Muito barulho por nada: governo insiste em pagar pelo monitoramento do desmatamento que já tem

22 de maio de 2022
Elon Musk no Brasil
Reprodução

O presidente da República se entusiasmou nesta 6ª feira (20/5) com a rápida passagem do empresário Elon Musk por terras brasileiras. Para quem se gaba de defender a soberania nacional na Amazônia, o chefe do Executivo nem piscou na hora de pedir ao bilionário sul-africano por ajuda para monitorar o desmatamento, a despeito de o próprio governo já contar com tecnologia e expertise de décadas neste trabalho pelo INPE. Ou seja, o presidente quer pagar por algo que já possui na esperança de que os satélites de Musk enxerguem aquilo que nenhum satélite no mundo consegue fazer: mostrar que o governo “protege” a floresta.

A cisma do presidente com o INPE vem desde o começo do atual governo, quando os sistemas DETER e PRODES mostraram uma explosão do desmatamento amazônico a partir de 2019. Na época, o Palácio do Planalto fez aquilo no qual se especializou ao longo da gestão: negou a realidade. O presidente demitiu o chefe do INPE, o cientista Ricardo Galvão, e impôs uma série de restrições ao funcionamento do órgão, estrangulando seu orçamento quase ao ponto de inviabilizá-lo. Ao mesmo tempo, o presidente tentou envolver as Forças Armadas nessa história, com direito a contratações milionárias de sistemas estrangeiros de satélite sem qualquer transparência.

Para o presidente, a visita de Musk ao Brasil foi a chance de retomar essa paranoia. Em tese, o bilionário veio ao país para discutir um projeto de conexão à internet via satélite de sua empresa Starlink em áreas remotas no interior do Brasil. No entanto, o governo insinuou que existiria a possibilidade de que a tecnologia oferecida por Musk pudesse ajudar no monitoramento do desmatamento amazônico – e, na visão do presidente, ajudá-lo a promover pelo mundo a mensagem de que a floresta não está tão destruída como dizem por aí.

Mas a Starlink, como O Globo destacou, não faz monitoramento espacial: seu serviço apenas viabiliza uma banda para conexão à internet. Seus satélites não contam com câmeras nem com tecnologia para analisar mudanças no uso do solo.

“Não é por falta de achar desmatamento e de monitorar que a gente não tem fiscalização e controle do desmatamento”, esclareceu Tasso Azevedo, do MapBiomas, ao g1. “Pelo contrário, o que falta é essa parte da fiscalização e do controle”. Assim, como Ricardo Galvão comentou, o anúncio do presidente e de Musk não passa de um “jogo de cena político”.

O mais grave, no entanto, está naquilo que o presidente deixou implícito em sua fala e que, tomado ao pé da letra, vai contra a tão professada “defesa da soberania brasileira na Amazônia”. Ao invés de ter controle sobre dados geográficos de uma área estratégica para o Brasil, o presidente prefere dar de mão beijada a um empresário sem qualquer relação com o país só porque os satélites não contam aquilo que ele quer ver.  “O que está em jogo hoje não é apenas a capacidade de monitoramento da Amazônia. Mas o controle sobre os dados que tal sistema irá gerar e que estarão nas mãos de um magnata estrangeiro”, escreveu Jamil Chade no UOL.

 

ClimaInfo, 23 de maio de 2022.

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