Bernadete Pacífico: mais um capítulo da violência contra Comunidades Tradicionais

Bernadete Pacífico
CONAQ

O brutal assassinato da líder quilombola Maria Bernadete Pacífico na Bahia é mais um triste capítulo da violência contra Comunidades e Povos Tradicionais no Brasil.

A líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada a tiros na última 5ª feira (17/8) em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (BA). Nome respeitado nos movimentos sociais do Brasil, Bernadete chefiava o Quilombo Pitanga dos Palmares e fazia parte da direção da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ). Ela também era mãe do quilombola Flávio Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, assassinado em 2017. 

De acordo com familiares que presenciaram o crime, dois homens armados invadiram o terreiro de candomblé que Bernadete comandava em Simões Filho e abordaram a líder quilombola ao lado dos netos. Os jovens foram trancados em um quarto e Bernadete foi executada com 14 tiros. A despeito de fazer parte de um programa de proteção a defensores de Direitos Humanos do governo da Bahia, não havia qualquer vigilância da polícia na hora do crime.

“Estamos amedrontados. Tudo que ela queria era ter o direito de estar no seu território, produzindo e vivenciando sua ancestralidade, sem causar mal a ninguém”, lamentou Antônio Criolo, coordenador-executivo da CONAQ, a’O Globo. “Imploramos que a luta dela não caia no esquecimento”.

Bernadete se notabilizou por encampar diversas lutas do Quilombo Pitanga dos Palmares contra fazendeiros e o governo estadual da Bahia. O Globo destacou várias denúncias feitas por ela, que vão desde tentativas de invasão ao território, retirada ilegal de madeira, até a instalação de pedágios na rodovia que corta a Comunidade e a construção de um aterro sanitário e uma colônia penal.

Alvo constante de ameaças, em julho passado Bernadete participou de um encontro de lideranças quilombolas com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber. À época, ela reiterou a pressão de fazendeiros sobre quilombos e lembrou do assassinato do filho, que ainda está sob investigação das autoridades baianas.

“É o que nós recebemos, ameaças. Principalmente de fazendeiros, de pessoas da região. Hoje eu vivo assim que não posso sair que eu estou sendo revistada. Minha casa é toda cercada de câmeras, eu me sinto até mal com um negócio desses”, disse Bernadete, citada pela Folha.

“É absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras”, afirmou a ministra Rosa Weber em nota. Já o presidente Lula ressaltou que o governo federal, por meio dos Ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, enviou representantes à Bahia para acompanhar as investigações sobre o crime.

O Escritório Regional para a América do Sul do Alto-Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas (UNHCR) condenou o assassinato de Bernadete Pacífico e cobrou celeridade, imparcialidade e transparências nas investigações. “Este crime terrível não pode ficar impune. É um lamentável novo exemplo dos perigos que as comunidades quilombolas enfrentam diante da violência daqueles que ameaçam seus territórios e suas culturas”, disse Jan Jarab, representante da UNHCR na América do Sul.

A morte de Bernadete aumenta uma triste estatística – a de casos de violência contra lideranças quilombolas no Brasil. Dados da CONAQ apontados pela Folha indicam que ao menos 30 líderes quilombolas foram assassinados nos últimos dez anos, com a Bahia encabeçando o ranking com 11 assassinatos. “O caso de Mãe Bernardete se junta a esses assassinatos que estão sem resolução nenhuma. Essa situação é muito grave”, afirmou Biko Rodrigues, coordenador da CONAQ.

Agência Brasil, BBC Brasil, CartaCapital, Correio Braziliense, Estadão, g1 e O Globo, entre outros, repercutiram o crime e a reação de autoridades e lideranças sociais.

 

ClimaInfo, 21 de agosto de 2023.

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