Guterres: apostar na produção de mais petróleo é “uma loucura”

Guterres
Czarek Sokołowski/AP

Enquanto o Brasil planeja expandir sua produção de petróleo, o secretário-geral da ONU, António Guterres, repetiu suas críticas à corrida das grandes economias para aumentar a queima de combustíveis fósseis na próxima década, o que contraria diretamente os objetivos globais de redução das emissões de carbono sob o Acordo de Paris.

“A guerra da Rússia na Ucrânia pode derrubar os mercados globais de alimentos e energia, com grandes implicações para a agenda climática global. À medida que as principais economias buscam uma estratégia para substituir os combustíveis fósseis russos, medidas de curto prazo podem criar dependência de combustível fóssil de longo prazo e fechar a janela para 1,5°C”, alertou Guterres na abertura de uma conferência sobre sustentabilidade promovida ontem pela revista The Economist.

Para o secretário-geral da ONU, “os países podem se tornar tão consumidos pelo imediatismo do fornecimento de combustíveis fósseis que [eles podem] negligenciar ou enfraquecer as políticas para reduzir o uso de combustíveis fósseis”, continuou ele. “Isso é loucura. O vício em combustíveis fósseis é uma destruição mutuamente assegurada”. Associated Press, BBC, Bloomberg, Guardian, RFI, Valor e Washington Post repercutiram a crítica de Guterres.

O apelo do chefe da ONU, no entanto, parece não comover os governos de muitos dos maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo. A Bloomberg destacou como a fome de China e Índia por mais carvão já está aumentando os preços de contratos futuros e causando impactos climáticos imediatos, como a liberação de metano na atmosfera. Já o Climate Home abordou a “satisfação” do governo da Austrália com a alta dos preços do petróleo, gás natural e carvão, que beneficiam diretamente o país, um dos maiores produtores de carvão do mundo. Com as restrições aplicadas por Estados Unidos e União Europeia à indústria fóssil russa, os australianos estão em posição privilegiada para ocupar esse espaço e ampliar o fornecimento de combustível fóssil para esses mercados.

A insistência dos países com a energia fóssil e os reflexos das tensões geopolíticas sobre a cooperação climática global prenunciam dificuldades para o mundo conseguir cumprir seus objetivos climáticos nesta década e além, argumentou o professor Wake Smith, da Universidade de Yale (EUA), em artigo no The Hill. “A invasão brutal da Ucrânia pela Rússia é uma tragédia em muitos aspectos, mas é um forte lembrete de como pode ser difícil amarrar todas as nações do mundo ao árduo objetivo de atingir rapidamente as emissões líquidas zero. Na medida em que o Ocidente trabalha no futuro para destituir o presidente Vladimir Putin por meio de sanções, devemos esperar pouca cooperação na busca de uma meta climática que dependa fortemente da boa vontade internacional”, escreveu.

 

ClimaInfo, 22 de março de 2022.

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