As rotas do crime na Amazônia, do gado ilegal à extração de madeira

Amazônia crime organizado
Marizilda Cruppe / Greenpeace

Atividades ilegais na Amazônia não são novidade. Mas com o abandono da fiscalização e o estímulo ao crime e à destruição da floresta promovidos pelo governo passado, a ação dos criminosos ficou ainda mais descarada. O garimpo ilegal na Terra Yanomami ganhou projeção midiática internacional, mas há outros exemplos envolvendo a pecuária e a extração de madeira.

A criação de gado ilegal na Amazônia foi alvo de uma operação do ICMBio que durou quase dois meses. Investigações do órgão mostraram que a Reserva Biológica Nascentes da Serra do Cachimbo, no Pará, uma área de transição entre o Cerrado e a Amazônia, foi sistematicamente invadida por grileiros e desmatada para abrir espaço para os animais, mostra o Fantástico.

A reserva, de proteção integral, foi criada em 2005 para proteger centenas de mananciais que abastecem os rios Xingu e Tapajós – dois dos mais importantes rios amazônicos. O repórter Victor Ferreira, da Globonews, esteve na região e verificou que também havia trabalho análogo à escravidão.

Nos 53 dias da operação, o ICMBio apreendeu 2.300 cabeças de gado na área. Mas, segundo estimativa do órgão ambiental, há ainda 100 mil cabeças de gado a serem retiradas da reserva biológica. “Os donos são pessoas com histórico criminal, alguns autuados por submeter pessoas à escravidão contemporânea. É como se tivessem certeza da impunidade”, diz Ferreira ao podcast O Assunto.

A expansão da fronteira em áreas que eram de mata nativa aconteceu em 2019, no que ficou conhecido como “Dia do Fogo” – articulação criminosa combinada em grupos de mensagens por fazendeiros no Pará para gerar queimadas ilegais em diversos pontos da região. “Os grileiros vendem a madeira que têm valor comercial, depois colocam fogo e aí sobrevoam a área jogando semente de capim, alimento para o gado”, detalha Ferreira.

Quanto à madeira ilegal, os bandidos usam rodovias federais e estaduais para transportar toneladas de árvores. Toras derrubadas no Mato Grosso e no Pará abastecem mercados como São Paulo, Paraná e Distrito Federal, relata o Correio Braziliense.

“Estudos mostram que a maioria do desmatamento ocorre até 50 km de um eixo de rodovia principal. Quanto mais acesso às áreas de floresta que ainda não foram exploradas, maior a facilidade de quem vai fazer a extração, seja ela legal ou ilegal. Qualquer tipo de melhoria em acesso, em área com floresta preservada, contribui para o aumento da exploração ilegal de madeira”, explica Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace.

Em tempo 1: Ex-ministra do Meio Ambiente da Bolívia, Alexandra Moreira está desde 2018 à frente da Organização do Tratado de Cooperação dos Países Amazônicos (OTCA). A uma semana da Cúpula da Amazônia, a secretária-geral da OTCA afirma ao Valor que o evento e a COP30, em 2025, vão servir para “abrir os olhos” do mundo para a realidade da região, muito mais complexa do que parece a quem só a conhece de longe. “Houve recentemente um evento preparatório em Letícia, na Amazônia colombiana, e muita gente reclamou: ‘Não tem internet, não tem hotel, não tem muita coisa’. Bem-vindos à Amazônia!”, provoca. Segundo Moreira, ainda não há clareza no setor privado e mesmo nos governos da região sobre as reais necessidades da Amazônia. “Não se trata só de financiamento, mas também de cooperação”, alerta.

Em tempo 2: Falando em (falta de) infraestrutura na região amazônica, a superintendente de Desenvolvimento Sustentável da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Valcléia Solidade, chama atenção para o papel da energia elétrica no desenvolvimento amazônico. “Não é possível a manutenção da floresta em pé caso não seja aprimorada a qualidade de vida das populações da floresta, os verdadeiros guardiões do bioma. Para materializar essas ações, é necessário fontes limpas renováveis de energia para as pessoas que vivem nas comunidades. A partir do momento em que a eletricidade chega nesses locais, é possível iniciar o processo de conectividade à internet e, assim, colaborar na geração de renda”, avalia ela, em artigo n’((o))eco.

ClimaInfo, 1º de agosto de 2023.

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