Nesta semana, os EUA definirão a sucessão de Joe Biden – e, por tabela, o destino da ação climática na maior economia do planeta.
A eleição mais acirrada da história recente dos Estados Unidos caminha para sua conclusão em meio a um cenário de incerteza generalizada. As pesquisas indicam uma disputa voto-a-voto entre a vice-presidente democrata Kamala Harris e o ex-presidente republicano Donald Trump. A imprevisibilidade do resultado da eleição está deixando milhões de norte-americanos – e outros milhões (senão bilhões) fora dos EUA – ansiosos para a votação desta 3ª feira (5/11).
Parte dessa ansiedade está associada ao impacto da eleição deste ano nos esforços globais contra as mudanças climáticas. Ignorado por Trump em seu governo (2016-2021), o tema foi um dos carros-chefes da gestão de seu sucessor, o atual presidente Joe Biden, tanto na política doméstica quanto na externa.
Sob Biden, os EUA conseguiram aprovar seu primeiro pacote de políticas públicas para o clima por meio do Ato de Redução da Inflação (IRA). Além disso, o democrata recolocou os EUA no Acordo de Paris, desfazendo o desquite assinado por Trump em 2017. Enquanto Harris promete manter a mesma linha (ainda que sem muitos detalhes sobre o que pretende fazer), Trump já deixou claro que desmontará tudo o que foi feito se retornar à Casa Branca.
O Guardian elencou os riscos de um 2º governo Trump nos EUA. Um exemplo de retrocesso potencial é o desmonte do IRA e dos incentivos para a produção de energia a partir de fontes renováveis. Os EUA seguem como um dos maiores produtores de combustíveis fósseis do mundo, mas o governo Biden deu novo impulso para a geração eólica e solar.
Trump, por sua vez, é crítico dessas fontes, em particular a eólica, acusada por ele de “causar doenças” em animais. As baterias, outro foco de Biden, também são alvo de Trump, com direito a digressões dignas do melhor do teatro do absurdo de Beckett, em cenas que misturam barcos e tubarões.
Outro exemplo, este mais grave, é a pretensão de grupos negacionistas de instrumentalizar o governo norte-americano para atacar a ciência climática. O infame Projeto 2025, formulado por ex-auxiliares de Trump, vai além do simples expurgo de referências sobre clima nas comunicações do governo: uma de suas propostas mais perigosas é a extinção de órgãos governamentais importantes, como a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA).
Na seara internacional, é certo que Trump retirará novamente os EUA do Acordo de Paris caso vença a disputa presidencial. Mas a medida pode ser ainda mais radical, como pontuou o NY Times: pessoas próximas ao candidato republicano defendem que os EUA se retire não apenas do Acordo de Paris, mas também da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), o que significaria um rompimento mais profundo com o multilateralismo climático.
O impacto de uma saída total dos EUA das negociações internacionais sobre o clima é uma preocupação para governos do Norte e do Sul Globais. Por um lado, governos ao redor do mundo reconhecem que a ausência norte-americana pode causar um esvaziamento dos processos internacionais, especialmente se outros países seguirem o mesmo caminho. Por outro, essas lideranças ressaltam que o vai-e-vem dos EUA na agenda climática das últimas décadas abriu margem para que essas negociações sigam avançando mesmo sem a presença de Washington.
“Não quero que isso aconteça, é claro. Mas acho que haverá um sentimento de que temos que dobrar a aposta na estrutura do Acordo de Paris. Acho que todo o mundo está se preparando para isso”, comentou Laurence Tubiana, ex-negociadora da França e uma das arquitetas do Acordo de Paris, ao NY Times.
Bloomberg e POLITICO também abordaram como governos e negociadores ao redor do mundo estão se preparando para os efeitos da eleição dos EUA nas negociações climáticas da ONU.
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ClimaInfo, 4 de novembro de 2024.
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