
Negociadores, analistas e observadores ainda fazem as contas sobre o impacto potencial da vitória do negacionista climático Donald Trump na disputa presidencial nos Estados Unidos. A volta de Trump à Casa Branca trará dificuldades aos esforços globais contra a crise climática, mas ainda há incerteza sobre como a comunidade internacional poderá atuar para compensar o recuo dos EUA da arena multilateral. O primeiro teste de fogo já começa na semana que vem, com o início da COP29 de Baku, no Azerbaijão.
“[A volta de Trump] impacta muito nas negociações, porque os EUA são os maiores poluidores históricos do planeta, são os que mais devem nesta conta do clima e são também os que mais podem fazer nesta questão climática”, observou Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, à RFI. “Temos agora um ambiente muito mais difícil para uma COP que já estava extremamente complicada”.
Na mesma linha, o professor José Antônio Cheibub, da Universidade de Pittsburgh (EUA), falou à Agência Pública sobre como o afastamento do governo norte-americano das negociações internacionais pode dificultar o esforço global contra as mudanças do clima: “Estamos falando de um país que ainda é um dos mais importantes do mundo, que influencia o planeta inteiro, e será comandado por uma pessoa que desacredita na relevância das mudanças climáticas.”
Não à toa, os países chegarão à COP29 com muita cautela. Segundo a Reuters, os negociadores da União Europeia esperavam contar com o apoio dos EUA em Baku para pressionar a China e os países petrolíferos do Golfo Pérsico a contribuir para o financiamento climático internacional. Agora, com perspectiva zero de suporte norte-americano, essa articulação ficará quase impossível.
Outra preocupação, também fundamental para o futuro do Acordo de Paris, é o efeito da provável saída dos EUA do Acordo de Paris sobre os compromissos climáticos dos demais países. Como a Bloomberg assinalou, para viabilizar um limite próximo de 1,5oC ao aquecimento neste século, as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) que devem ser apresentadas até fevereiro precisarão ser mais ambiciosas do que os compromissos atuais. Sem os EUA nessa ciranda, a pressão por mais ambição pode ficar comprometida.
O impacto da eleição de Trump para a ambição climática atinge em cheio as expectativas políticas do Brasil para a próxima COP30 de 2025 sediada no país. O Globo informou que representantes do governo federal e especialistas temem que a saída dos EUA das negociações climáticas enfraqueça a Conferência, programada para acontecer em Belém (PA).
A ministra Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima) evitou críticas específicas a Trump ou aos EUA, mas questionou se os demais países “precisarão trabalhar dobrado” por conta da omissão dos EUA. “Estamos trabalhando com todo afinco e, obviamente, o mundo vai buscar que nenhum país promova qualquer tipo de retrocesso, qualquer retorno ao passado, daquilo que nós já avançamos em relação aos compromissos e à governança climática global”, afirmou, citada por CNN Brasil e Folha.
Para a ex-diplomata Laurence Tubiana, uma das principais lideranças no processo de negociação do Acordo de Paris em 2015, o Brasil pode ter um papel importante na defesa dos esforços climáticos globais contra os retrocessos dos EUA. “O Brasil tem uma oportunidade fantástica para dizer ‘somos um país do Sul Global e estamos pegando o bastão’”, disse durante evento na última 4ª feira (6/11) em Belém. O Valor deu mais detalhes.
Mesmo com eventuais repactuações e articulações dos demais países, a ausência dos EUA nas negociações climáticas será um desafio importante para o futuro do clima global. “Trata-se da maior economia, o maior financiador, o maior produtor de petróleo. O mundo deveria se ‘afastar do petróleo’, como ficou decidido na COP de 2023, em Dubai. Com Trump, isso é ficção”, escreveu Daniela Chiaretti no Valor.