Adaptação: Falta de luz em SP prova que empresas de energia e cidades precisam se preparar para eventos climáticos extremos

São Paulo sem luz
Reprodução vídeo UOL

Caos na capital paulista desde a chuva de 6ª feira expõe falhas de gestores públicos frente aos já esperados eventos extremos provocados pelo aquecimento global.

As chuvas torrenciais e os fortes ventos de mais de 100 km/h que atingiram o estado de São Paulo na última 6ª feira (3/11) deixaram sete mortos. Três dias após as tempestades, cerca de 500 mil imóveis na capital paulista continuavam sem energia elétrica, de acordo com a distribuidora Enel, que atende a região metropolitana. E 125 árvores derrubadas ainda precisavam ser removidas.

O caos provocado pelas chuvas na maior cidade do país, onde duas pessoas morreram, expõem apenas algumas das muitas falhas cometidas por gestores públicos frente aos já esperados eventos extremos provocados pelo aquecimento global. A ausência ou ineficiência de tais medidas reflete um problema sistêmico: a falta de adequação das principais leis urbanísticas ao contexto da emergência climática, disseram especialistas à Folha.

A ausência de medidas que efetivamente ajustem a cidade à crise do clima, nos três níveis do marco regulatório – o Plano Diretor, a Lei de Zoneamento e o Código de Obras e Edificações – indicam que a questão não tem sido priorizada. É o que aponta Denise Duarte, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP e especialista em adaptação das cidades à mudança climática.

Ainda na gestão do prefeito Bruno Covas, a prefeitura estabeleceu um Plano de Ação Climática, o PanClimaSP. O programa traça um planejamento de mitigação e adaptação a mudanças climáticas para o período entre 2020 e 2050, pactuado com o C40, grupo que reúne grandes cidades ao redor do mundo para discutir o tema. Mas direções apontadas no PanClimaSP, como o aprimoramento do sistema de drenagem com soluções baseadas na natureza, precisariam ser alinhadas com a revisão do Plano Diretor, o que não aconteceu, segundo Duarte.

Não é somente o poder público que deveria ter a adaptação como prioridade. O presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM), Carlos Bocuhy, reforça que os eventos climáticos extremos também precisam entrar no radar de empresas que atuam na distribuição elétrica, como a Enel.

De acordo com o especialista, as companhias se baseiam em séries históricas para definirem suas equipes em momentos de contingência. Entretanto, na nova realidade climática, isso não representa mais uma referência para a construção e manutenção de infraestruturas críticas, explica o Valor.

“A justificativa das empresas em dizer que nunca viram fatos como este não serve mais, pois a questão climática prevê eventos cada vez mais intensos e com maior frequência. Não dá mais para pensar que a série histórica é uma garantia. É preciso que se faça uma reavaliação de todo aparato de infraestrutura que já foi construído pela sociedade, já que isso foi construído com base na série histórica, ou seja, é preciso refazer o limite do risco”, diz o especialista.

Em tempo: Um estudo inédito do Observatório das Metrópoles mostra que, de 2.232 municípios de 11 regiões metropolitanas do país, apenas 12 têm algum tipo de ação voltada à gestão climática, informa o Jornal Hoje. O levantamento destaca a importância do trabalho conjunto entre as cidades para evitar prejuízos causados pelos grandes eventos climáticos, o que raramente acontece no Brasil. “Não há uma política territorial que lide com essas questões em formas de consórcios intermunicipais. A gente ainda não tem uma prática, uma cultura política do governo municipal se articular com seus vizinhos para que essas políticas climáticas possam ser implementadas”, explicou Thêmis Aragão, coordenadora do projeto.

 

ClimaInfo, 7 de novembro de 2023.

Clique aqui para receber em seu e-mail a Newsletter diária completa do ClimaInfo.