Populismo de extrema-direita ameaça luta global contra crise climática, alerta John Kerry

John Kerry negacionismo climático
Ralph Alswang / Center for American Progress Action Fund Flickr

Para o enviado especial dos EUA para o clima, a extrema-direita amedronta eleitores sobre efeitos da ação climática na economia e atrapalha a transição verde.

A reação populista contra medidas de combate à mudança do clima está atrapalhando os esforços de governos e empresas para acelerar a transição energética e pode condenar o mundo a um “colapso climático”. Essa é a avaliação de John Kerry, enviado especial dos EUA para o clima e veterano das negociações climáticas internacionais.

Em entrevista ao Guardian, o ex-secretário de estado da gestão de Barack Obama nos EUA criticou a desinformação e a demagogia de grupos de extrema-direita que pintam qualquer esforço para redução de emissões de gases de efeito estufa como uma ameaça à economia. Kerry também lamentou o fato de essa leitura negacionista ter ressonância crescente entre os eleitores em diversas partes do mundo.

“As pessoas não sabem a verdade sobre quais são os impactos de se fazer essa transição [para o net-zero]. Elas estão assustadas, amedrontadas propositadamente com a demagogia que ignora ou distorce os fatos. E, em alguns casos, mente descaradamente”, disse Kerry.

O enviado especial dos EUA para o clima alertou que o negacionismo climático travestido de preocupação econômica pode inviabilizar os esforços globais para evitar o pior da crise climática. “Essa turma da desinformação está disposta a colocar o mundo inteiro em risco por quaisquer motivações políticas que possam estar por trás de suas escolhas”, disse.

Um dos alvos da crítica de Kerry é a direita republicana nos EUA, que persiste em um discurso negacionista da crise climática. Além de dificultar a implementação do pacote climático aprovado pelo presidente Joe Biden, os republicanos também atrapalham os esforços da iniciativa privada para descarbonizar seus negócios.

Um exemplo disso é a ofensiva de estados governados pelo partido contra gestoras de investimentos com políticas de sustentabilidade, o que provocou um baque no mercado financeiro ESG. Empresas importantes do setor, como BlackRock e JP Morgan Asset Management, recuaram nos últimos meses de compromissos climáticos corporativos.

Para Kerry, a reação dessas empresas enfraquece a ação climática. “Qualquer pessoa que esteja se afastando hoje [dos compromissos climáticos] está se distanciando da ciência e respondendo a pressões políticas e ideológicas que não se baseiam em fatos, não se baseiam na ciência”, destacou ao Financial Times.

Essa preocupação é compartilhada por investidores, que ressaltam o problema que a politização da mudança do clima pode causar na análise de riscos das empresas e de seus negócios. A Climate Action 100+, coalizão de gestores de investimentos que vem assistindo a uma debandada de integrantes por conta da ofensiva anti-ESG, destacou que esse esvaziamento pode trazer problemas sérios para a economia global no longo prazo. 

“A crise climática continua representando um risco financeiro cada vez maior para o valor dos acionistas a longo prazo e para a economia em geral, e não podemos nos dar ao luxo de dar um passo atrás agora. Com temperaturas recordes e eventos climáticos catastróficos acontecendo com maior frequência e intensidade, ações ambiciosas são mais cruciais do que nunca”, pontuou a coalizão em nota. A Bloomberg repercutiu essa reação.

 

ClimaInfo, 29 de fevereiro de 2024.

Clique aqui para receber em seu e-mail a Newsletter diária completa do ClimaInfo.