ClimaInfo, 29 de março 2018

ClimaInfo mudanças climáticas

O QUE OS EUROPEUS PODEM FAZER PARA REDUZIR A IMPORTAÇÃO DE DESMATAMENTO

Ontem falamos de um trabalho da Mighty Earth sobre a carne consumida na Alemanha ser produzida a partir da soja vinda de áreas desmatadas no Gran Chaco. Esse tema é tratado num relatório recente do CDP que analisa o “desmatamento importado” pela Europa. O relatório diz que “o consumo de commodities na Europa é um vetor de desmatamento fora de seu território. O desmatamento em países que produzem commodities agrícolas acontece pela expansão de terras agricultáveis e por pastagens, e uma parte importante dessa produção é exportada para consumo na Europa.” A análise cobre, dentre outras, as cadeias da soja, da carne e da madeira. A partir daí, o CDP faz seis recomendações:

  1. criar critérios de sustentabilidade para commodities importadas e trabalhar com os países de origem para implementá-las;
  2. adaptar regulações sobre riscos florestais da importação de madeira para outras cadeias como soja e carne;
  3. sistema públicos de suprimento devem ser usados e escalados para adotar padrões de sustentabilidade;
  4. rever diretivas europeias para reforçar a obrigação de divulgar informações relevantes;
  5. corporações europeias devem criar parcerias público-privadas com governos de países exportadores para monitorar compromissos de zerar o desmatamento e suportar o financiamento sustentável de florestas; e
  6. corporações europeias devem trabalhar com seus fornecedores ao longo de toda a cadeia de suprimento para assegurar critérios de sustentabilidade, incluindo padrões de desmatamento zero.

O CDP é um provedor de sistemas de divulgação (disclosure) das emissões de gases de efeito estufa e das ações sobre o clima de corporações, cidades, estados e outras entidades.

https://www.cdp.net/en/policy-and-public-affairs

https://www.businessgreen.com/bg/news/3021591/cdp-global-companies-risking-usd941bn-due-to-deforestation

 

MAIS ARGUMENTOS CONTRA A LIBERAÇÃO DA PLANTAÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR NA AMAZÔNIA

Tasso Azevedo escreveu um artigo forte para O Globo que, pela tangente, pede para o Senado rejeitar o projeto de lei que autorizaria a plantação de cana-de-açúcar na Amazônia. O foco do artigo é a redução de emissões de gases de efeito estufa do país, onde o transporte responde por metade das emissões vindas da queima de fósseis. Azevedo enxerga um futuro eletrificado para os transportes, tendo o etanol um papel importante na transição do atual modelo fóssil para o futuro elétrico. Mas, para que o etanol continue sendo um combustível de baixa emissão, é imprescindível que o combustível não se torne vetor de desmatamento. E o risco disso acontecer, se for liberado o plantio na Amazônia, é muito grande. Mesmo que o projeto de lei só venha a autorizar o plantio em áreas desmatadas, a cana tenderia a empurrar o boi, que por sua vez empurraria o madeireiro, o garimpeiro e o grileiro que, estes sim, têm a motosserra nas mãos. Mas o empurrão inicial veio da cana, veio da soja. Na mesma direção, o Museu Emílio Goeldi também publicou um documento forte destacando que “é conhecido que a cana-de-açúcar é um cultivo com alta demanda de água. A maioria das áreas degradadas está próxima às bordas do bioma, onde a degradação já tem comprometido o fluxo de água. Esta é a principal razão pela qual as áreas degradadas da Amazônia necessitam ser restauradas: para prover serviços ecossistêmicos necessários ao aumento da capacidade produtiva e de melhoria da qualidade de vida das populações”.

Em tempo: nos últimos anos, o principal produto da cana tem sido o açúcar e não o etanol. Só em 2017, o Brasil exportou quase 30 milhões de toneladas e recebeu por isso US$ 11,4 bilhões. O que aconteceria se o açúcar brasileiro ficasse conhecido por desmatar a Amazônia?

https://oglobo.globo.com/opiniao/etanol-eletrons-22532593

http://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,museu-emilio-goeldi-alerta-que-cana-na-amazonia-pode-piorar-oferta-de-agua,70002245882

 

GOVERNO QUER ENGORDAR AINDA MAIS OS COFRES DAS PETROLEIRAS

Estão previstos para este ano mais leilões de áreas do pré-sal e, aparentemente, o incentivo de centenas de bilhões dado no ano passado por meio da apelidada MP do Trilhão já não motiva tanto. As petroleiras, incluindo a Petrobrás, reclamam de uma das condições do contrato: a de que o pagamento do bônus na assinatura deveria ser feito de uma só vez. No ano passado, o tesoureiro-mor estava buscando arrecadar dinheiro de qualquer lugar. Mas, neste ano, ou a bondade amoleceu os corações do Planalto ou alguém calculou que a dificuldade de fechar as contas deste ano já não é tão desesperadora e que, assim, seria interessante garantir entradas para os próximos anos, principalmente se as forças que hoje detêm o poder de alguma forma sigam em suas cadeiras. Seja qual for o motivo, as ‘pobres’ Petrobras, Exxon, Shell, BP et caterva agradecem.

http://www.valor.com.br/brasil/5413581/governo-cogita-parcelar-bonus-do-pre-sal

 

GOVERNO DECIDE ABRIR A CARTEIRA PARA FINANCIAR FOTOVOLTAICAS

Antes que seus ministros voltem ao Congresso, o governo planeja lançar o maior programa de financiamento de fotovoltaicas feito até agora. Na próxima semana, as agências de desenvolvimento Sudam, Sudene e Sudeco darão luz verde ao Banco do Nordeste, ao Banco da Amazônia e ao Banco do Brasil – este último cobrindo o Centro-Oeste – para que abram linhas de financiamento a juros subsidiados para consumidores residenciais e comerciais. Para o Nordeste, o juros serão de 6,24% e o financiamento deverá ser pago em 12 anos, com 4 de carência. No Centro-Oeste, a taxa será de 7,33%, mas com apenas 24 meses para pagar e 6 meses de carência. No Norte, a taxa também será de 6,24%, mas os sistemas deverão ser pagos em 36 meses, com dois de carência. O governo está apostando que, com a alta das tarifas elétricas que atropelarão nossos bolsos em 2018, a remuneração do investimento será bastante atrativa. Mesmo antes dos aumentos esperados, Rodrigo Sauaia, presidente-executivo da Absolar, dizia que as placas residenciais estavam se pagando em 5 anos. Um presente de despedida de ministros que muita gente vai agradecer.

http://www.valor.com.br/brasil/5410515/fundos-vao-financiar-uso-de-energia-solar-com-r-32-bi#

 

CUSTO-BENEFÍCIO DA ADAPTAÇÃO À MUDANÇA DO CLIMA NO SEMI-ÁRIDO

A ANA (Agência Nacional de Águas) contratou o GVces para calcular o custo-benefício de projetos de adaptação às mudanças do clima para o semi-árido brasileiro. O estudo elegeu a região das bacias dos Rios Piancó e Piranhas-Açu, nos sertões da Paraíba e do Rio Grande do Norte, das regiões que mais sofreram com a seca dos últimos sete anos. O trabalho, que começou em 2015, calculou uma linha de base correspondente às perdas econômicas geradas por não se levar a sério a mudança do clima nas contas do planejamento do suprimento de água para a região. A partir dessa linha de base, incorpora medidas de adaptação que passam por aumentar a quantidade de reservatórios e açudes e, também, a capacidade de reservação dos existentes, por plantas de dessalinização e mudanças na estrutura tarifária do fornecimento de água. O trabalho é importante pelos resultados e, talvez até mais, pela metodologia desenvolvida. O estudo e seus anexos podem ser encontrados no link abaixo.

http://www.gvces.com.br/analise-de-custo-beneficio-acb-de-medidas-de-adaptacao-as-mudancas-do-clima-no-semiarido-brasileiro

 

OS GASES DE EFEITO ESTUFA GERADOS PELAS DIETAS DE INGLESES E NORTE-AMERICANOS

Dois trabalhos abordam as emissões de gases de efeito estufa “embutidas” nos hábitos alimentares dos britânicos e norte-americanos. O primeiro, Comida num mundo em aquecimento (Food in a warming word), do WWF, calculou quanta emissão está por trás de quatro dos mais tradicionais e apreciados pratos da ilha, medindo as emissões feitas para a produção dos seus ingredientes: frango tikka masala, de origem indiana; o tradicionalíssimo fish and chips; o ploughman’s lunch (refeição do trabalhador que, na versão mais simples, são pedaços de pão, manteiga, cebolas fatiadas, pedaços de queijo e uma caneca de cerveja); e o guisado de legumes e carneiro, típico do País de Gales. Pelos cálculos do WWF, uma bela tigela do guisado emite 6 kgCO2e até ser consumida, o que corresponde a um passeio de carro de 20 km. Os outros pratos emitem bem menos, simplesmente porque não incluem as emissões dos carneiros, que, como o nosso gado, arrota muito metano.

O outro trabalho fez uma conta diferente e mostrou que as refeições diárias de 20% dos norte-americanos são responsáveis por metade das emissões associadas aos alimentos consumidos nos EUA e, novamente, o maior responsável é o rebanho de ruminantes. Os pesquisadores montaram uma base de dados de emissões de mais de 300 alimentos e cruzaram com uma pesquisa de hábitos alimentares realizada com 16 mil norte-americanos. Os 20% do topo da classificação por emissão emitem cerca de 8 vezes mais do que os 20% do final da classificação, e são responsáveis por 46% das emissões embutidas nos alimentos. A carne é, de longe, o alimento maior emissor, responsável por 72% das emissões dos alimentos nos EUA.

https://www.theguardian.com/lifeandstyle/shortcuts/2018/mar/27/off-the-lamb-how-to-eat-with-a-low-carbon-footprint

http://iopscience.iop.org/article/10.1088/1748-9326/aab0ac/meta

https://www.sciencedaily.com/releases/2018/03/180320100821.htm

 

ARÁBIA SAUDITA CONSTRUIRÁ MEGAUSINA SOLAR DE US$ 200 BILHÕES

O governo saudita assinou um memorando de entendimento de US$ 200 bilhões com o banco de investimento japonês SoftBank Group, para a implantação de um projeto fotovoltaico de 200 GW. O projeto é 100 vezes maior do que a maior planta solar hoje existente, e 18 vezes maior do que Belo Monte. Sozinho, supriria a demanda de eletricidade projetada para o Brasil para além de 2050. Sua energia custará mais ou menos o mesmo que a gerada por Belo Monte.

https://www.bloomberg.com/news/articles/2018-03-28/saudi-arabia-softbank-ink-deal-on-200-billion-solar-project

 

DERRETIMENTO DO ÁRTICO E DA GROENLÂNDIA AUMENTA O PERIGO CAUSADO PELOS ICEBERGS

A redução acentuada da camada de gelo do Ártico está deixando muita gente com água na boca pelas novas rotas de navegação, que encurtarão a distância entre China e Coreia e os países com portos no Oceano Atlântico. Afinal, a rota é mais curta e não tem que atravessar canais como os do Panamá e de Suez, que limitam o tamanho dos navios. Só que o mesmo calor que abre as rotas, as enchem de icebergs. Estes vêm tanto do próprio gelo Ártico, quanto do derretimento de geleiras da Groenlândia, e suas rotas apontam sempre para o sul e para o oeste. A referência é a latitude 480, onde começam as rotas comerciais tradicionais. Até há poucos anos, a média de icebergs avistados abaixo dessa latitude era de 450 a cada ano. No ano passado, foram 1.000 e tudo indica que serão ainda mais em 2018. O perigo não é só para navios. Nos campos de petróleo dos Grand Banks, no extremo leste do Canadá, houve uma invasão de icebergs que colocou em risco as plataformas e os barcos de apoio que tiveram que sair laçando os icebergs e os arrastando para longe. Outros icebergs encalharam na entrada de portos de pesca, impedindo a saída de pesqueiros. Se a temperatura continuar subindo, eventualmente, um dia haverá significativamente menos geleiras na Groenlândia e no Ártico e, então, a quantidade de icebergs deve diminuir. Como se isso fosse grande alívio.

https://insideclimatenews.org/news/27032018/climate-change-arctic-sea-ice-data-icebergs-ocean-shipping-oil-gas-drilling-grand-banks-canada

 

GELEIRAS FUNCIONALMENTE EXTINTAS

Mesmo se zerássemos de uma hora para outra todas as emissões humanas, as geleiras continuariam a derreter ao longo deste século e ⅓ delas desapareceriam. Isso porque os gases de efeito estufa que já mandamos para a atmosfera farão a temperatura continuar a subir até atingir um novo patamar. O avanço ou o recuo de uma geleira acontece em função do balanço entre a neve que ela acumula, contra o ar quente que a derrete. O novo patamar de temperatura, mesmo limitando o aquecimento, é suficiente para causar um belo estrago. Um trabalho publicado na Nature modela 255 geleiras para as quais há mais de um século de medições mensais de temperatura e neve. O trabalho demonstra a irreversibilidade do que já foi feito. Os autores estimaram um indicador genérico: cada quilo de CO2e emitido implica quase 16 kg de gelo derretido nas geleiras. Esse um quilo é o que um carro emite em média a cada 500 metros percorridos. Um artigo da revista Antropoceno sugere que, assim como velamos pelo último rinoceronte branco, velaremos pelas geleiras também.

https://www.nature.com/articles/s41558-018-0093-1

http://www.anthropocenemagazine.org/2018/03/some-glaciers-may-already-be-functionally-extinct/

 

Para ler

RELATO DO DESAPARECIMENTO DE UM POVO
O desmatamento ilegal ameaça a etnia Tenharim na Amazônia. Em livro, o jornalista alemão Thomas Fischermann dá voz ao guerreiro indígena Madarejúwa para que este denuncie as ameaças sofridas por seu povo.

http://www.dw.com/pt-br/relato-do-desaparecimento-de-um-povo/a-42854067

 

Para estudar

INTRODUCTION TO CLIMATE SCIENCE

O cientista climático Andreas Schmittner, da Oregon State University, acaba de lançar um livro-texto sobre a ciência do clima aberto ao público, de download gratuito e licenciado sob as regras do Creative Commons. O livro é uma introdução à ciência do clima para estudantes de graduação e, também, para todos os interessados no assunto. É uma grande contribuição; melhor ainda se alguém se aventurasse a publicá-lo em português. Alguém se habilita?

http://library.open.oregonstate.edu/climatechange/

 

Para ver

PRIMEIRO CONTATO: TRIBO PERDIDA NA AMAZÔNIA

Um documentário que faz pensar sobre nossa ancestralidade esmagada e desaparecida, similar aos grupos indígenas que existiam por aqui. O documentário examina a situação dos Sapanawa, que foram contatados em 2014. Os Sapanawa foram praticamente dizimados e os poucos índios que sobraram foram encontrados por um antropólogo. No filme, entendemos um pouco mais sobre o que aconteceu com a tribo, além de checar como anda a situação dos Sapanawa atualmente.

Netflix, dia 13, às 16h. Mais informações no link abaixo.

https://www.tecmundo.com.br/internet/128595-netflix-dia-013-primeiro-contato-tribo-perdida-amazonia-2016.htm

 

Para ver

MAPA INTERATIVO MOSTRA A MUDANÇA DO CLIMA NO MUNDO

Um professor de geografia criou um mapa interativo no qual é possível comparar como o clima está mudando em diferentes partes do mundo. A base de dados contém dados dos últimos 50 anos coletados em 50 mil estações meteorológicas espalhadas por todo mundo. Ele também incorporou um modelo climático para mostrar o que nos espera nos próximos 50 anos.

http://sil.uc.edu/webapps/climateex/

https://journals.ametsoc.org/doi/pdf/10.1175/BAMS-D-16-0334.1

https://www.sciencedaily.com/releases/2018/03/180321121600.htm

 

Para ver

VISTAS INESQUECÍVEIS DO NOSSO MUNDO EM MUDANÇA

A Nexus juntou uma série de imagens, gráficos e fotos (com animação temporal) criados pela NASA mostrando os efeitos da mudança do clima. Não esqueça de esperar um pouco em cada um para ver as animações. Site, infelizmente, em inglês.

https://nexusmedianews.com/unforgettable-sights-of-our-changing-world-2df468c71de

 

Para ir

V CONFERÊNCIA REGIONAL SOBRE MUDANÇAS GLOBAIS: ENERGIAS RENOVÁVEIS, FLORESTAS E FUTURO DAS NEGOCIAÇÕES INTERNACIONAIS

Promovida pela USP com apoio da Fapesp, a Conferência deve focar três temas principais:
– Papel das fontes renováveis de energia no desenvolvimento;
– Florestas tropicais e sustentabilidade; e
– Futuro do combate à mudança do clima.
A Conferência homenageará os 90 anos do professor José Goldemberg. Nas palavras do convite oficial: “O trabalho do Professor José Goldemberg e o seu interesse pela interface entre ciência e políticas públicas o coloca como personagem-chave no debate sobre mudanças do clima, planejamento energético, sustentabilidade das florestas e negociações internacionais”.
Inscrições e outras informações no link abaixo.

https://www.crmg2018.com/

 

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