Explorar petróleo na Amazônia é “fazer guerra para ter paz”, compara ex-presidente do IBAMA

Suely Araújo classifica como “absurdas” justificativas para explorar Foz, que continuam sendo repetidas por Lula e o governador do Amapá.
23 de junho de 2025
petróleo amazônia ex presidente ibama
José Cruz/Agência Brasil

Coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima (OC) e presidente do IBAMA de 2016 a 2018, Suely Araújo negou uma licença para a petroleira francesa Total explorar petróleo na Foz do Amazonas. De lá para cá, as condições ambientais e de conhecimento sobre a bacia, que continua sem uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), não mudaram, e a crise climática piorou, devido à crescente queima de combustíveis fósseis.

Por isso, a especialista é categórica em jogar por terra as justificativas acionadas pelos defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” para buscar combustíveis fósseis na região. Narrativas que são acionadas pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Petrobras, mas também pelo presidente Lula e pelo governador do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade), ávido por receber possíveis royalties da atividade petrolífera no litoral do estado, independentemente do preço ambiental e climático a ser pago.

Suely classifica como “absurdas” as falas de Lula em defesa de explorar petróleo e gás fóssil na Foz. “É como se dissesse, eu vou gerar uma guerra para conseguir paz. Não faz sentido: na verdade, está piorando o problema”, disse em entrevista ao UOL.

Essa “guerra” aumentou com o leilão da ANP na semana passada, quando 19 blocos na região foram arrematados por Petrobras, Exxon, Chevron e CNPC. Somando as áreas já sob concessão – como o FZA-M-59, para a qual a Petrobras pleiteia uma licença de perfuração de um poço ao IBAMA –, já são 28 os blocos na Foz concedidos a petroleiras.

“Esse leilão [da ANP] teve um resultado: está claramente declarada a prioridade do governo e da Petrobras pela exploração na Foz do Amazonas. Uma área onde, pelas condições, seja no mar, seja na costa, não deveria haver exploração. É sensível biologicamente, e complexa em termos de operação de perfuração e produção de petróleo. Temos características ecológicas únicas na região, que tem correntes fortíssimas, o que a torna propícia a acidentes. Em um eventual vazamento, em menos de um dia, a maior parte do óleo já estaria em águas internacionais, e não se sabe ainda quanto desse óleo voltaria para a nossa costa”, explicou a coordenadora do OC.

O governo defende a exploração da Foz argumentando que o dinheiro poderia financiar a transição energética, lembra o UOL. “Por que a gente não pode explorar essa riqueza para fazer outra riqueza acontecer, que é a transição energética?”, questionou Lula. Outro motivo aventado é que os vizinhos Guiana e Suriname já exploram a região, e que uma eventual demora do Brasil poderia comprometer o volume descoberto – a ideia esdrúxula de que Guiana e Suriname têm um “canudinho” que “chupa” o suposto petróleo da Foz.

“Essa justificativa é absurda. Fere as leis da lógica justificar a expansão (da exploração do petróleo) pela transição. A transição é para reduzir o uso de combustíveis fósseis e substituir esse uso. Aí você vai ampliar esse problema para colocar dinheiro na solução dele? Isso vai além da lógica. É um pouco como dizer: ‘eu vou gerar uma guerra para conseguir a paz’”, frisou Suely.

Alheio ao absurdo, o governador do Amapá põe mais gasolina na fogueira dos combustíveis fósseis. Em entrevista ao UOL, Luís rebate as críticas de especialistas e ambientalistas contra a exploração da Foz, acusa o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o IBAMA de “falta de vontade política”, ignorando que o órgão ambiental é técnico, e exalta a atuação do presidente do Senado, seu conterrâneo Davi Alcolumbre (União Brasil), de Lula e da Petrobras para que os projetos de exploração do petróleo na Foz possam ir adiante.

  • Em tempo 1: Em 2008, o líder indígena equatoriano Emílio Chong integrou um processo com ampla participação popular e fez o país ser pioneiro em reconhecer legalmente os Direitos da Natureza em sua Constituição. Em 2023, viu outra mobilização da qual participou ativamente ter resultado, quando os equatorianos decidiram pôr fim à exploração de petróleo no Parque Nacional de Yasuní. Diante disso, Chong destacou ao Um Só Planeta a importância da mobilização para travar a exploração de petróleo em áreas sensíveis como a Foz do Amazonas. “Somos poucos separados, mas somos muitos juntos. É essencial que a população se pronuncie e organize movimentos sociais, pressionando o governo a reconsiderar projetos de exploração”, destacou.

  • Em tempo 2: Protestos de líderes indígenas da Amazônia fizeram o Senado estadual da Califórnia apresentar uma resolução histórica instando autoridades a examinar o papel do estado na importação de petróleo da região, informa a Associated Press. A medida ocorre no momento em que o governo equatoriano se prepara para leiloar 14 blocos de petróleo, que somam mais de 2 milhões de hectares de Floresta Amazônica – grande parte em Terras Indígenas.

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