
Pouquíssimos países fizeram sua “lição de casa climática” dentro do prazo estabelecido pelo Acordo de Paris. Um levantamento feito pelo Carbon Brief mostrou que apenas 10 países, que representam ínfimos 5% dos 195 signatários do tratado, apresentaram a nova versão de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) até a data limite, esgotada nesta 2ª feira (10/2).
Os faltantes representam 83% das emissões globais e quase 80% da economia mundial. Na lista, estão gigantes como China, Índia e os países da União Europeia, além de grandes emissores como Austrália, Canadá, Japão, Arábia Saudita, entre outros.
O buraco aumenta se considerarmos os EUA, que chegaram a apresentar uma nova versão de sua NDC ao final do governo Biden, mas que não valerá nada depois do país deixar novamente o Acordo de Paris por decisão de Trump.
Além dos EUA, a lista de países que apresentaram NDCs atualizadas inclui o Brasil (que apresentou suas novas metas no final do ano passado), Emirados Árabes Unidos, Equador, Nova Zelândia, Reino Unido, Suíça e Uruguai, além dos minúsculos Andorra e Santa Lúcia.
Apresentar o o trabalho em dia isso não significa que este foi feito corretamente. Análises do grupo Climate Action Tracker (CAT) indicaram que as NDCs de Brasil, Emirados Árabes, EUA e Suíça “não são compatíveis” com uma trajetória que possa limitar o aquecimento global em 1,5oC neste século. Apenas a NDC britânica está alinhada a esse objetivo, mas – ressalva o CAT – a falta de apoio financeiro de Londres ao financiamento climático dos países mais pobres reduz sua ambição climática.
O descumprimento quase que generalizado do prazo dificultará a análise da ambição climática agregada dos países, instrumento vital para avaliar os compromissos nacionais na COP30 em Belém (PA) em novembro. Para contornar a situação, o secretariado da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) prorrogou o prazo para entrega das novas NDCs até o 2º semestre deste ano.
Mesmo assim, o risco de um enfraquecimento da ambição global contra a crise climática é real, especialmente se considerarmos o contexto geopolítico e a emergência da extrema-direita negacionista em vários países-chave. A volta de Trump nos EUA abre espaço para que governos alinhados ao negacionismo tentem minar a confiança no Acordo de Paris.
“É essencial que o G20 e outros grandes emissores demonstrem sua liderança com novos [planos nacionais] que mostrem ambição e progresso tangíveis. Precisamos de reduções profundas, rápidas e sustentadas, proporcionais à meta de 1,5oC. Neste momento de crise climática sem precedentes, mais do que nunca precisamos de cooperação internacional aprimorada”, disse ao Guardian Ilana Seid, embaixadora de Palau na ONU e presidente da Aliança dos Pequenos Estados Insulares (AOSIS, na sigla em Inglês).
Além dos impasses geopolíticos, a frustração política com o processo diplomático da UNFCCC também deve ter efeito negativo sobre a ambição climática dos países. Segundo a Bloomberg, a Índia estaria se recusando a ampliar seus compromissos de mitigação por conta do resultado ruim das negociações sobre financiamento climático na COP29, no ano passado. O país asiático foi um dos mais vocais em suas críticas à nova meta financeira global.
AFP, Estadão, O Globo e Reuters também repercutiram o balanço parcial negativo das novas NDCs.