Técnicos acusam Silveira de constrangimento institucional contra IBAMA

No último ataque, ministro de Minas e Energia disse que Rodrigo Agostinho não tinha “coragem” de decidir sobre licença para petróleo na foz do Amazonas.
23 de março de 2025
(MME)

As últimas falas do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre o IBAMA e seu presidente, Rodrigo Agostinho, indignaram ainda mais a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASCEMA Nacional) e organizações da sociedade civil. Árduo defensor da exploração de petróleo e gás na foz do Amazonas a qualquer custo, inclusive ambiental e climático, Silveira subiu o tom nas últimas semanas e disse que Agostinho “está receoso e não tem coragem” de decidir sobre a licença para a Petrobras perfurar um poço no bloco 59, na foz.

A ASCEMA acusa Silveira de provocar constrangimento institucional contra o IBAMA, relatam Folha e Metrópoles. “As reiteradas manifestações públicas do ministro, sugerindo falta de coragem por parte de Agostinho, configuram uma tentativa de constrangimento institucional e demonstram total desrespeito às normas do licenciamento ambiental no Brasil, o que não é compatível com o cargo que ocupa e deveria honrar”, frisou a associação, em nota.

A associação pontua que o IBAMA atua de forma técnica e que o parecer sobre a liberação [ou não] da licença para a Petrobras perfurar um poço na foz do Amazonas seguirá “rigorosamente a legislação”. “Não cabe a agentes externos tentar interferir sobre decisões técnicas, especialmente quando essas declarações partem de membros do próprio governo”, reforçou a ASCEMA.

A escalada da pressão também preocupa especialistas, destaca O Globo. Atropelar o posicionamento institucional não apenas gera mal estar, como fragiliza as instituições e os processos técnicos do poder público, sobretudo numa função tão importante e cara ao Brasil, como é a proteção ambiental, frisou Rarisson Sampaio, porta-voz do Greenpeace Brasil.

Diretor-executivo do Centro Clima no Brasil, Guilherme Syrkis teme que se repita o que se viu na liberação da licença para a hidrelétrica de Belo Monte, uma tragédia ambiental instalada no rio Xingu mesmo diante das recomendações negativas do IBAMA. “Caíram três presidentes do IBAMA até que um foi contra a equipe técnica e autorizou a instalação de Belo Monte. O resultado a gente conhece”, lembrou Syrkis.

A expectativa de Sampaio e Syrkis é que Agostinho negue a licença, seguindo o parecer dos técnicos do órgão ambiental. “Espera-se que o presidente do IBAMA decida pelo indeferimento do pedido e determine seu arquivamento. A decisão precisa ser terminativa. Já temos um parecer e ele foi negativo. O que acontece é um prolongamento indevido de um processo que há muito deveria ter sido arquivado. À Petrobras ainda cabe o direito de voltar à estaca zero e iniciar um novo processo, o qual passará por uma nova análise do IBAMA, refazendo toda a avaliação de impacto”, explicou Sampaio.

  • Em tempo 1: Em relação à cobrança de Alexandre Silveira por uma reunião presencial com Agostinho, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que o encontro ocorrerá após a viagem do presidente Lula ao Japão, e com sua participação, informam Folha e agência eixos. Marina irá acompanhar Lula, e a comitiva presidencial deverá estar de volta ao país no fim desta semana. A ministra voltou a explicar algo que Silveira já deveria saber de cor: a decisão sobre a licença para exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas cabe ao IBAMA e segue critérios técnicos. E não há visita de ministro ao órgão ambiental que possa mudar isso, já disse Marina.

  • Em tempo 2: A pressão de Lula sobre o IBAMA – o presidente acusou o órgão de “lenga lenga” e de agir “contra o governo” na licença para a Petrobras perfurar um poço na foz do Amazonas – põe em xeque a credibilidade do Brasil como potência da diplomacia climática. Mas o problema é muito maior que esse embate inadequado, avaliam Juliano Bueno de Araújo e Nicole Figueiredo, do Instituto Arayara, e Maurício Terena, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), e envolve o que o Brasil planeja para sua transição energética. “Resistir ou sucumbir à indústria do petróleo é uma decisão com altos impactos ambientais, econômicos e políticos de longo prazo. O país anfitrião da COP30 se apresenta como defensor da transição energética ao mesmo tempo em que as decisões oficiais priorizam os combustíveis fósseis, que aquecem o planeta. Não é possível acender as mesmas velas a Deus e ao Diabo”, apontam em artigo no Jota.

  • Em tempo 3: O vazamento de petróleo no Equador aumentou a preocupação com a exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas. Para Suely Araújo, ex-presidente do IBAMA e coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, o número recorde de acidentes em instalações de exploração e produção de petróleo e gás em alto mar registrado no Brasil em 2024 é um mau sinal, disse na “Conversa Bem Viver”, do Brasil de Fato. “Acho que os acidentes vão aumentar na medida que aumenta a produção. O Brasil hoje é o oitavo maior produtor de petróleo do mundo, tem um plano de se tornar o quarto maior produtor. A ambição é grande nesse sentido, infelizmente, porque em plena crise climática, isso não guarda coerência com a ambição do governo de se tornar um líder climático”, argumentou.

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