Brasil em chamas 2: onde o clima extremo encontra o “crime extremo”

16 de setembro de 2024
Brasil chamas clima extremo crime extremo
Corpo de Bombeiros RJ/Divulgação

Em meio a incêndios devastadores, governo se desdobra para ajudar estados e municípios a combater chamas, agravadas por uma seca histórica, mas parlamentares ignoram tragédia.

“Se a gente não tiver quem comece esses incêndios, se não tiver ação humana, não tem fogo. E o que está acontecendo agora é que o clima extremo encontrou o crime extremo, e esse crime continua atuando impunemente, principalmente na Amazônia. Essa impunidade ajuda a riscar o fósforo, essa impunidade também ajuda a tudo isso que a gente está passando no Brasil hoje.”

A explicação do secretário Executivo do Observatório do Clima (OC), Marcio Astrini, no Jornal Nacional, resume o Brasil dos últimos meses. Com as mudanças climáticas, causadas principalmente pela queima de combustíveis fósseis, o país vive muito calor e uma seca histórica. Condição ideal para que criminosos, muitos ligados ao agronegócio, aproveitem a estiagem para incendiar vegetação nativa para expansão agropecuária.

Assim, em vez de um “Dia do Fogo”, como ficou conhecido o evento promovido por fazendeiros do Pará em agosto de 2019 para incendiar trechos da floresta – e que terminou sem responsabilização dos culpados –, vivemos um “Ano do Fogo”. A pior seca no país em sua história recente, detectada pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN), facilita a vida dos criminosos não apenas na Amazônia, mas também em outros biomas, como o Cerrado e o Pantanal. O “investimento” no desmatamento, que exige mais maquinário e recursos, está sendo trocado pelo fogo na vegetação seca, explicou o presidente do IBAMA, Rodrigo Agostinho.

É o que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, chama de “terrorismo climático”, destaca o g1. “Há uma proibição do uso do fogo em todo o país, mas existem aqueles que estão fazendo um verdadeiro terrorismo climático usando a temperatura alta e a baixa umidade e ateando o fogo no nosso país, prejudicando a saúde das pessoas, a biodiversidade, destruindo as florestas.”

A ministra destacou que há evidências de que as ações são coordenadas e feitas com intenção criminosa. Já são 52 inquéritos abertos para investigar a suspeita. Em São Paulo, a Polícia Federal já encontrou indícios de ação coordenada. Os inquéritos também apuram as queimadas na Amazônia, no Pantanal e em Brasília, onde o fogo atingiu a Floresta Nacional há dez dias.

O governo corre para literalmente apagar incêndios em todo o país e é cobrado – com razão – por todos, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Já o Congresso finge que não é com ele, destaca o Correio Braziliense.

Não há registro da presença de deputados e senadores onde a crise climática está mais aguda. O noticiário referente ao Congresso – incluindo o esforço concentrado da semana passada – está restrito às articulações para a sucessão de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara, em fevereiro de 2025. Sem falar na tentativa de aprovar a anistia aos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Não se discute a “chuva preta” resultante da fumaça dos incêndios, que polui as águas e faz mal à saúde e à natureza e que está caindo sobre partes do Sul e do Sudeste, como mostram Jornal Nacional e Estadão.

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) mostra que desde o início de agosto, o Brasil teve ao menos 10,1 milhões de pessoas diretamente afetadas pelos efeitos dos incêndios florestais que atingem boa parte do país há semanas, informam Folha e Valor. Um número conservador, pois considera apenas os diretamente afetados pelos incêndios, e não a população total dos municípios – nem os que têm respirado fumaça gerada a milhares de quilômetros de distância, caso do Rio Grande do Sul, que não registra focos de incêndio.

Até o fim de agosto, o Brasil registrou incêndios em 224 mil km², área equivalente à de Roraima. Sozinho, o mês passado responde por quase metade de toda a área queimada no ano, lembram Estadão e R7. E os sintomas dessa tragédia ambiental são percebidos na saúde das pessoas, destaca o Jornal Nacional. Além de problemas respiratórios, a poluição acomete coração, cérebro, rins e fígado podendo se disseminar e causar processos inflamatórios nesses órgãos.

Com os efeitos do fogo sobre a saúde se agravando, a Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) decidiu ampliar a atuação nos estados e municípios afetados pelas queimadas, informam Agência Brasil e UOL. A partir desta 2ª feira (16/9), serão realizadas visitas de equipes nos estados do Acre, Amazonas e Rondônia. A mobilização é uma demanda do Ministério da Saúde e tem como objetivo avaliar a situação e apoiar gestores estaduais e municipais.

Diante do “novo anormal” provocado pelas mudanças climáticas – não apenas as secas e ondas de calor, mas também a chuvas extremas, como as que castigaram o Rio Grande do Sul em maio -, Marcio Astrini, do OC, reforça que é preciso que medidas mais agressivas e urgentes sejam tomadas para evitar que as consequências disso se tornem ainda mais intensas e severas. Em entrevista ao Estadão, ele destaca que apesar dos avanços, os esforços ainda são pequenos e atrasados, e os governantes precisam “sair do discurso e começar a agir”.

O Globo, Agência Brasil e Estadão também repercutiram os efeitos dos incêndios em todo o país.

Em tempo 1: Um estudo do INPE identificou um aumento nos dias consecutivos sem chuvas no Brasil nas últimas décadas. Entre 1961 e 1990, a média era de 80 a 85 dias, e, na última década, subiu para cerca de 100, informa O Globo. O norte do Nordeste e o centro do país são as áreas mais afetadas pelos longos períodos de estiagem. O cálculo foi feito a partir da estimativa do número de dias seguidos com precipitação inferior a 1 mm.

Em tempo 2: Diante da tragédia climática e ambiental, Giovana Girardi faz um apelo na Agência Pública: que pensemos na falta de ar provocada pela fumaça das queimadas na hora de votar. “Se a tragédia atual pode ter alguma utilidade é que ela mostra de modo bastante gráfico – e sensorial – como tudo está conectado. Mudança do clima é um problema de saúde, de abastecimento de água, de segurança alimentar e energética. Os biomas desmatados, em chamas, são um problema para as cidades a milhares de quilômetros de distância. Não se esqueça dessa sensação de não conseguir respirar e leve-a junto com o título eleitoral para as urnas no próximo dia 6 de outubro. O candidato que não está levando isso tudo a sério e não tem planos reais para lidar com essas questões não merece o seu voto.”

 

 

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ClimaInfo, 12 de setembro de 2024.

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