Especialistas pedem cautela em plano do governo para recuperar áreas degradadas

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Nikolaos Choustoulakis / Unsplash

Anúncio de novo fundo para agropecuária retomar regiões com baixa produtividade, e assim evitar o desmatamento em áreas com vegetação nativa, carece de melhor planejamento.

Uma das novidades que o presidente Lula anunciou na COP28, ano passado, em Dubai, foi a elaboração de um plano para recuperar áreas degradadas no país. Pela proposta, produtores interessados em comprar ou arrendar essas terras – a maior parte usada atualmente para pecuária bovina com baixa produtividade – poderão acessar um novo fundo, a cargo do BNDES, com juros mais baixos em troca de melhorias e investimentos para produção rural.

A ideia do governo, voltada a todos os biomas do país, é recuperar áreas que foram exploradas pela própria agropecuária até perderam sua capacidade de produção, e acabaram abandonadas, detalha Poliana Casemiro no g1. Na lista entram criação de gado, cultivo de culturas como soja e milho, e até madeira para corte. Como a maior causa do desmate no país é a produção agropecuária, a medida estimularia o produtor a voltar para áreas já usadas em vez de desmatar novas regiões com vegetação nativa.

A área incluída na proposta é de 40 milhões de hectares, maior que Mato Grosso do Sul. A área total de pastagens com alguma degradação no Brasil é de cerca de 109 milhões de hectares, mais do que toda a região Sudeste, segundo dados de um mapeamento feito pela Universidade Federal de Goiás (UFG). A recuperação exige cerca de R$ 600 bilhões. Assim, a ideia é atrair investimentos privados, já que o poder público não teria como desembolsar esses valores.

A medida é vista com ressalvas por ambientalistas e especialistas. “A gente tem uma demanda de produção de commodities, que são vetores de desmatamento. Se temos áreas já desmatadas e que podem ser tratadas para atender a essa demanda, freamos o avanço sobre os biomas. É positivo, mas é preciso cuidado como está sendo feito”, ressaltou Ana Carolina Crisostomo, especialista em conservação ambiental do WWF.

O reflorestamento não está nos planos. Além disso, não há um sistema que comprove o efeito positivo do investimento para segurar o avanço da agropecuária sobre novas áreas, e o mapeamento de áreas degradadas precisa ser aprofundado – sem contar uma contradição nos termos do anúncio.

A coordenadora do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do INPE, Luciana Gatti, avalia que liberar recursos para a criação de gado vai contra os princípios do projeto, que é de captura de carbono. “O gado é uma atividade extremamente poluente, emitindo metano que é mais potente que o carbono. Então, não tem sentido uma medida que diz trazer alguma recuperação tratar a pecuária como possibilidade”, criticou.

Num meio termo, o projeto Amazônia 2030 propõe que, no caso da criação de gado, isso deve ser feito em áreas degradadas próximas a frigoríficos, informa a Globo Rural. Os pesquisadores dizem que pecuaristas próximos geograficamente da indústria são mais propensos a adotar tecnologias que aumentam a produtividade do rebanho e, consequentemente, liberam áreas para outros fins.

 

ClimaInfo, 14 de março de 2024.

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