Declaração da Cúpula da Amazônia ignora demanda popular e não cita petróleo

Cúpula da Amazônia Carta de Belém
CanalGov

“Declaração de Belém” ignora apelo popular pelo fim da exploração de petróleo na Amazônia e não estabelece meta comum de desmatamento zero, como queria Lula.

“É uma lista de promessas. O mundo está derretendo. Não é possível que, diante de tudo o que está acontecendo, oito líderes de países amazônicos não consigam dizer com todas as letras: ‘Acabou o tempo da derrubada de florestas’. Faltou algo mais contundente.”

A fala do secretário geral do Observatório do Clima, Márcio Astrini, no Estadão mostra a frustração que tomou conta de ambientalistas, cientistas e movimentos sociais com o documento final da Cúpula da Amazônia.

A “Declaração de Belém”, assinada por líderes e representantes dos oitos países amazônicos, traz, de fato, uma extensa lista de intenções, distribuídas em 113 tópicos. Mas não avançou em estabelecer compromissos firmes com o fim da exploração de petróleo na região – proposta pelo presidente da Colômbia, Gustavo Petro –, nem com uma meta comum de desmatamento zero para todas as nações da região até 2030 – demanda do presidente Lula.

Foi de Petro a fala mais impactante no encontro dos presidentes amazônicos nessa 3ª feira (8/8), destaca a Folha. O líder colombiano jogou luz sobre os dissensos em torno do encontro – em especial sobre o fim do petróleo na Amazônia, rejeitado por Lula.

“Há um enorme conflito ético, sobretudo por forças progressistas, que deveriam estar ao lado da ciência. [Os governos de] direita têm um fácil escape, que é o negacionismo. Negam a ciência. Para os progressistas, é muito difícil. Gera então outro tipo de negacionismo: falar em transições”, afirmou.

O Metrópoles destaca outra fala contundente do presidente da Colômbia: “O que estamos fazendo além dos discursos? A floresta, que poderia nos salvar do CO2, acaba por produzir CO2 quando exploramos petróleo e gás nela”, criticou.

Apesar dos protestos – populares e de Petro –, o texto final não trouxe um veto à exploração de petróleo em território amazônico, reforça o g1. O assunto teve espaço tímido na “Declaração de Belém”, que fala apenas em “iniciar um diálogo” sobre a sustentabilidade de setores “como mineração e hidrocarbonetos”.

Se fez vista grossa para o fim da exploração de petróleo, o governo brasileiro também viu frustrada sua proposta de que os demais países concordassem em adotar uma meta de zerar o desmatamento ilegal da floresta amazônica até 2030, como o Brasil já fez. Não houve consenso, e a meta não foi incluída no documento.

Mas nem tudo foi frustração, claro. A “Declaração de Belém” prevê uma Aliança de Combate ao Desmatamento. Também consta no documento a oferta, pelo governo brasileiro, do Centro de Cooperação Policial Internacional, em Manaus, para a cooperação entre as polícias dos países, e o estabelecimento de um Sistema Integrado de Controle de Tráfego Aéreo para combate ao tráfego aéreo ilícito, o narcotráfico e outros crimes.

No exterior, a abertura da Cúpula da Amazônia teve destaque em diversos veículos, como Associated Press, Bloomberg, Guardian e Reuters, entre outros.

Em tempo 1: Folha e RFI repercutiram a reação negativa do jornal francês Libération à ausência do presidente do país, Emmanuel Macron. Convidado ao encontro de Belém, na condição de governante da Guiana Francesa, o líder francês optou por enviar um representante diplomático. “Essa ausência é incompreensível, dada a importância dessa região [Amazônia]: não é possível se declarar preocupado com os desafios ambientais e depois dar as costas a um evento como esse”, disse o Libération.

Em tempo 2: Oito meses depois de subir a rampa com Lula em Brasília, Raoni Metuktire tentou se encontrar com o presidente durante a Cúpula da Amazônia, tomou um chá de cadeira de quatro horas e acabou recebido por quatro ministros em uma copa nos fundos do Hangar, o centro de convenções onde ocorre o evento, relatam OC e g1. “Acho que da próxima vez que eu me encontrar com ele [Lula] eu vou ter que puxar a orelha dele”, disse o líder Kayapó. Foi a segunda vez que Lula deu bolo no cacique. Duas semanas atrás, o presidente foi convidado e era esperado no “Chamado do Raoni”, grande encontro que reuniu mais de 700 pessoas na aldeia Piaraçu, no território kayapó de Mato Grosso. Lula havia acabado de passar por um procedimento médico no quadril e não compareceu. No entanto, na mesma semana, o presidente foi à festa de casamento do senador Randolfe Rodrigues em Brasília.

Em tempo 3: “O Brasil tem a oportunidade perfeita, com a presidência do G20 em 2024 e a COP em 2025, para, através de sua liderança, encontrar formas criativas de colocar com força o tema das florestas na agenda climática”. A frase é de Simon Stiell, o engenheiro que ocupa o mais alto posto no secretariado da Convenção sobre Mudança Climática da ONU (UNFCCC). Stiell disse em entrevista a Daniela Chiaretti, no Valor, que as “florestas são simultaneamente vítimas dos impactos da atividade humana no clima e têm grande contribuição no combate à crise climática através da captura de carbono (…) A criação destas alianças globais traz força às agendas da floresta e da biodiversidade.” Stiell se refere a um novo bloco político que viu se formando na Cúpula da Amazônia.

 

ClimaInfo, 9 de agosto de 2023.

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