Fim das “pedaladas climáticas” e eliminação dos combustíveis fósseis – Cúpula de Ambição Climática da ONU em Nova York

Credit: UN Photo/Eskinder Debebe

No contexto de sua Assembleia Geral, a ONU realiza nesta quarta (20) a Cúpula de Ambição Climática, um dos eventos preparatórios para a COP28, que será realizada em Dubai, em dezembro. E como o New York Times destacou hoje, houve quem quisesse participar, mas tenha ficado de fora – EUA, China e Índia não receberam convite. Brasil, África do Sul e União Europeia receberam. 

A Cúpula continua sendo realizada nesta tarde, e entre os participantes não governamentais estão o Banco Mundial, o FMI, o Estado da Califórnia, a empresa Allianz e o presidente da COP28, Sultan Al Jaber. 

A ministra Marina Silva representou o presidente Lula, que está antecipando sua volta ao Brasil por problemas de saúde. Ela anunciou a atualização da NDC brasileira (a meta nacional sob o Acordo de Paris) e foi interrompida por aplausos quando informou que os país estava desfazendo a “pedalada climática” do governo anterior. A ministra disse: 

“O Brasil, que já tinha uma das metas climáticas mais ambiciosas do mundo, decidiu ir além. Tenho a satisfação de anunciar hoje que vamos atualizar nossa contribuição nacionalmente determinada no âmbito do Acordo de Paris, a NDC. Vamos retomar o nível de ambição que apresentamos originalmente na COP21 e que tinha sido alterado no governo anterior. Elevaremos os compromissos brasileiros de redução de emissão de 37% para 48% até 2025; e de 50% para 53% até 2030. Isso apesar de nossas responsabilidades históricas serem incomparavelmente menores do que a dos países ricos.”

“Na COP30, todos os países vão apresentar sua segunda rodada de compromissos. Vai ser a nossa última chance. Antes disso, sediaremos a Cúpula do G20 no Rio de Janeiro, em 2024. em nossa presidência do G20 lançaremos uma força tarefa de mobilização global contra a mudança do clima. Todas essas prioridades estão contidas no plano da presidência brasileira.”

Aqui estão alguns materiais que podem ajudar.

  • Um briefing da ONU sobre a Cúpula está aqui
  • Uma coletiva da ONU realizada no dia 12 está aqui
  • Assista à Cúpula aqui 
  • O discurso do Secretário-Geral está aqui
  • A gravação de uma coletiva com especialistas sobre a Cúpula está aqui

Seguem destaques da primeira metade do evento. 

Destaques da Cúpula de Ambição Climática da ONU em Nova York

A Cúpula de Ambição Climática, convocada pelo Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, contou com representantes de países, empresas, governos subnacionais e de instituições financeiras que tenham apresentado algum avanço para enfrentar a mudança do clima. Esta é a primeira edição do evento desde 2019. O Brasil estava entre os convidados, enquanto EUA e China, notadamente os maiores poluidores, ficaram de fora.

Um dos destaques foi a já muito antecipada correção da “pedalada climática” da meta brasileira no Acordo de Paris. O apelido se refere ao truque realizado pelo governo de Jair Bolsonaro para alterar a linha de base para o cálculo das emissões, o que permitiria emitir muito mais do que o país prometeu em 2015, quando o Acordo foi firmado. Uma das regras de Paris é que nenhum país pode retroagir nos compromissos do tratado. 

“Vamos retomar o nível de ambição que apresentamos originalmente na COP21 e que tinha sido alterado no governo anterior. Elevaremos os compromissos brasileiros de redução de emissão de 37% para 48% até 2025; e de 50% para 53% até 2030”, anunciou a ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, sob aplausos dos chefes de estado e diplomatas. Ela leu o discurso do presidente Lula, que cancelou sua participação no evento e antecipou o retorno ao país por problemas de saúde. 

O maior destaque da Cúpula foi o reconhecimento de quase todos os chefes de estado de que é necessário eliminar gradualmente os combustíveis fósseis, inclusive a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o chanceler alemão, Olaf Scholz, o presidente chileno, Gabriel Boric, e o presidente colombiano, Gustavo Petro

Os líderes de Chile e Colômbia foram bastante vocais também ao denunciar o lobby do setor de combustíveis fósseis na elaboração de políticas nacionais e nas negociações multilaterais, inclusive nos corredores da ONU. Eles foram acompanhados por outros chefes de estado, que mencionaram a força da indústria petroleira na propagação do negacionismo climático e para atrasar avanços nas negociações de clima.

Os anúncios de hoje elevam as expectativas de que os países debatam metas para triplicar as energias renováveis e eliminar gradualmente os combustíveis fósseis na COP28, que será realizada em Dubai, em dezembro. 

Mia Mottley, primeira-ministra de Barbados, pediu o cancelamento da dívida de todos os países pobres para que eles possam cumprir os Objetivos do Desenvolvimento sustentável e adotar ações climáticas. Ela lidera a Agenda de Bridgetownum dos mais bem-acabados planos de reforma das instituições financeiras internacionais como Banco Mundial e FMI – e declarou que tomar dinheiro emprestado para responder às perdas e aos danos climáticos era doloroso, inconcebível e quase um crime contra a humanidade. 

“Espero que, da mesma forma que podemos levar a Ucrânia a sério no Conselho de Segurança, possamos levar a crise climática a sério e as necessidades de financiamento para ela no Conselho de Segurança”, disse Mottley. “Essa é uma ameaça tão grande quanto, na verdade, é uma ameaça maior, porque há mais vidas em jogo globalmente do que na Ucrânia. Não tenho nada contra a Ucrânia, na verdade, espero que o povo ucraniano receba todo o apoio de que precisa. Mas sei que as pessoas do mundo todo precisam de apoio e, sem uma intervenção urgente para resolver a estrutura de financiamento, não chegaremos lá.”

Oliver Bäte, CEO da Allianz, um dos poucos líderes empresariais convidados, pediu soluções de mercado que reflitam a realidade científica e econômica. “Nosso compromisso é aumentar em 150% as receitas de seguros comerciais e outros seguros provenientes de energias renováveis e tecnologias de baixo carbono até 2030″, e fez um apelo:”precisamos eliminar o carvão agora. E precisamos reduzir fortemente o petróleo e o gás”.

O primeiro-ministro Justin Trudeau, do Canadá, foi questionado pelo facilitador sobre o fato de o Canadá ser um dos maiores expansores de combustíveis fósseis do mundo. Em sua resposta, o político canadense se concentrou em apresentar regulamentações sobre o limite de emissões de petróleo e gás até o final deste ano e o desejo de ir além da meta atual de redução de 75% do metano do Canadá até 2030. 

O presidente do Quênia, William Ruto, pediu um imposto universal sobre os combustíveis fósseis para financiar a resiliência, as perdas e a transição energética nos países em desenvolvimento. “A Declaração de Nairóbi estabelece fontes viáveis de recursos para uma ação climática viável, da ordem de trilhões de dólares, incluindo um imposto universal sobre o comércio de combustíveis fósseis, taxas de emissão sobre a aviação e o transporte marítimo e um imposto global sobre transações financeiras. Nem a África nem o mundo em desenvolvimento precisam de caridade ou esmolas… o que precisamos é de justiça”.

Embora os EUA não estivessem representados na Cúpula, o governador da Califórnia, Gavin Newsom, estava entre os convidados e afirmou que a crise climática é uma crise de combustíveis fósseis. 

“Essa crise climática é uma crise de combustíveis fósseis.[…] Não é complicado. É a queima de petróleo. É a queima de gás. É a queima de carvão. E precisamos chamar a atenção para isso.”, disse Newsom sob aplausos. “Durante décadas e décadas, o setor de petróleo tem feito cada um de nós nesta sala de aula de bobo. Eles têm comprado políticos. Eles têm negado e retardado a ciência e as informações fundamentais de que tiveram conhecimento e que não compartilharam ou manipularam. Seu engano e negação de décadas criaram as condições que persistem aqui hoje.”

Notas para o Editor:

 Martina Donlon, Chief, Climate Section – Department of Global Communications, United Nations, New York, foi o contato para atendimento à imprensanprovendo mais informações sobre a Cúpula de Ambição Climática.

 

ClimaInfo, 20 de setembro de 2023.

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