PROPOSTA DE ANEXAÇÃO DA PASTA DO MEIO AMBIENTE À AGRICULTURA PASSA POR CHEQUE DE REALIDADE
As idas e vindas do governo eleito na proposta de submissão da pasta do meio ambiente à da agricultura continuam dando o que falar.
O Observatório do Clima (OC) mostrou que “nenhum grande produtor de commodities e nenhum país com as dimensões do Brasil tem essa junção ou anexação. Nos EUA, na Índia, na China, no Canadá, no México, na Argentina e na Espanha as pastas são separadas. Na Austrália a pasta do meio ambiente incorpora a agenda energética; na Alemanha, incorpora a segurança nuclear… [na Holanda e no Reino Unido] buscou-se a transversalidade das políticas, mas priorizando o meio ambiente”. No mesmo artigo, e por conta de observações como “80% da energia hidrelétrica do país [ser] gerada por rios que nascem em ou passam por unidades de conservação, e o maior projeto de mineração de ferro do planeta [estar] dentro de uma unidade de conservação no Pará”, o OC afirma que “submeter esse patrimônio à agenda de um único setor da economia [agricultura] significa prejuízo potencial a outros e a toda a sociedade.”
Lilian Venturini resumiu para o Nexo as principais responsabilidades de cada ministério e colheu opiniões à respeito. E a presidente do Ibama, Suely Araújo, mostrou à Folha o despropósito da proposta, já que, dos cerca de 2,8 mil processos de licenciamento em andamento no Ibama, apenas 29 têm relação com a agricultura.
A imprensa ainda buscou a opinião de analistas econômicos e do agronegócio. Se a busca serve como amostra, o número de opiniões contrárias à anexação ganha de longe das favoráveis à proposta.
https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,fusao-de-ministerios-divide-agronegocio,70002577787
PARA A OPINIÃO PÚBLICA, LEIS AMBIENTAIS NÃO IMPEDEM O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
Uma pesquisa de opinião feita ao longo da campanha eleitoral buscou entender se os brasileiros acham que o meio ambiente é ou não um obstáculo ao desenvolvimento. Foram ouvidas quase 500 mil pessoas entre 21 de setembro e 29 de outubro. Só 13% dos entrevistados acham que a legislação ambiental é um obstáculo ao crescimento econômico, contra 32% que entendem que não é obstáculo algum. A pesquisa ainda segmentou as respostas conforme gênero, escolaridade, região e na intenção de voto. A polarização na intenção de voto é claramente refletida no entendimento da questão desenvolvimento versus ambiente. E ⅔ das mulheres discordam completamente – ou um pouco – de que a legislação ambiental atrapalha o desenvolvimento.
IBAMA PEDE MAIS DADOS SOBRE O IMPACTO DA EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO NAS PROXIMIDADES DOS CORAIS DA AMAZÔNIA
O Ibama pediu mais informações sobre os impactos que a exploração de petróleo pode ter sobre o extenso banco de corais que existe na foz do rio Amazonas. O órgão já tinha pedido o mesmo para a francesa Total. Desta vez, pediu à BP. O parecer diz que “ainda são necessários informações e esclarecimentos adicionais para subsidiar o processo de licenciamento da atividade”.
https://epbr.com.br/ibama-quer-mais-dados-da-bp-na-foz-do-amazonas
RURALISTAS PRIORIZARÃO ABRANDAMENTO DO LICENCIAMENTO
A deputada Tereza Cristina, líder da bancada ruralista, disse que a grande prioridade da bancada no ano que vem será a aprovação da flexibilização do licenciamento, em versão mais destrutiva do que a negociada com o governo no 1º semestre. A bancada tentará aprovar o projeto antes do novo congresso tomar posse, já que algumas lideranças importantes da bancada não foram reeleitas. Se tudo seguir como tem sido, os ruralistas deverão contar com o apoio da mineração e de setores da indústria.
Em tempo 1: os desastres de Mariana, da Hydro Alunorte, a contaminação da Baía de Guanabara e da Bacia de Campos são exemplos do que pode vir pela frente.
Em tempo 2: na região do desastre de Mariana, vários projetos bancados pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais estão parados por falta de verba. Em nota, a Fundação disse que “diante das dificuldades financeiras do estado, o Comitê de Fluxo Financeiro da SEF não liberou para a Fapemig recursos suficientes para pagamento do valor total de R$ 1.925.292,48, referente à 2ª parcela da chamada”. https://epbr.com.br/licenciamento-ambiental-sera-prioridade-da-bancada-ruralista-em-2019
A INSUSTENTABILIDADE DOS CENÁRIOS DA IEA
A Agência Internacional de Energia (IEA) deve publicar, ainda neste mês, a edição 2018 do seu Energy Outlook com cenários para o futuro da energia no mundo. Adiantando o expediente, o pessoal da Oil Change International pediu para que um dos cenários seja compatível com um aquecimento global limitado a 1,5oC, e mostrou que o cenário feito no ano passado não é suficiente nem para chegar com 66% de probabilidade aos 2,0oC em 2040. A principal crítica é que a IEA diz que, para manter o aquecimento abaixo dos 2,0oC até o final do século, as emissões líquidas (o que se emite de fato menos o que se remove da atmosfera) terão que continuar caindo até zerar em 2060. Para isso, eles entendem que as tecnologias de captura e armazenamento de carbono terão que funcionar em larga escala. Coisa que a própria IEA desconfia que não dará certo. Sem contar com isso, o diretor executivo da Agência, Fatih Birol, disse recentemente que “as mudanças do sistema energético impostas por um orçamento de carbono tão restrito são brutais… mal dá para imaginá-las olhando da perspectiva de hoje”. Greg Muttitt, da Oil Change, diz que os cenários do IEA são basicamente tendenciais (business as usual) e que 5 das grandes petroleiras disseram que não precisariam mudar de rota e não teriam ativos encalhados – os stranded assets. Muttitt lembra que a IEA publicou cenários mais desafiadores em 2016 e pede para que a Agência volte a adotá-los, ao invés de justificar a vida das petroleiras.
http://priceofoil.org/2018/10/31/explainer-iea-scenarios-and-the-paris-goals/
A GEOPOLÍTICA DA MUDANÇA DO CLIMA
Ao longo destes últimos dois anos, a revista Foreign Affairs vem publicando uma série de artigos que buscam entender as mudanças econômicas e geopolíticas que um clima cambiante pode trazer:
– Toda a política climática é local: as emissões norte-americanas caíram novamente, apesar de Trump, graças a estados, cidades, empresas e partes da sociedade que assumiram o desafio. O artigo lança um olhar sobre a interrelação entre os governos centrais e as ações produzidas no nível local.
– Um mundo esquentando: a mudança do clima será o eixo determinante da geopolítica do século, mais do que a economia vacilante de 2008 e as tensões entre EUA e China, simplesmente porque atinge transversalmente todas as sociedades que habitam o planeta.
– A ilusão dos 2oC: para o autor, sobrinho do Prêmio Nobel de Economia deste ano, esta meta já não é mais viável e a manutenção deste foco atrapalha esforços para a preparação das sociedades para o enfrentamento do que vem à frente.
– A mudança do clima é uma doença crônica: o sistema de saúde sofreu uma transformação quando o tratamento das doenças crônicas passaram do reativo para o preditivo. Os autores entendem que o mesmo precisa acontecer em relação ao clima, simbolizado pela constatação de que eventos extremos são o novo normal.
– Extremos climáticos e a saúde global: para a saúde, pior do que o calor, é a combinação de calor e umidade. Acrescente uma pitada generosa de poluição e salpique com várias doenças infecciosas transmitidas por vetores que proliferam exatamente na combinação calor e umidade. Esse é um quadro provável e, por enquanto, evitável.
https://www.foreignaffairs.com/lists/how-to-understand-the-geopolitics-of-climate-change
https://www.foreignaffairs.com/articles/united-states/2018-09-24/all-climate-politics-local
https://www.foreignaffairs.com/articles/2018-06-14/warming-world
https://www.foreignaffairs.com/articles/world/2018-02-08/two-degree-delusion
https://www.foreignaffairs.com/articles/united-states/2018-09-18/climate-change-chronic-condition
https://www.foreignaffairs.com/articles/2018-07-31/climate-extremes-and-global-health
77% DOS CONTINENTES SÃO OCUPADOS PELA ATIVIDADE HUMANA
Pesquisadores australianos fizeram um mapa do mundo mostrando onde ainda existe vegetação natural. O mapa foi publicado na Nature, em tempo para a Convenção da Biodiversidade, que começa esta semana no Egito. Só 23% da área dos continentes pode ser considerada nativa, sendo que o restante foi perdido pelo contato direto com atividades humanas. Há um século, era o contrário: 15% da superfície da terra era pasto e lavoura. A maior parte da parte intacta fica na Amazônia, na Sibéria e na floresta boreal no Alasca e no Canadá, além dos grandes desertos do Saara, de Gobi e do outback australiano. Rússia, Canadá, Austrália, EUA e Brasil abrigam 70% das regiões ainda selvagens do planeta. John Robinson, da Wildlife Conservation Society (WCS), disse que essas regiões “só serão preservadas se estas nações assumirem um papel de liderança. Já perdemos muito. Precisamos aproveitar as oportunidades para proteger as áreas selvagens antes que desapareçam para sempre”.
É triste constatar que Trump, Putin, o governo conservador da Austrália e Bolsonaro não são os líderes necessários para esta preservação. E teremos eleições gerais no Canadá no próximo ano.
https://www.nature.com/magazine-assets/d41586-018-07183-6/d41586-018-07183-6.pdf
OCEANOS ABSORVERAM MAIS CALOR DO QUE SE CALCULAVA
Até há pouco se achava que os oceanos tinham absorvido 90% do excesso de calor da atmosfera produzido pelo homem. Usando um novo método, para o qual o registro histórico é maior, pesquisadores mostraram que, na verdade, os oceanos absorveram 60% à mais. Como a quantidade de gases de efeito estufa é a mesma, isso quer dizer que eles esquentam mais a atmosfera do que se supunha. Assim, também reduzem o orçamento de carbono para a manutenção do aquecimento em 1,5oC. Aqui, a conta é bem mais complexa e será preciso rodar os poderosos modelos climáticos com os novo valores de sensibilidade da atmosfera para ver em que pé estamos. Também serão necessários mais trabalhos para confirmar a validade do novo método e estendê-lo para um volume maior de dados.
https://www.nature.com/articles/s41586-018-0651-8
https://www.bbc.com/news/science-environment-46046067
AQUECIMENTO GLOBAL BAGUNÇA OS JET STREAMS
A onda de calor deste verão no hemisfério norte foi atribuída a mudanças nos jet streams, que praticamente não se moveram, o que fez com que os sistemas de ar quente também ficassem praticamente estacionados. Um trabalho que acaba de sair na Science Advances revelou o papel dos aerossóis na formação dos jet streams. Um dos principais grupos de aerossóis são as microscópicas partículas emitidas pela queima de combustíveis como carvão, biomassa e óleo diesel. Os aerossóis atenuam o aquecimento global, poluem as cidades e provocam uma grande lista de enfermidades. As políticas de redução de poluentes reduzem os males à saúde, mas, por outro lado, deixam de esfriar a atmosfera. No hemisfério norte, onde os aerossóis se concentram sobre a zona temperada, isso reduz a diferença de temperatura na atmosfera entre essa zona e o Ártico. O trabalho mostra que esta atenuação favorece o modo praticamente estacionado dos jet streams, o que exacerba os extremos climáticos. No começo do ano, as regiões centrais do Canadá e dos EUA passaram por um frio intenso e prolongado. No verão, foi a onda de calor. E o trabalho prevê que esta situação se agravará com a redução da poluição no hemisfério norte. Do nosso lado do Equador, a massa continental é muito mais dispersa, muito menos poluída e a concentração de aerossóis também é menor.
http://advances.sciencemag.org/content/4/10/eaat3272.full
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