Promessas de net zero escondem intenção de não parar com queima de combustíveis fósseis

net zero

As promessas de neutralidade climática, ou net zero, até 2050 se tornaram um biombo que esconde a intenção de prolongar a vida de petroleiras e petroestados por muito tempo. Peter Kalmus, no The Guardian, aponta os problemas com as duas partes do compromisso.

2050 está em um futuro distante posto que governos e mandatos de CEO duram anos, e não décadas. Eles podem prometer o que quiserem pois a conta não cairá em seus colos. E a “neutralidade” é fortemente dependente de se remover dióxido de carbono da atmosfera numa escala impossível com a disponibilidade de terra e no estado da tecnologia atual.

O net zero é tachado de “pensamento mágico” por Kalmus. Ele comenta as manchetes da semana passada sobre o lançamento da maior planta de captura de armazenamento de CO2 na Islândia: Ela “capturará um décimo-milionésimo das emissões atuais da humanidade” e é cara demais para se viabilizar em escala. Kalmus diz que há um indicador de que governos comecem a levar a crise climática a sério: cortar os subsídios aos fósseis e proibir a expansão de sua infraestrutura. Qualquer coisa que não atingir a indústria fóssil mortalmente corresponde a simplesmente aumentar o aquecimento global.

Vale muito ler um editorial do The Guardian com um recado semelhante: “O fato inescapável permanece inalterado: os combustíveis fósseis continuarão a aquecer nosso planeta enquanto continuarmos a queimá-los. As promessas de net zero são promessas vazias, a menos que sejam acompanhadas de compromissos obrigatórios de parar.”

Prova de que governos e a sociedade rica não entendeu o recado é que o consumo de fósseis pelos países ricos não para de crescer. Segundo a Bloomberg, além de EUA e Europa, a demanda por petróleo e gás na China e na Índia também crescem e devem ultrapassar o nível pré-pandemia ainda este ano.

Por aqui, o Ministério Público Federal entrou com uma ação para suspender a audiência pública sobre a exploração de petróleo na bacia Sergipe-Alagoas, próximo do imenso delta da foz do Rio São Francisco. O MPF quer que as Comunidades Quilombolas e Tradicionais sejam ouvidas presencialmente de forma prévia, livre e informada sobre a atividade que pode afetá-las diretamente. A audiência está marcada para amanhã. O Info São Francisco comentou a ação.

Em tempo 1: Após uma longa campanha de ativistas e ex-alunos, uma das mais ricas e poderosas universidades americanas, a tradicional Harvard, anunciou que começará a desinvestir em atividades fósseis. A universidade tem uma dotação de mais de US$40 bilhões, dos quais cerca de US$840 milhões estão investidos em empresas que exploram e desenvolvem reservas fósseis. O comunicado da direção é mais vago do que queriam os manifestantes, mas representou, para estes, uma vitória após 20 anos de luta. Vale ver as matérias do próprio pessoal da Divest Harvard e na Harvard Crimson. A repercussão foi forte e saiu aqui, na Folha, e nos EUA, nos Washington Post, New York Times, Bloomberg, Fortune, The Hill, Boston Globe e na Reuters. The Guardian também comentou.

Em tempo 2: Amy Westervelt, no The Guardian, escreveu sobre as táticas de comunicação das grandes petroleiras, se apresentando como comprometidas com o futuro, assumindo compromissos de net zero, de reduzir as próprias emissões e investir em remover CO2 da atmosfera. Ela conta que a propaganda deixou para trás o negacionismo e busca projetar uma imagem positiva e aversa a disrupções drásticas.

 

ClimaInfo, 13 de setembro de 2021.

Se você gostou dessa nota, clique aqui para receber em seu e-mail o boletim diário completo do ClimaInfo.