ClimaInfo, 26 de março de 2018

26 de março de 2018

O ESTADO GLOBAL DA BIODIVERSIDADE E DOS SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS

Acaba de ser lançado um conjunto relatórios elaborado por mais de 500 cientistas de mais de 100 países sobre o estado da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos no mundo, e o estado é grave. Nas Américas, ⅔ dos serviços que a natureza presta para a humanidade estão em declínio, quase metade deles em declínio severo. Metade da população está – ou estará em breve – vivendo períodos de crise hídrica. Mais de ⅔ das florestas tropicais foram transformadas em paisagens antropizadas. Na floresta Amazônica, está se chegando a 20% de conversão de floresta para pastos e lavouras. No Brasil, a bola da vez é o Cerrado: nos últimos 15 anos, mais de um milhão de hectares foram convertidos de vegetação nativa em plantações e pastos. Na África, 25% da população subsaariana enfrentaram fome e seca nos últimos 15 anos. No sudeste asiático, a continuar a prática atual de pesca predatória industrial, em 2050 não haverá mais peixe. E, no Pacífico, não haverá mais corais. Na região de abrangência Ásia-Pacífico, estima-se que a invasão de espécies exóticas custará US$ 33,5 bilhões à região. Foram feitas estimativas da pegada ecológica que mostraram que, na Europa Ocidental dos países mais ricos, um europeu consome o equivalente a 3,1 hectares por ano em importações, ou seja, o que eles não conseguem produzir sozinhos. Lá, 71% das espécies de peixes estão em declínio acentuado. Essa tendência ameaça a economia global, a segurança alimentar e a qualidade de vida de populações inteiras.

Os trabalhos foram coordenados pelo IPBES (sigla em inglês da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos), representado aqui no Brasil pelo BPBES (Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos). Nos próximos dias, sairá um outro relatório dedicado à degradação do solo e à restauração florestal.

https://www.ipbes.net/

https://www.ipbes.net/sites/default/files/downloads/general_message_primer_en.pdf

https://www.bpbes.net.br/conheca-a-ipbes/

https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2018/03/america-pode-perder-40-de-sua-biodiversidade-ate-2050-diz-relatorio.shtml

https://www.sciencedaily.com/releases/2018/03/180323093734.htm

 

BRASÍLIA ENCERRA OS FÓRUNS DA ÁGUA

Terminou neste final de semana os Fórum Mundial da Água e o Fórum Alternativo Mundial da Água. Não houve surpresas ou revelações contundentes. Mas ambos os Fóruns foram marcados pela gravidade das várias crises hídricas presentes no mundo e por uma visão de futuro ainda mais duro. No documento final da versão oficial, a indicação clara de que o problema é mais do mundo político que, à cópia do clima, faz muito menos do que deveria. E isso vale para os países ricos e para os não ricos. Há muita água desperdiçada pela sociedade, nas cidades e na produção, e há cada vez mais sociedade para abastecer. Palavras como reuso, saneamento e eficiência atravessaram várias discussões. O Valor Econômico de sexta-feira publicou um especial sobre a água, com matérias sobre as várias discussões que ocorreram durante a semana. Nos links abaixo, algumas dessas matérias.

Já o Fórum Alternativo produziu um documento forte contra a “mercantilização da água”, dizendo que “não se pode comprar chuva, não se pode comprar Sol… É um contrassenso tornar a água mera mercadoria e isso levará o mundo a um futuro ainda mais injusto e perigoso”.

http://www.worldwaterforum8.org/pt-br/publications

http://www.valor.com.br/brasil/5403687/forum-da-agua-medidas-demandam-vontade-politica#

http://www.valor.com.br/brasil/5403645/paises-terao-que-investir-cinco-vezes-mais-na-area-de-saneamento#

http://www.valor.com.br/brasil/5403669/escassez-devera-agravar-conflitos-migratorios#

http://www.valor.com.br/opiniao/5401323/reflexoes-sobre-agua#

http://www.valor.com.br/brasil/5389343/ibge-brasil-consome-6-litros-de-agua-para-cada-r-1-de-riqueza-gerada#

http://fama2018.org/2018/03/22/declaracao-final-do-fama-reafirma-agua-nao-e-mercadoria-agua-e-do-povo/

 

AGROTÓXICOS CONTAMINAM MUITOS CORPOS D’ÁGUA E POUCOS SABEM

O país tem uma legislação mais frouxa do que a da Europa no que toca aos agrotóxicos, e uma fiscalização muito mais frouxa. A Europa proíbe 4 dos 10 agrotóxicos mais usados no Brasil. Como em outros países, existe uma lei obrigando testes semestrais em corpos d’água analisando a presença de 27 agrotóxicos específicos. Dois terços dos municípios brasileiros não reportaram uma única vez. Dos dados de 2014, só 18% dos mais de 5.000 municípios fizeram os dois testes daquele ano. Isso quer dizer que a população do país não sabe o grau de contaminação da água que bebe e usa para cozinhar.

Em tempo 1: dos muitos retrocessos que a bancada ruralista sonha para o país, um busca mexer na legislação dos agrotóxicos. Querem proibir o termo ‘agrotóxico’, mudando-o para “defensivo”. Querem, também, liberar mais substâncias proibidas lá fora.

Em tempo 2: no Twitter, a Frente Parlamentar da Agropecuária afirmou, de peito aberto, que: “A contaminação de rios por defensivos agrícola vem do tratamento de esgotos das cidades e não pelo uso em atividades agrícolas. Os agricultores os utilizam no campo e, quando esses produtos chegam a um lençol freático, já perderam qualquer possibilidade de dano. Não existir comprovação de contaminação de corpos d’água com agrotóxicos”. Então tá, não é mesmo?

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/22/opinion/1521719118_790598.html

https://twitter.com/fpagropecuaria/status/976932325689880576  

 

“O CERRADO É A VERDADEIRA TRAGÉDIA AMBIENTAL BRASILEIRA”

O El País publicou uma reportagem extensa sobre o Cerrado brasileiro, mostrando que “durante décadas e enquanto ninguém estava olhando, metade da savana mais rica do mundo foi desmatada”. Tom Avendaño e  Felipe Fittipaldi percorreram o bioma de alto a baixo. Um parágrafo dá a chave para a longa matéria: “O Cerrado tem mais de 12.500 espécies de plantas, das quais mais de 7.300 só podem ser encontradas aqui. Abriga mil espécies de peixes e mais de 250 mamíferos: delas, 18 são autóctones. É a savana mais rica do mundo. E, então vêm as outras cifras, as preocupantes. Desde 1970, 47% desse bioma foi devastado. Somente em 2015, último ano com dados disponíveis, foram devastados 9.483 km2. Para efeito de comparação, nesse mesmo ano a comunidade científica se indignou porque o desmatamento na Amazônia havia disparado, chegando a 6.207 km2. O Cerrado é a verdadeira tragédia ambiental brasileira.” E a tragédia se estende à população. Se o modo de produção do agronegócio exportador de grãos é monocultura mais alta tecnologia mais eficiência, o pequeno produtor é expulso para as favelas e conjuntos habitacionais das cidades grandes e médias do país. Não tem como competir nem como se defender do trator pop, tech e tudo.

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/21/politica/1521648714_928895.html?%3Fid_externo_rsoc=FB_BR_CM

 

CAMPANHA CONTRA EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO NAS GUIANAS

Abriu-se um processo legal na Guiana para suspender a licença ambiental de uma petroleira e proibir outras duas de explorarem petróleo nas costas guianesas. A Exxon acredita que dá para extrair de lá meio milhão de barris por dia. A Hess e a Nexen (subsidiária da estatal chinesa CNOOC) já começaram os preparativos para a exploração. Ambientalistas abriram um crowdfunding para abrir um processo contra o governo de Georgetown por ter autorizado os trabalhos sem uma análise correta dos impactos que a exploração de petróleo pode gerar para o ambiente e para a sociedade guianesa.

https://www.theguardian.com/environment/2018/mar/22/guyanese-campaigners-mount-legal-challenge-against-three-oil-giants

 

EUROPA DEVE APERTAR SUAS METAS CLIMÁTICAS PARA 2050

Líderes europeus estão pressionando a burocracia de Bruxelas, conforme o prometido anteriormente, a entregar um mapa do caminho para descarbonizar a economia europeia até 2050. O Acordo de Paris basicamente impôs que a emissões atinjam um pico muito antes de 2050, forçando uma mudança no plano europeu anterior. Só que, desde 2015, o pessoal encarregado de refazer o plano vem protelando e enrolando. Agora alguém acordou. Falta ver se os países farão sua parte. O que se nota é uma França mais ativa e uma Alemanha mais defensiva, depois da quase derrota de Merkel no final do ano passado. E um Reino Unido se despedindo da Europa, sem decidir se, climaticamente, segue no mesmo barco ou não. O novo plano deve ficar pronto no ano que vem.

https://www.euractiv.com/section/energy/news/eu-leaders-take-brussels-to-task-over-2050-low-carbon-roadmap/

http://www.climatechangenews.com/2018/03/23/eu-leaders-order-long-term-climate-strategy-early-2019/

 

ONE PLANET SUMMIT ACONTECERÁ EM NOVA YORK EM SETEMBRO

O presidente francês Emmanuel Macron e o ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, anunciaram que a próxima reunião do One Planet Summit acontecerá em Nova York no dia 26 de setembro. A primeira reunião deste grupo iniciado pelo presidente francês, pelo presidente do Banco Mundial e pelo secretário-geral da ONU, aconteceu no final do ano passado, em Paris, logo após a COP-23. O grupo reúne líderes de países e de corporações para tomar ações contra a mudança do clima.

Ainda na semana passada, Macron deu uma provocada básica dizendo que a União Europeia está louca se fechar acordos comerciais com países que se recusam a honrar os compromissos do Acordo de Paris. E completou dizendo que a base das regras do comércio multilateral estão sendo ameaçadas por “tentações unilaterais” e que ele não concorda em demonstrar qualquer complacência com quem decide romper com essas regras.

https://twitter.com/mikebloomberg/status/976821654167937024?s=21

http://www.climatechangenews.com/2018/03/22/macron-eu-mad-trade-deals-us-paris-withdrawal/

 

LIMITAR AQUECIMENTO EM 1,5⁰C PODE CUSTAR TRÊS VEZES MAIS QUE LIMITÁ-LO EM 2⁰C

A Nature acaba de publicar um trabalho com simulações macroeconômicas e climáticas que comparam o custo para a economia mundial da limitação do aquecimento global em 2C e em 1,5C. Era de se supor que este último saísse mais caro, e as contas indicam que sim, sai três vezes mais caro manter o aquecimento sob 1,5C. As diferenças aparecem já no curto prazo, quando seria necessária uma mudança rápida nos setores de transportes e da construção civil (lembrando que o aquecimento de edificações é importante na matriz de emissões no hemisfério norte).

Outro achado importante é que o aumento da desigualdade entre o mundo rico e o pobre torna ambas as metas impossíveis de serem atingidas, basicamente porque o desmatamento aumenta desenfreadamente.

O trabalho combinou seis modelos de avaliação integrada (integrated assessment models); um específico para a região da Ásia-Pacífico; um dos usados pelo IPCC; um para o meio-ambiente global; um de energia; um modelo regional de investimentos acoplado com um para a agricultura mundial; e um que dá conta de mudanças tecnológicas.

Mas os autores não rodaram um cenário correspondente à não tomada de ação climática, de modo a avaliar o impacto da mudança do clima sobre a economia mundial.

https://www.nature.com/articles/s41558-018-0091-3

http://www.climatechangenews.com/2018/03/23/emissions-cuts-1-5c-climate-target-cost-three-times-2c-study/

https://www.e3g.org/library

 

ADVOGADO DE PETROLEIRA DIZ QUE A MUDANÇA DO CLIMA É REAL E A CULPA É SUA

Num dos vários processos climáticos que rolam pelas cortes norte-americanas, assistiu-se a uma defesa um tanto inusitada. O advogado da petroleira Chevron admitiu que o clima está mudando e que a emissões da queima de fósseis é a principal responsável. Mas isentou a empresa de qualquer responsabilidade. Primeiro, ele argumentou que os planos da empresa foram feitos quando não se tinha tanta certeza sobre a responsabilidade humana quanto se tem agora. É uma sutil variação do que os negacionista mais duros da turma de Trump vêm dizendo – que não se tem certeza de nada. A Chevron, pelo menos, diz que hoje a certeza é muito grande. O mais surpreendente foi quando ele disse que a empresa só explora e vende fósseis e que não é culpa dela se alguém põe fogo ou explode seus produtos. Vai na linha da corte norueguesa que disse que era perfeitamente constitucional o governo norueguês emitir licenças para explorar petróleo e gás em regiões pristinas no Ártico, afinal a responsabilidade das emissões era de quem usava o petróleo e não de quem o explora. Assim como um fabricante de cigarros não tem culpa sobre a saúde de seus consumidores. Ou um fabricante de armas e munições sobre as guerras, mortes e sofrimentos que seus produtos geram. Para o advogado, não é a Chevron que traga ou atira. A culpa, claro, é do consumidor.

https://www.scientificamerican.com/article/oil-giant-accepts-climate-consensus-denies-responsibility-for-warming/

 

GIGANTE ELÉTRICA DOS EUA TIRA O CARVÃO DA SUA GERAÇÃO, MAS MANTÉM OUTROS FÓSSEIS E NUCLEARES

A Duke Energy é uma das maiores corporações de energia dos EUA. Na semana passada, por pressão de um grupo de acionistas, ela teve que publicar um relatório avaliando o impacto da mudança do clima no seu futuro. Para 2050, a empresa se comprometeu a não operar mais usinas a carvão. Hoje, o carvão gera ⅓ da energia gerada pela empresa. A Duke prevê também a subida da participação das renováveis dos 1% de hoje para 23% até lá. Mas mantendo ⅓ da geração por térmicas a gás natural e outro ⅓ por nucleares. O restante viria de tecnologia em desenvolvimento, que podem incluir o CCS (remoção e armazenamento de carbono) e usinas nucleares avançadas. O relatório ainda aponta que o principal obstáculo a uma penetração maior das renováveis é sua intermitência e a falta de tecnologia de armazenamento que resolva esse problema.

Em tempo, aqui no Brasil, a Duke foi dona de 8 hidrelétricas no Rio Paranapanema e outras concessões. Foram vendidas à CTG (China Three Gorges) em 2016.

https://www.axios.com/under-investor-pressure-duke-energy-issues-climate-report-1521670028-739e676b-bbad-435c-8777-6ff56649563a.html

 

Para ver

PIRIPKURA

Documentário de Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge sobre um encontro de um funcionário da Funai com os últimos dois piripkura no noroeste do Mato Grosso. Da crítica da Folha de São Paulo: “Piripkura” deveria ser exibido em escolas, igrejas, associações de moradores, enfim, em todos os locais onde cidadãos podem se interessar em saber mais sobre como o Brasil (des)cuida de suas florestas e povos indígenas.” Prêmio de melhor documentário na categoria “Direitos humanos” do Festival Internacional de Documentários de Amsterdã e de melhor longa-metragem de documentário na 19ª edição do Festival do Rio.

Espaço Itaú de Cinema em São Paulo.

https://www.youtube.com/watch?v=14cnpfBEWeo

https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2018/03/filme-piripkura-aborda-relacao-do-pais-com-seus-nativos.shtml

 

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