A menos de seis meses das eleições presidenciais, o atual governo federal espera ansioso pela aprovação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia para mostrar na campanha eleitoral ao menos um exemplo de sucesso da diplomacia brasileira nos últimos quatro anos. O caminho para isso, no entanto, é repleto de cascas de bananas – e muitas delas foram jogadas ao chão pelo próprio presidente da República.
Passada a disputa eleitoral na França, onde foi utilizado como “abacaxi” tanto pelo presidente reeleito Emmanuel Macron como pela adversária dele, Marine Le Pen, o acordo ganhou fôlego nos últimos dias. A ideia da Comissão Europeia é dividir o texto em pedaços, de maneira a facilitar a ratificação das partes menos polêmicas. Nesse formato, a aprovação da parte comercial não dependeria necessariamente da ratificação do acordo pelos 27 países da UE, mas apenas do Parlamento Europeu. Já os trechos relativos ao meio ambiente e sustentabilidade, mais polêmicos, ficariam para um segundo momento, provavelmente após a eleição presidencial brasileira. A Reuters destacou também outro esforço da UE para aprovar o acordo: um adendo que reforçaria dispositivos ambientais nas trocas comerciais transatlânticas.
Já no Valor, Daniela Chiaretti conversou com o comissário da UE para o meio ambiente, Virginijus Sinkevicius, que passou pelo Brasil na semana passada para conversar com representantes do governo federal. O argumento dos europeus é simples: uma política ambiental mais proativa, focada no combate ao desmatamento e na ação climática, faria toda a diferença em prol da aprovação do acordo comercial com o Mercosul. “Espero liderança [do governo brasileiro]. O Brasil tem uma situação única, com ecossistemas únicos, vasta biodiversidade”, disse Sinkevicius.
O problema é que, como a Folha assinalou, nem o governo nem o Congresso Nacional estão fazendo muito esforço para facilitar a aprovação do acordo Mercosul-UE. Pelo contrário: o avanço de propostas polêmicas, como a que libera a mineração em Terras Indígenas e a que flexibiliza o licenciamento ambiental, está deixando os europeus com a pulga atrás da orelha e reforçando o argumento de grupos protecionistas do bloco, que apontam para as falhas da política ambiental brasileira como uma lacuna que pode comprometer a competitividade dos produtores rurais europeus.
Além disso, como bem lembrou O Globo em editorial, temos o passivo de um governo que se notabilizou pelos descaso e desprezo criminoso com o meio ambiente. Por mais que as lideranças da UE se desdobrem para tirar o acordo com o Mercosul do papel, não há como ignorar que a intensificação do comércio com o Brasil, especialmente de commodities agrícolas, resultaria em mais incentivos para a destruição ambiental.
Em tempo: Mesmo com a sombra da guerra na Europa, o Brasil não escapará de cobranças internacionais pela escalada do desmatamento no encontro do Fórum Econômico Mundial que acontece no final do mês em Davos, na Suíça. O principal representante do país no evento será o ministro Paulo Guedes, que terá o desafio de justificar o descalabro ambiental no país e defender o governo de críticas em um momento-chave antes da campanha eleitoral. O Valor deu mais informações.
ClimaInfo, 3 de maio de 2022.
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