Risco máximo comprova: petróleo e foz do Amazonas não combinam

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Se o Brasil quer o protagonismo da agenda climática global, precisa respeitar o diagnóstico do IBAMA e abandonar de vez exploração de petróleo na Amazônia.

Abril de 2022. Mesmo diante da política antiambiental do governo anterior, o corpo técnico do IBAMA emitiu um parecer que deu à perfuração de um poço de petróleo no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas, o nível máximo de impacto ambiental. A análise foi usada para definir o valor obrigatório da compensação ambiental a ser pago pela Petrobras, responsável pela exploração da área: R$ 4,3 milhões, detalhou Vinicius Sassine na Folha.

O valor nada tem a ver com reparações em caso de vazamento de combustíveis fósseis. É apenas uma taxa, cobrada de empreendimentos com risco ambiental, a ser usada para investimentos em Unidades de Conservação. Uma cobrança prevista na legislação ambiental. Que só ocorre se a licença para a atividade for emitida.

Mesmo sem licença, a avaliação de risco ambiental máximo para a perfuração do poço na foz do Amazonas deveria ter sido suficiente para a Petrobras mudar seus planos para a região. Ainda mais depois da mudança no comando do país, que colocou o meio ambiente e o clima nas pautas prioritárias. Apesar de algumas visões atrasadas, dentro do governo, que defendem a exploração de combustíveis fósseis a qualquer preço.

No entanto, a Petrobras seguiu em frente. Já sob nova direção, insistiu no poço FZA-M-59. Por razões técnicas, como sempre faz, o IBAMA negou a licença. A petroleira entrou com pedido de reconsideração, um direito legal. Mas, aqui e ali, o comando da estatal emitiu falas contraditórias: dizia respeitar as decisões do órgão ambiental, mas que estava “confiante” na autorização. Mesmo com risco ambiental máximo. Mesmo com a ausência de uma avaliação profunda do impacto da atividade petroleira na foz do Amazonas, uma região de altíssima sensibilidade socioambiental.

A Petrobras podia ter aprendido com sua própria experiência na foz. Em 2011, depois de ser autorizada pelo IBAMA a perfurar um poço no bloco FZA-4, muito próximo da área atual, a petroleira abandonou o projeto. Nem sequer conseguiu abrir o poço: as fortes correntes da região fizeram a plataforma de perfuração ser arrastada. O sinal foi dado.

Na época, o órgão ambiental definiu o nível de risco ambiental da perfuração em 0,28%, quase a metade dos 0,5%, o grau máximo, dado ao FZA-M-59. Como recebeu a licença, a Petrobras tinha que desembolsar R$ 140 mil. Dinheiro que seria aplicado pelo ICMBio no Parque Nacional do Cabo Orange, em Oiapoque, no Amapá, local impactado pelas atividades da petroleira.

Mas, até hoje, a petroleira não pagou um centavo sequer. Desde 2014 arrumou várias desculpas para não desembolsar a taxa de R$ 140 mil, também mostrou a Folha.

A título de comparação, o Relatório de Produção e Vendas da Petrobras do 3º trimestre do ano passado (o último disponibilizado pela empresa) listou uma produção média de 2,3 milhões de barris de petróleo por dia nesse período. Se considerarmos o barril do Brent, referência mundial do mercado de petróleo, a “baratíssimos” US$ 50 – na 2ª feira (5/2), o Brent foi cotado a US$ 77,99 -, e o dólar a R$ 4,50 – fechou a R$ 4,99 no mesmo dia -, estamos falando de um faturamento (muito por baixo) para a Petrobras de R$ 517,5 milhões somente com petróleo em um único dia. Os R$ 140 mil representam 0,02% desse valor. 

Com a retomada dos trabalhos no Congresso, a pressão política para o IBAMA liberar a licença para o poço de petróleo no FZA-M-59 deve voltar com força total. Ainda mais com parlamentares ansiosos para afrouxar as regras do licenciamento ambiental. “Passar a boiada” continua sendo um lema de boa parte de deputados e senadores, seja ela feita efetivamente de bois mesmo ou de exploração de combustíveis fósseis em regiões ambientalmente sensíveis.

O recado do IBAMA em relação ao tremendo risco ambiental de se buscar petróleo na foz do Amazonas foi dado há quase dois anos. E um país que quer conclamar seus pares no G20 – principalmente os mais ricos – a acelerarem a transição energética não pode ignorar esse fato. Já passou da hora de abandonar de vez a busca por combustíveis fósseis na Amazônia. A mesma Amazônia que vai sediar a COP30, na qual o Brasil quer comprovar seu protagonismo na agenda climática . E isso só pode ser feito sem petróleo.

ClimaInfo, 6 de fevereiro de 2024.

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