Petrobras insiste em produzir petróleo até a última gota

Jean Paul Prates
Waldemir Barreto / Agência Senado

Em encontro com investidores internacionais, presidente da petroleira bate na tecla de que Brasil precisa ter novas fronteiras exploratórias abertas, referência à foz do Amazonas.

Depois de muito choro e ranger de dentes, a COP28 conseguiu incluir uma proposição para que os países que participam da Convenção do Clima da ONU comecem a planejar o abandono dos combustíveis fósseis. Ao que parece, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, não entendeu o recado. 

Há quase um ano, no fim de março, Prates disse que a petroleira que comanda poderia ser “a última empresa a produzir petróleo no mundo”. Uma COP depois, e com cientistas confirmando que 2023 foi o ano mais quente da história, efeito da queima de petróleo, gás fóssil e carvão, o executivo manteve essa posição em encontro com investidores em Nova York no final de janeiro, no qual falou do planejamento estratégico da empresa para o quinquênio 2024-2028.

“Queremos ter condições de estar lá no final do declínio do petróleo. E, para isso, precisamos ter novas fronteiras abertas ou pelo menos acessíveis”, disse Prates. Assim, destaca o Financial Times, em matéria reproduzida pela Folha, o executivo explicou que “precisamos manter o núcleo [do negócio de petróleo e gás fóssil] muito seguro”. E completou: “Não estamos fazendo uma transição louca”.

Do ponto de vista climátio, é loucura sim. Não se pode negar que a petroleira ampliou o valor que pretende investir em descarbonização – são cerca de US$ 11,5 bilhões dos US$ 110 bilhões totais previstos para investimentos de 2024 a 2028. Mas a cifra inclui coisas como captura e armazenamento de carbono, uma tecnologia cara e cuja viabilidade ainda é incerta, além das eólicas offshore e do hidrogênio verde, que estão à espera da regulamentação no Brasil e ainda vão demorar a sair do papel.

A fala de Prates deixa evidente que a Petrobras quer produzir até a última gota de petróleo, mas não se preocupa em ter imediatamente em sua carteira de negócios fontes renováveis já viáveis. Para piorar, essa “última gota” não virá das reservas já descobertas pela petroleira – e que cobrem 12,2 anos de produção, segundo a própria Petrobras – mas sim de novos poços que a petroleira tem esperança de abrir. Como explícito no primeiro parágrafo deste texto, sua intenção está bem distante do que foi acordado pelos países na COP28, inclusive pelo próprio Brasil.

A “bola da vez” exploratória é a foz do Amazonas, apesar da tentativa de disfarçar esse objetivo com o uso de “Margem Equatorial” nas falas de Prates e outros membros do governo. Mesmo com o IBAMA apontando impacto ambiental máximo para o poço que a petroleira quer perfurar no FZA-M-59, os planos não mudaram.

E a pressão da empresa sobre a área ambiental do governo pela liberação da licença para a atividade continua. Assim, Prates afirmou, segundo o Financial Times, que “a Petrobras tem o dever com o povo brasileiro de repor suas reservas de petróleo”. E insinua que o Brasil poderá ficar sem petróleo se não explorar a foz do Amazonas.

“Se não explorar lá, você vai perguntar se vai ficar sem petróleo? De repente, você vai importar da Nigéria, de Angola”. Para reforçar a apelação à exploração de petróleo na foz, o presidente da Petrobras disse que “é melhor pagar impostos em seu próprio país se você tiver o recurso lá”.

A pressão foi reiterada pelo diretor de Exploração e Produção da petroleira, Joelson Mendes. A Bloomberg Línea afirma que Mendes “está com pressa” para explorar áreas fora do pré-sal. “Até 2050, o Brasil será um país insignificante em termos de produção de petróleo, a menos que a Petrobras encontre mais petróleo”.

Ao vislumbrar 2050, vê-se que Mendes e a cúpula da Petrobras ignoram as previsões da Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês) de que a demanda pelo combustível fóssil vai atingir seu pico em 2030, ou até antes, e depois começar a cair. A esse pensamento pode-se dar qualquer nome, menos chamar de transição energética.

Em tempo: A Petrobras anunciou na 4ª feira (7/2) que vai construir uma planta-piloto de eletrólise para produção de hidrogênio de baixo carbono, em projeto com Instituto SENAI de Energias Renováveis e investimentos de R$ 90 milhões, informam Folha, epbr e Tribuna do Norte. Segundo a estatal, o objetivo do projeto, com duração de três anos, é avaliar a produção e a utilização do hidrogênio produzido a partir da eletrólise da água com o uso de energia solar. Serão utilizadas instalações da usina fotovoltaica Alto Rodrigues, da Petrobras, no Rio Grande de Norte. A usina, construída originalmente para fins de pesquisa e desenvolvimento, será ampliada de 1,0 MWp (megawatt-pico) para 2,5 MWp, para suprir a demanda da unidade-piloto de eletrólise.

 

ClimaInfo, 9 de fevereiro de 2024.

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