
A emergência de governos negacionistas da crise climática ao redor do mundo deve dificultar a ação global para redução de emissões de carbono, mas não tem força suficiente para interromper a transição energética para fontes renováveis. Esse é o argumento de Simon Stiell, secretário-executivo da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), para defender a continuidade dos esforços internacionais sob o Acordo de Paris mesmo com os novos obstáculos políticos impostos pela volta de Donald Trump ao poder nos EUA.
Em evento na última 5ª feira no Instituto Rio Branco, em Brasília, Stiell reiterou esse argumento e defendeu os resultados do Acordo de Paris em sua primeira década de existência. “Sem a cooperação climática global organizada pela ONU, estaríamos caminhando para até 5ºC de aquecimento global, uma sentença de morte para a humanidade que conhecemos.Estamos a caminho de cerca de 3ºC, o que é ainda perigosamente alto, mas, felizmente, já entramos em uma nova era”, disse, citado pelo Valor.
Segundo o representante da ONU, os governos e a iniciativa privada já sabem que investimentos em fontes renováveis não apenas ajudam a evitar o pior da crise climática, mas também são financeiramente mais interessantes, com retornos financeiros mais significativos do que as fontes fósseis de energia. “Os investidores sabem que a energia limpa faz muito mais sentido e que a oportunidade de ganhar dinheiro é grande demais para ser ignorada”, pontuou Stiell.
Se a equação financeira para a transição energética já consegue ficar em pé sozinha, o mesmo não pode ser dito do financiamento climático internacional para os países mais pobres e vulneráveis. A frustração com os resultados da COP29 de Baku (Azerbaijão), no ano passado, é um dos fatores que deverão dificultar a negociação na próxima COP30, que acontecerá em Belém (PA) no mês de novembro. Sobre esse ponto, Stiell foi categórico.
“Financiamento climático não é caridade. [Ele] é crucial para proteger as cadeias de suprimentos globais de desastres climáticos em espiral que estão alimentando as pressões inflacionárias”, lembrou o secretário-executivo da UNFCCC, também citado pelo Valor.
Reuters e France24, entre outros, cobriram a viagem de Stiell ao Brasil.
Mas o fantasma do negacionismo segue assombrando especialistas, observadores, negociadores e líderes políticos. A Folha informou que o governo brasileiro está entrando nessa briga com a nomeação de seu primeiro enviado especial contra o negacionismo climático. O indicado é Frederico Assis, da assessoria internacional da Presidência da República.
O enviado ficará responsável por costurar articulações entre organizações da sociedade civil, empresas de tecnologia e governos e desenhar estratégias para aumentar a conscientização sobre a crise climática. Se essas tarefas sozinhas parecem dignas dos Trabalhos de Hércules, a reportagem também informou que Assis também será encarregado de articular alternativas de financiamento para projetos afetados pelos cortes de ajuda dos Estados Unidos, o que tornará o trabalho ainda mais complexo.