ClimaInfo, 8 de janeiro de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Aumentam as ameaças a terras indígenas

O secretário de demarcações, Luiz Nabhan Garcia, disse que o governo reverá todas as demarcações homologadas nos últimos dez anos, com a alegação da existência de “falhas” e “erros” processuais. Bernardo Mello Franco comentou n’O Globo que “é uma desculpa esfarrapada para abrir novas áreas ao desmatamento e à pecuária extensiva.”

A exemplo do processo da demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol, que foi finalmente decidido pelo STF, essas revisões de processos tenderão a parar no plenário do Supremo, que, pela Constituição vigente, tem a palavra final. E não o poder executivo.

Ontem, Márcio Santilli, do ISA e ex-presidente da Funai, deu uma entrevista à CBN falando das drásticas mexidas feitas neste começo de governo, em especial do esquartejamento da Funai entre os ministérios da agricultura e de direitos humanos. “Foi uma decisão equivocada. O ministério da justiça (que era responsável pelo órgão) tem um papel muito importante em relação às minorias e processos de demarcação. Foi uma perda muito grande”.

 

Depois das falsas acusações feitas por Bolsonaro e seu ministro do meio ambiente, Suely Araújo deixa a presidência do Ibama

Numa continuação da disseminação de notícias falsas, o novo presidente e seu ministro do meio ambiente vieram a público tuitar a intenção de investigar um contrato feito pelo Ibama para a locação de veículos no valor de R$ 30 milhões. Claramente disseram ter achado um caso de mau uso de recursos públicos. A ainda presidente do órgão, Suely Araújo, rebateu rapidamente mostrando todo o processo licitatório e as justificativas técnicas que embasaram a licitação. Em nota, Suely Araújo disse se tratar de “acusação sem fundamento” que “evidencia completo desconhecimento da magnitude do Ibama e de suas funções”. Bolsonaro rapidamente tirou do ar seu tuíte com a acusação. Ontem, Suely Araújo entregou antecipadamente o cargo. O nome escolhido por Bolsonaro, Eduardo Bim, deve assumir antes do combinado.

 

Mais de 90% das áreas protegidas do país ficam na Amazônia

Pelas contas do prof. Gerd Sparovek, da ESALQ, a área total das unidades de conservação e terras indígenas no país é de 2,17 milhões km2. Sparovek chama a atenção para 93% dessa área ficar na região Amazônica: são quase 2 milhões km2, quase metade de todo o bioma. No resto do país, as unidades de conservação e terras indígenas ocupam menos de 7% do território. Falando do Código Florestal, Sparovek estima que, nas propriedades rurais, há um déficit de 230 mil km2 entre Áreas de Proteção Permanente e áreas de Reserva Legal. Os proprietários rurais deveriam ter vegetação nativa numa área de 1,77 milhões km2, enquanto esta área, hoje, é de 1,54 milhões km2. No final da entrevista dada a O Globo, Sparovek aponta onde este déficit é marcante: “Em APPs ( margens de rios e topos de montanhas, por exemplo ), com certeza. A restauração das APPs irá trazer um ganho ambiental enorme, principalmente na questão hídrica, como a qualidade da água e a regulação da vazão dos rios, evitando enchentes e problemas na captação. Todos serão beneficiados com isto.”

 

As fontes renováveis estão cada vez mais competitivas na América Latina

Trabalho da consultoria PSR mostra que “em pouco mais de uma década, elas (as fontes renováveis) passaram de ‘energias exóticas’ para ‘complementares’, depois ascenderam para ‘mainstream’ e, atualmente, dominam as expansões de capacidade de muitos países.” O trabalho traz resultados recentes da modelagem do sistema elétrico nacional, levando em conta os tradicionais dados hidrológicos, mas, incorporando as fontes eólica e solar, tanto em centrais quanto na geração distribuída. Os resultados mostram que as renováveis, longe de gerar instabilidade no sistema ou de exigir pesados investimentos e custos operacionais para o atendimento das variações, terão um papel cada vez mais importante na matriz de geração. Um caso importante é o caso do Nordeste, onde as estações de ventos e de chuvas são complementares. Há não muito tempo, a represa da usina de Sobradinho precisava acumular muita água nas chuvas para continuar gerando no período seco. Com cada vez mais eólicas gerando exatamente na estação seca reduz-se a necessidade de armazenamento de água na represa. “Em outras palavras, diminuir a demanda no período seco equivale a um aumento virtual da capacidade de armazenamento dos reservatórios. Isto potencialmente reduz a necessidade de construção de novos reservatórios reais, o que tem sido um tema bastante controverso.” A conclusão do trabalho diz que “os resultados de estudos de planejamento em vários países da América Latina indicam que a geração renovável (eólica, solar, biomassa, etc.) é plenamente competitiva. Isto significa que a descarbonização do setor elétrico depende menos de políticas governamentais do que em outras regiões do mundo. Esta expansão é puramente econômica, isto é, não inclui qualquer diretiva governamental sobre metas de inserção de renováveis.”

A análise apareceu no editorial do último número de 2018 do seu boletim de análises, o Energy Report, e foi comentada pelo Canal Energia.

Em tempo: o Energy Report é distribuído apenas para assinantes do serviço.

 

A eletromobilidade no Brasil e na América Latina

O ICCT (International Council on Clean Transportation) publicou sua “Avaliação Internacional de Políticas Públicas para Eletromobilidade em Frotas Urbanas” comparando o que está sendo feito no mundo para incentivar o mercado de veículos elétricos. O trabalho busca apontar caminhos para o desenvolvimento de políticas públicas que façam o mesmo aqui no Brasil. Os governos da China, dos EUA, da Europa e de países vizinhos, agem para reduzir barreiras para a penetração dos elétricos e apoiam investimentos em infraestrutura como redes de recarga e outras ações. Demonstram clareza na intenção de substituir os motores a combustão interna pelos elétricos, seja para reduzir a poluição atmosférica, seja para mitigar o aquecimento global. O diagnóstico do ICCT parte de que essa clareza de intenção falta ao Estado brasileiro. Olhando para o Brasil, o destaque deles é o transporte coletivo em ambientes urbanos, prioritários em relação aos veículos particulares, por conta da demanda por serviços de transporte de qualidade para a maioria da população. E que tem o potencial de produzir o benefício adicional de redução de congestionamentos e dos tempos de deslocamento. A avaliação das alternativas “incluiu os custos do ciclo de vida e as emissões de carbono negro e de GEEs [gases de efeito estufa] dos ônibus convencionais a diesel, biodiesel, híbridos a diesel e elétricos, elétricos a bateria e elétricos movidos a célula de combustível. A análise revelou que os custos do ciclo de vida das tecnologias de ônibus híbridos a diesel e elétricos a bateria são competitivos em relação aos ônibus a diesel P7 (padrão regulatório para emissões veiculares atualmente vigente no Brasil) para a maioria dos tipos de ônibus da frota de São Paulo. É importante enfatizar que estes resultados refletem os custos atuais da tecnologia elétrica, que serão reduzidos substancialmente em anos futuros, quando a tecnologia amadurecer e os volumes de produção aumentarem.” Talvez a recomendação mais importante do trabalho seja a de que “o Brasil precisa articular claramente suas motivações para a eletromobilidade, de maneira que elas sejam traduzidas em políticas públicas e implementadas como ações e programas que se complementam. Uma das principais lições aprendidas é que, sem motivações claras, como ocorre atualmente no Brasil, essa integração de esforços raramente acontece”.
No final do ano, o New York Times publicou uma matéria sobre os  elétricos na América Latina. Posto que cerca de 80% da população latino-americana vive em cidades, o potencial de eletrificação do transporte público é gigantesco. Segundo os autores, “a região tem a maior utilização de ônibus por pessoa do mundo. Eletrificar as frotas de ônibus as tornaria mais limpas, confortáveis e mais baratas ao longo da vida útil dos veículos”. A região também tem a enorme vantagem de ter a matriz elétrica mais limpa do mundo, com metade da geração vinda de fontes renováveis. A matéria aponta os principais obstáculos à proliferação dos elétricos: eles são mais caros no ato da compra, os combustíveis fósseis são fortemente subsidiados e a infraestrutura de recarga ainda é incipiente. O artigo fala das políticas locais, muitas vezes na contramão do desejado.

 

A importância das fontes renováveis para o Chile e a Alemanha

Em artigo publicado no New York Times no começo da COP24, a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet, disse que “todos os dias, novos estudos fornecem evidências do preço da inação: secas, incêndios florestais, tempestades violentas ou volumes intensos de chuvas com forte impacto na agricultura, na criação de animais e na infraestrutura. O preço da inércia também é visível no desalojamento forçado de milhões de pessoas, e nos sistemas públicos de saúde, sob pressão para reagirem a novos cenários epidemiológicos.” Ela toma o exemplo da vulnerabilidade do Chile às mudanças do clima, apesar das emissões do país serem significativamente menores do que as dos grandes emissores do mundo em desenvolvimento, como China, Índia e Brasil. Em seu último mandato, Bachelet buscou incluir a componente climática no planejamento da energia no país: “Graças a uma programação agressiva e ambiciosa definida em 2014, durante meu segundo mandato na presidência, triplicamos a quantidade de energias renováveis na nossa matriz e reduzimos os preços do megawatt/hora de US$130 para US$32. Antes de 2014, nós não só éramos dependentes da energia importada de outros países como vivíamos à mercê de secas longas e severas. De lá para cá, passamos a usar a potência contida no Sol e nos ventos de nossos desertos e ao longo do litoral, além de fazer uso do vapor presente no interior dos vulcões por meio das centrais geotérmicas (…) E também estamos investindo no futuro, implantando as primeiras taxas ‘verdes’ da região, além de proibir o consumo de sacos plásticos.” O UOL traduziu o artigo.

Na Alemanha, no ano passado, pela primeira vez desde que o carvão começou a alimentar a revolução industrial, as fontes renováveis geraram mais eletricidade do que as térmicas movidas com este combustível fóssil.

 

China limita as emissões dos caminhões diesel

Além de contribuir para o aquecimento global, as emissões dos caminhões a diesel na China são uma das principais componentes da poluição das megacidades. O governo chinês acaba de entrar no quinto ano da sua ‘guerra contra a poluição’, prometendo aumentar significativamente a frota de caminhões compatíveis com o padrão de emissão ‘China VI’ até o ano que vem. A meta é ter pelo menos 90% da frota atendendo a este padrão. Em breve, caminhões não compatíveis com a nova norma não mais poderão ser vendidos.

Lá, como aqui, a quantidade de carga transportada por trens é pouco expressiva frente à carregada pelo transporte rodoviário. O Ministério do Meio Ambiente chinês disse que, embora representem menos de 8% do total de veículos que roda no país, os caminhões são responsáveis por ¾ das emissões de particulados e mais da metade das emissões de NO2.

 

Reino Unido quer zerar as emissões da agropecuária

A agropecuária responde por 10% das emissões do Reino Unido. Em uma conferência realizada na semana passada, a presidente do Sindicato Nacional dos Fazendeiros, Minette Batters, disse que os produtores rurais precisam adotar como meta a redução a zero de suas emissões líquidas até 2040. Para zerar as emissões líquidas, é preciso que a mesma quantidade de gases de efeito estufa emitida seja removida da atmosfera. Em novembro, o governo publicou uma estratégia para reduzir as emissões do setor que inclui o pagamento a proprietários que restaurem habitats nativos que funcionem como sorvedouros de carbono. Para comparar, as atividades agropecuárias no Brasil são responsáveis por cerca de 25% das emissões nacionais, sem a inclusão das emissões por desmatamento, parte das quais é provocada pela pressão indireta feita pela expansão da produção agropecuária. Pelo andar da carruagem, pelos próximos anos nosso agro vai caminhar no sentido oposto ao dos ingleses.

 

Águas-vivas se proliferam com o aquecimento global

Quase 4.000 banhistas australianos sofreram queimaduras por águas-vivas nas praias do estado de Queensland no último final de semana. Um salva-vidas descreveu a invasão como uma parede de águas-vivas. Embora ocorram até 30.000 casos de queimaduras ao longo do ano em todo o país, parece ter sido a primeira vez que uma concentração desse porte acontece em alguma parte e em um único final de semana.

Águas-vivas existem há cerca de 500 milhões de anos e têm se proliferado aceleradamente em todo o mundo. Por um lado, águas mais quentes favorecem sua reprodução. Por outro, elas sobrevivem melhor do que seus predadores em águas poluídas. Posto que a humanidade está contribuindo bastante para aquecer e sujar os oceanos, os casos de queimadura e outros impactos graves só tendem a aumentar.

 

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