BRASIL BLOQUEIA REDUÇÃO DAS EMISSÕES DA NAVEGAÇÃO MARÍTIMA
O governo brasileiro se juntou à Arábia Saudita, à Índia, ao Panamá e à Argentina para bloquear o estabelecimento de metas de redução das emissões de gases de efeito estufa para a navegação marítima internacional na IMO (sigla em inglês da Organização Marítima Internacional), órgão da ONU que tenta estabelecer normas para a navegação internacional. O setor está sob pressão faz já um certo tempo para a adoção de medidas de redução destas suas emissões, coisa que o setor vem protelando desde o começo do século. Depois do Acordo de Paris, a pressão aumentou e, sob a liderança da União Europeia, vários governos sugeriram a adoção de metas de redução destas emissões. Mas a proposta enfrenta a resistência de dois blocos de países. De um lado, os vendedores de commodities que ficam longe do grande mercado da China, porque suas rotas são mais longas e os limites de emissão aumentariam os preços das commodities. Estão nesse bloco o Brasil e a Argentina (aliás, os negociadores brasileiros contam com o suporte técnico da insuspeita Vale do Rio Doce, uma das que perderiam espaço se o frete ficar mais caro). Outro bloco é o dos países que alugam sua bandeira para os armadores, como o Panamá, a Libéria e a Costa do Marfim. Fretes mais caros implicam queda de suas receitas. Como a navegação não entrou na NDC de país algum, estes governos fazem o que podem para ajudar empresas como a Vale.
E dane-se o clima.
http://www.bbc.com/news/science-environment-43584963
BNDES FACILITA PARA HIDRELÉTRICAS E MUDA O FINANCIAMENTO DA GERAÇÃO
Com três passos atrás, o BNDES, de Paulo Rabello de Castro, volta a dar dinheiro do contribuinte para projetos de grandes hidrelétricas. A gestão anterior, de Maria Sílvia, tinha reduzido o volume financiável, aumentado o spread e reduzido os prazos. A uma semana do primeiro leilão do ano, o Banco voltou a oferecer o financiamento de 80% do valor total dos projetos e um prazo de 24 anos para a quitação da dívida. E mais, reduziu o spread. Ainda por cima, as novas regras passaram a incluir projetos voltados para o mercado livre, quando, até então, os empréstimos eram limitados à parte da energia vendida no mercado regulado. Pelo menos a taxa básica atual, a TLP, anda muito perto da Selic, diferentemente da sua antecessora, a TJLP, que quase sempre ficava alguns pontos abaixo. Isto indica, pelo menos teoricamente, que o subsídio a projetos hidrelétricos diminuiu ou até deixou de existir.
SOBRE O LEILÃO ANP DA SEMANA PASSADA
Na 6a feira, aconteceu mais um leilão de áreas para exploração de petróleo e gás. Do nosso ponto de vista, três pontos merecem ser destacados:
1- Foi a primeira vez que a sociedade civil conseguiu abrir espaço oficial para se posicionar: o pessoal da 350.org subiu ao palco e pediu para que os fósseis permaneçam enterrados por mais alguns milhões de anos para que o aquecimento global não seja aumentado. Desta vez não houve conflito com seguranças.
2- Não foram feitas propostas para as áreas em terra, nas bacias do Parnaíba e do Paraná, onde dizem haver muito gás natural. Se o gás natural é tido como o combustível fóssil de transição para a tal economia de baixas emissões, o desinteresse pode ser um sinal um tanto ruim.
3- No dia anterior, o TCU retirou duas áreas do leilão, exatamente as duas áreas mais valiosas. Os auditores querem entender se o país ganharia mais no modelo de negócio deste leilão, ou se seria melhor esperar um próximo, com um outro modelo. A ver nesta semana o que acontece.
Em todo caso, analistas do mercado fóssil consideraram positivo o resultado do leilão, já que o governo conseguiu um bônus de R$ 8 bilhões, mais do que esperavam.
Em tempo 1: vale deixar anotada uma frase sobre o fracking no país, cometida por um dos respeitados analistas, Pedro Zalan: “Ninguém faz fracking em shale gas no Brasil. Nunca fez, não faz e nem pretende fazer. Não há nem sentido geológico em se pensar neste assunto no Brasil”.
Em tempo 2: a ANP parece discordar do respeitado analista (veja no último link desta nota)
https://350.org/pt/fracasso-de-leilao-terrestre-e-vitoria-da-sociedade/
http://epbr.com.br/o-sucesso-da-15a-rodada-e-o-preocupante-sinal-para-onshore-por-pedro-zalan
DUAS VEZES MAIS EÓLICAS EM 10 ANOS NO BRASIL
Uma das importantes consultorias especializadas em energia, a Make, projeta que, em 10 anos, a capacidade eólica instalada dobrará, o que acrescentaria mais 65 GW até 2027, um aumento de 4% ao ano. A Make inclui eólicas terrestres e offshore, ainda inéditas em escala no país. Só que esse cenário, assim como outros até mais otimistas, dependem dos outros países manterem ou acelerarem suas expansões. Se o volume de vendas continuar crescente no mundo, o preço das torres eólicas continuará a cair e a energia gerada ficará cada vez mais competitiva frente ao gás natural. Especialmente para o Brasil, interessa que a expansão das eólicas na América do Sul continue a crescer no ritmo atual.
Por falar em renováveis, no último trimestre do ano passado, as eólicas e fotovoltaicas inglesas geraram, pela primeira vez, mais energia do que as oito plantas nucleares de sua majestade. Só as térmicas a gás geraram mais, aliás, quase o dobro das renováveis.
SISTEMA AVALIA VULNERABILIDADE CLIMÁTICA NO PAÍS
Um sistema de monitoramento das vulnerabilidades climáticas no Brasil foi oficialmente lançado na semana passada. O SisVuClima, desenvolvido pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), incorpora um modelo de análise da vulnerabilidade dos municípios em relação aos impactos da mudança climática global. O sistema abrange os municípios de seis estados: Paraná, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Maranhão e Amazonas. Segundo sua descrição, foram analisados “os eventos extremos esperados em cada município e como a região está estruturada para lidar com ele (sic). Com essas informações, o gestor terá um instrumento para nortear suas ações e um critério quantitativo para dar prioridade às estratégias de atuação”.
http://sisvuclima.mma.gov.br/sobre/
AS REDES INTERLIGADAS DA CORRUPÇÃO
Essa nota não tem ligação direta com o clima físico. Mas o clima político fica mais fácil de entender a partir de um trabalho publicado no começo do ano no Journal of Complex Networks. Luiz Alves e grupo pegaram os mais importantes processos de corrupção ocorridos entre a redemocratização, entre 1987 e 2014 e montou um mapa de relacionamentos entre estes a partir das pessoas envolvidas. A figura é genial e mostra uma teia de corrupção que, no fundo, envenena e sufoca o país. Não deu para incluir o que veio após 2014, quando a Lava Jato ainda engatinhava.
https://arxiv.org/pdf/1801.01869.pdf
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/28/politica/1522247105_599766.html
NEGÓCIO DE PETRÓLEO TEM POUCO FUTURO
Aos poucos as petroleiras vão admitindo que seu negócio não têm muito futuro e, junto com o mercado financeiro, começam a enxergar, cada vez mais perto, o dia em que a demanda por petróleo começará a cair. No começo do ano, o Bank of America disse que a entrada dos carros elétricos fará este pico acontecer por volta de 2030. Em seguida, a agência de rating Fitch disse que o pico ocorrerá antes de 2030. Logo depois, a BP disse que a demanda não vai nem crescer nem cair nos próximos 20 anos e, na semana passada, a Shell disse que o pico deve acontecer pouco depois de 2030, e que a demanda deve despencar em 90% até algum dia na 2a metade do século. Dois dos problemas destas visões é que se centram no carro como o grande consumidor de petróleo, e que as petroleiras mais moderninhas dizem que o gás natural é um fóssil quase limpo. Só que nem o carro é único transporte consumidor de combustíveis fósseis, nem o gás natural é limpo. Por enquanto, os cenários das petroleiras parece mais uma cortina de fumaça fóssil do que o começo de novos planos de negócio para estas megacorporações.
Por falar em Shell, Greg Muttitt desmontou no Price of Oil muita da fumaça que a empresa soltou com seu recente relatório Sky. Greg mostra que as contas da empresa deixam o mundo muito longe dos 2oC visados pelo Acordo de Paris. Ou, dito de outra forma, para que exista uma chance de 66% do aquecimento global ficar dentro deste limite, alguém terá que descobrir um jeito de remover uma quantidade brutal de CO2 da atmosfera. O que Greg acha bem difícil acontecer.
http://priceofoil.org/2018/03/28/shell-game-oil-company-says-climate-future-is-fossil-fuelled/
GREENPEACE ROMPE COM O FSC, A MAIS CONHECIDA CERTIFICAÇÃO FLORESTAL
O Greenpeace decidiu sair do Forest Stewardship Council (FSC), a mais conhecida das certificações de produtos sustentáveis da floresta, cujo selo aparece em várias embalagens de produtos de madeira, papel e papelão. Segundo o Greenpeace, o FSC anda falhando em “regiões de alto risco, onde as instituições democráticas e da sociedade civil são fracas e onde o nível de corrupção é alto”. Também disse que há nos métodos do FSC uma certa falta de transparência, exemplificada pela não publicação de mapas digitalizados com a localização das florestas certificadas. O FSC comunicou que está desenvolvendo ferramentas digitais para aumentar a credibilidade de suas certificações.
NORTE-AMERICANOS NÃO ACHAM A MUDANÇA DO CLIMA UMA AMEAÇA SÉRIA, E AUSTRALIANOS NÃO QUEREM MAIS CARVÃO
Uma pesquisa da Gallup apontou que diminuiu o número de republicanos que acredita que há um consenso científico acerca da mudança do clima, que seus efeitos já começaram e que a principal causa é a humanidade. Um terço dos republicanos acha que todo esse alarde sobre o clima é um exagero. No ano passado, mais da metade dos entrevistados republicanos achava que a mudança do clima é real. Agora são só 42%. Do outro lado do ringue, aumentou a quantidade de democratas que entende que os efeitos já estão aí e que o clima será uma ameaça muito séria ao longo de suas vidas. Como vários cientistas e políticos disseram ao longo do ano passado, a mudança do clima não está em votação.
Do outro lado do mundo, outra pesquisa revelou que a maioria dos australianos querem se livrar do carvão, inclusive os que apoiam a ala mais conservadora da Coalizão de centro-direita atualmente no governo. 60% dos pesquisados apoia os esforços para deletar o carvão da matriz energética até 2030.
http://news.gallup.com/poll/231530/global-warming-concern-steady-despite-partisan-shifts.aspx
DESERTO LOTADO DE VOLKSWAGENS
Por conta do escândalo ‘dieselgate’, no qual a empresa foi pega trapaceando nas medições de poluentes dos seus carros a diesel, a VW-EUA recomprou centenas de milhares de automóveis que havia colocado naquele mercado. Mais de 300 mil destes carros estão hoje estacionados em 37 áreas que a empresa teve que comprar ou arrendar para este fim. Uma foto divulgada pela Reuters é impressionante. Em uma destas áreas, no deserto perto de Los Angeles, tem cerca de 21 mil carros estacionados. A Volks já teve que desembolsar mais de US$ 3 bilhões só para acertar os motores desses carros e de compradores que quiseram ficar com eles.
Em tempo: uma porta-voz da VW disse que “esses veículos estão sendo armazenados em uma base provisória e rotineiramente mantidos de forma a garantir sua operabilidade e qualidade a longo prazo, para que possam ser devolvidos ao comércio ou exportados quando os reguladores dos EUA aprovarem as modificações de emissões apropriadas”.
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/03/deserto-vira-cemiterio-de-veiculos-da-volkswagen.shtml
O DESERTO DO SAARA ESTÁ SE EXPANDINDO
Um estudo que acaba de sair, e que é o primeiro a examinar a extensão do Saara numa escala de tempo de um século, mostrou que o deserto cresceu pelo menos 10% desde 1920, em parte por conta da mudança do clima. Desertos são regiões onde chove pouco, e este pouco depende de uma série de fenômenos naturais, em destaque a Oscilação Multidecadal do Atlântico e a Decenal do Pacífico. A primeira tem um período de entre 50 a 70 anos e, na sua fase fria, está correlacionada com pouca chuva ao sul do Saara. A do Pacífico corresponde a temperaturas variando num período de 40 a 60 anos. Para atribuir a expansão do deserto à mudança do clima, os pesquisadores removeram as duas oscilações da modelagem estatística e ficaram, basicamente, com os efeitos diretos da mudança do clima. Concluíram, assim, que mais de 60% da expansão do deserto se deve à mudança do clima. O trabalho também sugere que outros desertos mundo afora podem estar também crescendo.
https://journals.ametsoc.org/doi/10.1175/JCLI-D-17-0187.1
https://www.sciencedaily.com/releases/2018/03/180329141035.htm
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