Que a Amazônia permaneça verde

Amazônia verde
Valdemir Cunha / Greenpeace

Enquanto líderes mundiais, especialistas, ativistas ambientais e empresários estavam reunidos em COP28, milhões de pessoas continuaram sofrendo efeitos de uma seca sem precedentes na Amazônia.

 

Por Cardeal Leonardo U. Steiner, Arcebispo de Manaus 

Enquanto líderes mundiais, especialistas, ativistas ambientais e empresários estavam reunidos em Dubai, nos Emirados Árabes, na 28ª edição da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente (COP28), milhões de pessoas continuaram sofrendo os efeitos de uma seca sem precedentes na Amazônia. Ribeirinhos, indígenas, quilombolas têm dificuldades de produzir seus próprios alimentos, de receber ajuda e de se deslocar para obter auxílio, diante de rios e igarapés secos, que mais parecem desertos. Moradores de centros urbanos amazônicos tiveram dificuldade de respirar, com o ar de suas cidades tomado pela fumaça resultante de queimadas, reforçada pela queima diária de combustíveis fósseis por veículos, indústrias e usinas para produção de energia elétrica. Sem falar na mortandade de peixes e botos, sufocados pela pouca água, que além de quente tem baixo nível de oxigênio.

A ciência talvez seja a mais brilhante criação humana, inspirada pela inteligência e pela capacidade de pensamento dadas por Deus. Mas, infelizmente, a ciência produziu elementos e ideias que, se a princípio pareciam úteis para a nossa sobrevivência na Terra, hoje se mostram destrutivos e capazes de nos exterminar. Guiados pela necessidade de “domar” a Natureza – outro presente divino que nos foi dado –, não criamos meios de conviver harmonicamente com o meio ambiente, mas subjugá-lo, como se isso fosse necessário para vivermos na Casa Comum. 

Felizmente, a mesma ciência vem provando há décadas que não somos donos da Natureza, mas sim parte integrante dela. Somos um pedaço de um todo muito maior que nós, e como tal precisamos buscar harmonia e equilíbrio com todos os demais habitantes de nosso planeta, sejam eles animais ou árvores. Precisamos respeitar os recursos naturais que nos foram dados, como a água, e usá-los com respeito e cuidado. 

Nesse contexto, a Amazônia ocupa um lugar muito especial. É a maior floresta tropical do mundo, que abriga uma das biodiversidades mais ricas do globo e lar ancestral de irmãos e irmãs que nela vivem há milênios e que sabem tirar dela o necessário para viverem bem sem devastá-la. Um conhecimento também dado por Deus, aprimorado com o tempo, e que agora precisa ser sinal de esperança para toda a Humanidade.

Por isso é tão doloroso ver os Povos Amazônidas sofrendo as consequências de um mal que não foi causado por eles. Não são os irmãos da Amazônia que destroem a floresta, derrubando árvores em extensas áreas e usando produtos em garimpos ilegais que contaminam o solo, a água, os peixes, sua principal fonte de alimentação e sustento. Não são eles que buscam explorar combustíveis fósseis no coração da floresta e em seus arredores, numa produção cujo lucro é para poucos, mas os prejuízos sociais e ambientais ficam com eles. Sequer usam esses mesmos combustíveis fósseis muitas vezes produzidos em suas terras, numa queima que não afeta apenas suas vidas, mas a sua casa – a Floresta Amazônica – e todo o planeta.

É na solução desse problema que o conhecimento científico e o saber tradicional se irmanam. Ambos já provaram que é preciso interromper imediatamente o desmatamento da Floresta Amazônica, recuperando áreas que foram devastadas. Que é fundamental parar o quanto antes a produção e o consumo de combustíveis fósseis em todo o planeta. E principalmente, enquanto este momento do abandono total dos combustíveis fósseis não chega, que é crucial manter a Amazônia livre da exploração de petróleo e gás, seguindo o exemplo dado pelos nossos irmãos do Equador, que decidiram interromper as atividades dessa indústria poluidora e concentradora de renda no coração da floresta.

É urgente parar a batalha que travamos contra a Natureza, que vem comprovando que é muito mais poderosa que nós. A atual seca na Amazônia é um exemplo claro de um evento extremo resultante da mudança climática causada pela destruição de florestas e pelo consumo desenfreado e sem respeito ao meio ambiente. É urgente interromper as guerras fratricidas, como temos visto em várias partes do mundo, guerras que somente causam morte, dor e sofrimento.

A Amazônia é verde, e assim deve permanecer. Não pode se tornar cinza, invadida pela exploração e pela fumaça de combustíveis fósseis. E nem cinzas, fruto do desmatamento e queimada por uma visão de desenvolvimento que não considera a Natureza como um presente divino que, como tal, não pode ser destruído. Esperamos que tal entendimento guie as discussões para além da COP28. A vida na terra depende do cuidado e respeito que tivermos com a Casa Comum.

 

ClimaInfo, 12 de dezembro de 2023.

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