoado de objetivos, típicos da verborragia latino-americana e do assembleísmo da esquerda latino-americana. Não tem foco; quer de tudo e não realiza nada”, disse.

A atuação de Lula também foi criticada – inclusive por defensores públicos do atual presidente. O Globo destacou a frustração do ator Mark Ruffalo com os resultados da Cúpula de Belém e a indisposição do líder brasileiro em discutir o fim da produção de combustíveis fósseis. Ao mesmo tempo, o intérprete do personagem Hulk nos filmes da Marvel elogiou o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, que defendeu o veto a novos projetos fósseis na Amazônia.

“A Colômbia, sob o comando de Petro, é a primeira nação amazônica a seguir o que a ciência recomenda – a meta de proteger 80% da floresta até 2025, e um pedido para interromper a extração de petróleo na Amazônia. Esse é exatamente o tipo de liderança que a humanidade precisa agora”, destacou Ruffalo em posts no falecido Twitter.

Em tempo: O incômodo de Mark Ruffalo é compartilhado por especialistas ouvidos pela Nature sobre o desempenho do presidente Lula no combate à mudança do clima. Pelo lado positivo, a queda substancial do desmatamento desde janeiro é elogiada, bem como a retomada da fiscalização ambiental e de ações de proteção dos Povos Indígenas. Já pelo lado negativo, a ambiguidade do governo sobre o projeto da Petrobras para exploração de petróleo no litoral do Amapá pode prejudicar os esforços do presidente brasileiro para se posicionar como uma liderança internacional nas discussões climáticas.

 

ClimaInfo, 11 de agosto de 2023.

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