Gás para empregar quem? Governo oficializa programa sob ilusão de que gás fóssil pode gerar empregos

Brasil gás natural
Tauan Alencar/Divulgação MME

Lançado há quase dois meses, o programa “Gás para Empregar”, que pretende usar o gás fóssil para a “reindustrialização” do país, foi oficializado pelo governo federal. A pergunta que não quer calar é: empregar quem?

Os ministérios que lideram a proposta – Minas e Energia (MME) e Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) – não mostraram quanto gás fóssil pretendem queimar nessa reindustrialização “suja”, já que ignora a energia renovável, muito menos quantas vagas de trabalho o programa pretende gerar.

Segundo a epbr, o programa tem como objetivo ampliar a oferta e a infraestrutura do recurso fóssil no país. Com isso, pretende aumentar a disponibilidade do gás para fertilizantes nitrogenados, produtos petroquímicos e outros setores produtivos, reduzindo a dependência externa de “insumos estratégicos”.

Aqui há pelo menos duas incoerências. Uma delas é que ofertar mais gás fóssil para o setor industrial não se traduz em mais empregos. O que se faz é dar à indústria a oportunidade de trocar um combustível por outro. Pior: cria-se o risco de desestimular o setor industrial a buscar fontes renováveis de energia.

Outra incongruência é ainda considerar o gás fóssil como insumo estratégico. Era uma visão comum no século passado, mas insistir nela hoje é ignorar os alertas de cientistas, da ONU e da própria Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) de que é preciso parar “para ontem” a produção e o consumo de petróleo e gás fóssil.

A resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que dá a partida no programa não menciona diretamente o uso do combustível na geração de energia elétrica. Entretanto, afirma que caberá a um grupo de trabalho do programa apresentar propostas para integrar o gás fóssil à “estratégia nacional de transição energética para contemplar sinergias e investimentos que favoreçam o desenvolvimento de soluções de baixo carbono, como o biogás/biometano, hidrogênio de baixo carbono, cogeração industrial e captura de carbono”. Em suma: dizer que vai usar carbono para descarbonizar.

Vale lembrar o relatório do Banco Mundial, lançado no início deste mês, que afirma ser desnecessário que o Brasil invista na expansão da geração termelétrica a gás fóssil. A instituição critica diretamente os 8 gigawatts (GW) previstos na lei de privatização da Eletrobras, de 2021.

“Renunciar aos 8 GW adicionais de capacidade do gás representaria uma economia para o Brasil de 20% em custos do sistema elétrico no cenário convencional, que cairia de R$ 374 bilhões para R$ 250 bilhões”, calcula o Banco Mundial, em uma projeção de custos para o ano de 2050.

Agência Brasil, Energia Hoje e Canal Energia também noticiaram a criação do grupo de trabalho do programa.

ClimaInfo, 19 de maio de 2023.

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