Tráfico e garimpo ilegal compartilham aviões e pilotos para lavar dinheiro na Amazônia

narcogarimpos
Reprodução / Polícia Federal

Investigações da PF revelam laços entre traficantes, garimpeiros e empresários envolvidos com os “narcogarimpos”, que cresceram com os cortes de fiscalização no governo do inominável.

Quando a Polícia Federal do Paraná fez uma operação contra o tráfico internacional de drogas, em novembro de 2020, Heverton Soares Oliveira, o “Grota”, não era alvo. Mesmo assim, segundo a PF, ele achou melhor se esconder em um garimpo ilegal de ouro em Itaituba (PA), a 3.000 km de Curitiba. Até então, Grota parecia apenas um empresário de sucesso no Pará, investindo em fazendas, gado e mineração, mas seus negócios na cidade mais garimpeira do país já estavam no radar das autoridades.

Grota entraria na mira da PF na operação Narcos Gold, em 2021. Ele e um piloto de avião apontado como seu sócio – e que chegou a ser preso em 2004, acusado de prestar serviços ao traficante Fernandinho Beira-Mar – controlariam dezenas de aeronaves e pistas clandestinas usadas para o transporte de ouro e cocaína.

As investigações da PF jogam luz sobre o emaranhado de conexões entre traficantes, garimpeiros, policiais e empresários suspeitos de envolvimento com os chamados “narcogarimpos”. O modelo foi adotado por cartéis de drogas na Amazônia para lavagem de dinheiro por meio da exploração de ouro – um mercado com falhas de fiscalização e brechas para práticas criminosas.

A Repórter Brasil seguiu o rastro de dez operações da PF deflagradas nos últimos cinco anos e mergulhou em mais de 17 mil páginas de documentos. Os agentes investigaram R$ 27 bilhões em bens e negócios suspeitos, prenderam 225 pessoas e pediram a apreensão de 236 aeronaves. No entanto, os processos se arrastam na Justiça, como no caso de Grota. Depois de nove meses foragido, o empresário derrubou judicialmente um pedido de prisão e recuperou aeronaves apreendidas. Hoje, responde às acusações em liberdade.

A Repórter Brasil destaca ainda que os cartéis aproveitaram as vistas grossas do desgoverno de Jair Bolsonaro para o garimpo ilegal na Amazônia e investiram nos “narcogarimpos”. A união do ouro com a cocaína estimula ainda outros crimes ambientais, como a extração ilegal de madeira e a grilagem de Terras Públicas, atividades que também recebem recursos do tráfico.

Essa associação acaba acelerando a destruição da Floresta Amazônica, como mostrou o Relatório Mundial sobre Drogas de 2023, lançado no fim de junho pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Pela primeira vez, o documento trouxe um capítulo específico sobre a Amazônia.

A facilidade para vender ouro em qualquer parte do mundo, somada ao frágil controle desse mercado no Brasil, explica porque o minério é cada vez mais visado por organizações criminosas para a lavagem de dinheiro, principalmente do tráfico de drogas.

A extensa reportagem da Repórter Brasil foi repercutida por Carta Capital e BNC Amazonas.

Em tempo: Relatório do Ministério da Defesa mostra que as áreas atingidas pelo garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami reduziram em 78,51% de 1º de janeiro até 12 de setembro de 2023, em comparação com igual período do ano passado. Até setembro de 2022, o garimpo ocupou 999 hectares e, em 2023, a área atingida é de 214 hectares – 785 hectares a menos, informam g1, Brasil de Fato, InfoMoney e R7. A redução significativa mostra que a presença de garimpeiros se mantém em pequenas áreas da TI, apresentando, nos últimos cinco meses, variação média de 4 hectares. Na 6ª feira passada (15/9), uma operação das Forças Armadas, em coordenação com a Polícia Federal, prendeu mais cinco garimpeiros ilegais na Terra Yanomami. A ação também destruiu quatro balsas e três geradores usados na atividade garimpeira, relata o g1.

 

ClimaInfo, 20 de setembro de 2023.

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