Estudo derruba alegação que liga BR-319 à crise do oxigênio em Manaus na pandemia

Pesquisadores responsabilizam a negligência do governo Bolsonaro e recomendam  investigação das autoridades por omissão e uso político da crise.
29 de maio de 2025
oxigenio br319 orlando k junior e liam cavalcante
Orlando K. Junior (BR-319) e Liam Cavalcante / Amazônia Real (oxigênio)

Durante a crise de COVID-19 em janeiro de 2021, o governo federal alegou que o transporte de oxigênio pela BR-319 era a única opção para suprir Manaus, colapsada pela falta de insumos médicos. No entanto, dois estudos científicos publicados em periódicos internacionais refutam essa justificativa, demonstrando que o transporte fluvial pelo rio Madeira seria mais rápido, barato e eficiente, noticiou o Vocativo.

O senador Omar Aziz (PSD-AM) usou a crise para defender o asfaltamento da BR-319, afirmando que vidas foram perdidas devido à falta de pavimentação, na audiência de hostilização à Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, na Comissão de Infraestrutura do Senado, na última 3a feira (27/5). Na ocasião, Aziz  desqualificou o discurso de Marina e afirmou que ela tinha desconhecimento da gravidade do ocorrido na capital do Amazonas, quando milhares perderam a vida na segunda onda de COVID-19 por falta de suprimento de oxigênio – sem citar, porém, a precária rede de saúde pública do estado.

De todo modo, estudos comprovam que a rodovia estava intransitável na época, enquanto o rio Madeira se encontrava em condições ideais para navegação, permitindo o transporte em até 52 horas, com custo significativamente menor.

A pesquisa revela que o comboio de caminhões levou 96 horas para percorrer a BR-319, mais que o triplo do tempo previsto, enquanto o transporte fluvial teria custado até R$ 195 mil, contra R$ 2,76 milhões gastos na operação rodoviária. Além disso, o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, admitiu que a decisão foi política, vinculada à promessa de campanha do então presidente  Jair Bolsonaro (PL) de reconstruir a rodovia.

Lucas Ferrante, um dos autores do estudo, destacou à Revista Cenarium que o governo Bolsonaro sabia, pelo menos desde novembro de 2020, que o oxigênio acabaria em Manaus, mas não tomou medidas eficazes como demonstram os estudos publicados nos periódicos científicos. Ferrante publicou  no mesmo ano artigo sobre o tema, que depois passaria a integrar o estudo publicado nos periódicos Journal of Racial and Ethnic Health DisparitiesPreventive Medicine Reports e Journal of Public Health Policy.

Os pesquisadores destacam que alertas sobre o colapso foram ignorados, incluindo notificações da White Martins, fornecedora de oxigênio,  sobre a iminente escassez de oxigênio e recomendações técnicas para manter medidas sanitárias. A escolha pela BR-319 agravou desigualdades, pois famílias mais ricas conseguiram comprar cilindros, enquanto a maioria da população ficou desassistida.

Os estudos recomendam a revisão das audiências públicas realizadas durante a pandemia para licenciar a BR-319, além da investigação das autoridades por omissão e uso político da crise. A manutenção da rodovia também amplia riscos sanitários, como a propagação de malária e o aumento do desmatamento, que pode facilitar o surgimento de novas pandemias. Os entraves em relação à pavimentação da BR-319 são antigos, como detalhou O Globo, e se estendem em cabo-de-guerra há décadas. Na pressão atual,  no início de abril o Senado já havia criado uma subcomissão para discutir o asfaltamento do chamado trecho do meio da rodovia.

BNC Amazonas, Amazonas 1 e Folha de Pernambuco repercutiram a disputa narrativa sobre a pavimentação da BR-319.

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