Brasil pode financiar duto que trará gás produzido com fracking na Argentina

fracking Vaca Muerta
Lara Otero

O fraturamento hidráulico, ou fracking, é uma técnica de exploração de reservas de petróleo e gás fóssil não convencionais proibida em vários países – no Brasil, há uma lei no Paraná banindo o processo –, pelos seus graves impactos ambientais e riscos à saúde humana. No entanto, o governo brasileiro está prestes a financiar o gasoduto Néstor Kirchner, que começou nesta semana a operar seu primeiro trecho para levar o gás fóssil de Vaca Muerta para Buenos Aires, reduzindo a importação da Bolívia. Há na mesa, porém, uma extensão do duto até o Brasil. Segundo manifestações do próprio governo brasileiro, o apoio à obra dessa segunda etapa se daria via BNDES, no financiamento de US$ 690 milhões, segundo a epbr.

De acordo com a Folha, o governo argentino aposta no gasoduto para alcançar a independência nessa fonte de energia até 2025 e aliviar a crise econômica que assola o país. De quebra, deixa a Argentina mais próxima de exportar esta suja commodity ao Brasil, embora nada ainda tenha sido fechado.

Para defender a técnica, a indústria costuma usar Vaca Muerta como exemplo de prosperidade e desenvolvimento econômico. Mas, como mostra a Agência Pública, a realidade é muito diferente do que o tal “mercado” propagandeia. A região estende-se por mais de 35 mil km2 – pouco superior à área de Porto Velho (RO), a maior capital brasileira –, majoritariamente em Neuquén, mas alcançando mais três províncias vizinhas.

Um dos impactos mais impressionantes do fracking são os tremores de terra registrados em Neuquén a partir de 2015, pouco depois que a atividade começou, em 2011. Já são mais de 400 identificados pelo Observatório de Sismicidade Induzida. O mais forte, de grau 5, aconteceu em março de 2019. 

Sauzal Bonito, a 150 km da capital Neuquén, é o povoado onde mais intensamente são sentidos os sismos e seus efeitos. Fica próximo a Fortin de Piedra, o principal campo produtor de Vaca Muerta. Lá vive o casal de idosos Carlos e Noemi Peréz, cuja casa está cheia de rachaduras causadas pelos tremores. Como não havia tremores antes, as construções do povoado não contam com estruturas antissísmicas.

A população indígena de Neuquén também é afetada: a liderança Mapuche Diego Rosales conta que a comunidade Fvta Xayen está no local há cerca de cem anos. As famílias de lá viviam tranquilas até 2013. Foi quando as empresas começaram a praticar a técnica do fraturamento hidráulico na região. E agora, além da atividade, lutam com supostos “proprietários da terra” que surgiram após isso e contra os impactos ambientais, reitera a Folha.

Embora cerca de 45% do gás fóssil da Argentina saia de Vaca Muerta e, em Neuquén, 60% do orçamento venha de contribuições das petroleiras, 38,4% da população está abaixo da linha da pobreza, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC).  “As pessoas não têm banheiro em casa, mas têm um poço de petróleo ao lado”, conta uma trabalhadora da área de saúde em Valentina Norte Rural, bairro periférico na zona oeste da capital, que pediu para ter sua identidade preservada.

A inauguração do “gasoduto do fracking” foi noticiada também por Bloomberg Línea, Petróleo Hoje e Petronotícias.

ClimaInfo, 23 de junho de 2023.

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