ClimaInfo, 27 de março de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Mais desmontes ambientais a caminho

O chefe da casa civil, Onyx Lorenzoni, aquele que admitiu ter usado dinheiro da Câmara na campanha de Bolsonaro, enviou um ofício ao ministro do meio ambiente encomendando a “extinção, adequação ou fusão” de conselhos cujos colegiados têm participação da sociedade. Anexo à carta, enviou uma lista de 23 vítimas potenciais. Caso Salles queira manter algum, deverá mandar uma justificativa até amanhã. Em seu blog na Folha de S. Paulo, Ana Carolina Amaral conta que “especialistas ouvidos pelo blog sob condição de anonimato alertam que a medida não garantiria processos mais ágeis, pois o governo precisaria absorver as competências dos conselhos extintos, criando processos internos de tomada de decisão. Eles também alertam que essa alternativa perderia a diversidade de pontos de vista dos vários setores da sociedade que compõem os órgãos colegiados.” Lorenzoni, que já provou desconhecer o funcionamento do governo no episódio da “despetização” da Casa Civil, mostra agora desconhecimento do funcionamento destes conselhos. Sequer percebeu que os comitês gestores do Fundo Amazônia e do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, além do CONAMA e do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, foram criados por lei e, portanto, só podem ser extintos pelo Congresso.

Ricardo Salles voltou à carga, invocando sua arma preferida: o pente fino. Daniela Chiaretti, conta no Valor que o ministro está debruçado sobre o Protocolo de Nagoya, analisando “cada critério do acordo, [para] ver quais os pontos favoráveis e quais os que oferecem alguma preocupação ao governo. E aí tomaremos uma decisão”. Daniela explica que “o Protocolo de Nagoya tem um mecanismo pioneiro de repartição de benefícios. Se houver algum ganho pelo uso da biodiversidade com o desenvolvimento de um cosmético ou um remédio de um laboratório estrangeiro, por exemplo, o país dono do recurso natural deve ser compensado, assim como as Populações Tradicionais que detinham aquele conhecimento.” O país assinou o protocolo, mas a assinatura precisa ser ratificada pelo Congresso, processo que está parado desde 2012. Não ratificando, o Brasil fica fora da mesa de negociação do Protocolo. Até gente do agronegócio diz que isso seria prejudicial ao país.

Para Andreia Sadi, d’O Globo, Salles falou sobre outro pente fino, o que está passando no Fundo Amazônia à procura de mal usos do dinheiro com as famigeradas ONGs. Com isso, Salles desconsidera as auditorias do BNDES, dos Tribunais de Contas e do governo norueguês. Ele acha que “não tem maneira de você verificar o resultado, ou seja, é um exercício de fé. Você dá o dinheiro para ONG e reza para que ela esteja fazendo um bom serviço” (Temos a dizer que exercício de fé, senhor ministro, foi o feito pela população brasileira quando escolheu os atuais gestores do bem público, tanto presentes quanto futuros). Com esta atitude, o ministro mostra não fazer a menor ideia de como funciona o Fundo Amazônia. Qualquer projeto lá aprovado tem metas claras, uma infinidade de indicadores de progresso e um cronograma com etapas e eventos claramente definidos.

Em tempo: ontem, citando um editorial da Folha de S. Paulo, dissemos que Salles era “réu acusado de improbidade administrativa”. Na verdade, ele já foi julgado e condenado em primeira instância.

 

Salles diz que governo está aberto a mais hidrelétricas na Amazônia

O falante ministro do meio ambiente achou por bem entrar na seara alheia dizendo que o governo está aberto a novas hidrelétricas na Amazônia. Salles explicou o que entende por licenciamento ambiental dizendo ser “importante lembrar: licenciamento ambiental não é um instrumento para dizer não. Ele é um instrumento para dizer em que condições sim.” Pelo jeito, no caso dos desastres da Samarco e da Vale, a condição era que uma auditoria assinasse um termo dizendo que estava tudo bem.

Além disso, o ministro falante agregou outra pérola ao seu baú quando disse que a não expedição da licença ambiental da linha de transmissão Manaus-Vista, trouxe, como consequência, a poluição das térmicas a diesel que operam em Boa Vista e a necessidade de se importar eletricidade da Venezuela.

O ministro demonstra, mais uma vez, seu desconhecimento da própria pasta e a coceira irresistível de opinar na pasta dos outros. A Folha aqui e a Reuters lá fora deram a notícia.

Em tempo: a não expedição da licença não tem nada a ver com a questão ambiental. O projeto prevê um trecho de mais de 100 quilômetros atravessando as terras dos Waimiri-Atroari, sendo que, leis nacionais e convenções internacionais exigem o consentimento deste povo para que se possa por lá passar os fios.

 

Fabricante eólico retoma operações no Brasil

A Vestas, fabricante dinamarquesa de turbinas eólicas, detém 25% do mercado global de aerogeradores e tem um faturamento anual de quase R$ 45 bilhões. O Brasil voltou a ser um dos mercados mais importantes para a empresa, tanto que ela tomou a decisão de ampliar sua fábrica no Ceará. Para Anders Runevad, presidente mundial da empresa, “o Brasil é um mercado chave para a Vestas. Estamos investindo nos últimos anos e vamos anunciar planos futuros quando forem relevantes. Estamos olhando para o mercado brasileiro de uma forma muito otimista e nossa ambição é ser o líder de mercado no país”. O mercado de eólicas sofreu uma redução durante a recessão e, nos últimos tempos, pela instabilidade política e do setor elétrico.

 

Perdendo oportunidades no transporte de carga

A ferrovia Norte-Sul, pensada como um eixo de ligação entre o Norte – Belém e São Luís – com o Sudeste, tem poucos trecho construídos e um trecho grande prestes a ser licitado. A ferrovia seria alimentada por ferrovias das demais regiões, principalmente do Nordeste e do Centro-Oeste. As várias tentativas de construí-la pararam ora por falta ora por desvios de verbas. A nova licitação deveria atrair vários proponentes. Mas, ao invés disso, só duas propostas apareceram: uma da Rumo e outra de um consórcio liderado pela Vale. A Rumo controla boa parte da malha ferroviária no Sudeste. Outros potenciais investidores desanimaram quando viram que haveria restrições ao direito de passagem tanto ao norte quanto ao sul. Ou seja, uma carga de Goiás correria o risco de não poder usar trechos da Vale, ao norte, ou da Rumo, ao sul. Com isso, o país pode perder quase que a única chance de dar um impulso real ao transporte ferroviário e deixar de queimar tanto óleo diesel em caminhões.

 

Tempestades ‘feias’ podem ser o novo normal

O pessoal do Observatório do Clima (OC) comentou a grande tempestade que chegou perto do Brasil nesta semana, grande o suficiente para ganhar um nome próprio – Iba. A Marinha, responsável por nomear as tempestades, explica que a palavra é o sufixo tupi-guarani de ‘feio’. Felizmente, o impacto da tempestade Iba não foi muito feio, pelo menos, não no litoral. Foram registradas ressacas nas costas do Espírito Santo, mas só. A novidade é a formação de tempestades fortes nas costas brasileiras. Em 2004, tivemos o Catarina, o primeiro furacão a atingir o país. Em 2010, outra tempestade tropical apareceu por aqui, um pouco mais fraca que o Iba. Para o OC, “embora com a mudança climática seja esperado que o aquecimento do mar produza novos ciclones tropicais – e eventualmente furacões – no Brasil, não é possível saber se estas supertormentas já estão ficando mais comuns: segundo a Marinha, as boias oceanográficas existentes hoje servem para a previsão do tempo e não para estudos climatológicos. Além disso, há poucas séries longas de dados. Pelo andar das tempestades, será preciso fazer este monitoramento. Algo difícil de imaginar hoje num país que tem ministros de Estado que negam o aquecimento global.”

 

O avanço global da Iniciativa Belt and Road chinesa

O presidente chinês Xi Jinping fez uma turnê pela Europa. Em Paris, Xi encontrou com um Macron que havia recentemente dito que “acabou-se o tempo de inocência europeia em relação à China”, sugerindo uma resposta robusta e coordenada por parte da União Europeia. Macron disse a Xi que era preciso mais reciprocidade nas relações entre Europa e China. Mas Xi patrocinou a assinatura de vários acordos sobre energia nuclear e energia renovável, além de um contrato de compra de aviões da Airbus no valor de US$ 40 bilhões. A Itália, enrolada com sua crise política e econômica, vê na Iniciativa Belt and Road uma fonte de financiamento para sua infraestrutura. Enquanto isso, a imprensa europeia manifestou sua preocupação com o desembarque de capital chinês no continente.

A Iniciativa Belt and Road continua progredindo em suas várias frentes, expandindo a infraestrutura da África, do Sudeste da Ásia e da Ásia Central. Os chineses vendem a ideia como uma nova versão da mítica ‘Rota da Seda’ medieval. Os financiamentos chineses vêm acompanhados de matéria-prima e materiais de construção ‘made in China’. Parte desta matéria-prima é carvão e parte da infraestrutura vem na forma de cimento e aço, tudo isso aumentando substancialmente as emissões de gases de efeito estufa. Uma matéria do Financial Times expressou esta preocupação.

Apesar de os chineses terem posições importantes em empresas brasileiras, os capitais aqui investidos não fazem parte da iniciativa Belt and Road. Pelo menos, ainda não, já que a inclusão da América Latina nos planos chineses parece estar a caminho. A viagem de Bolsonaro à China ainda não tem data, mas deverá servir para amolecer as retóricas anti-China do chanceler Araújo e de seu chefe. Por conta da próxima reunião dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) acontecer no Brasil, em outubro, analistas entendem que Xi deve propor adesão dos países da América Latina ao que ele chama de “projeto do século”, a Belt and Road.

Em tempo: o Energy Post publicou uma matéria sobre os avanços chineses na tecnologia de transmissão de eletricidade em ultra-alta-voltagem. A matéria mostra um mapa-mundi com fios ligando todos os continentes em 2050. Uma conexão deste tamanho faria com que as fontes renováveis deixassem de ser intermitentes, posto que sempre haverá locais com bons ventos e outros com muito sol durante todo o dia e todo o ano.

 

Mundo: usinas a carvão emitiram mais do que nunca em 2018

O último relatório anual da Agência Internacional de Energia (AIE) sobre as emissões globais de carbono traz informações sombrias. O Washington Post relata que “não só as emissões do CO2 que aquecem o planeta continuam a aumentar, como a crescente sede mundial por energia levou as emissões das centrais elétricas alimentadas a carvão a serem mais elevadas que nunca (…) A demanda por energia em todo o mundo cresceu 2,3% no ano passado, marcando o aumento mais rápido em uma década (…) Para atender a esta demanda, em grande parte alimentada pela expansão da economia global, os países recorreram a uma série de fontes, incluindo as renováveis. Mas nada se destacou mais do que os combustíveis fósseis, que satisfizeram quase 70% do crescimento da demanda por eletricidade”. O The Guardian acrescentou que “a jovem frota de centrais elétricas a carvão da Ásia é responsável por uma grande parte do aumento (…) A Ásia é agora responsável pela maior parte da produção mundial de energia a partir do carvão, e a idade média das centrais elétricas da região é de apenas 12 anos, o que significa que só chegarão ao final de suas operações dentro de 30 a 50 anos”. O diretor executivo da AIE, Fatih Birol, disse ao Guardian que “temos visto um aumento extraordinário na demanda global por energia em 2018, crescendo no ritmo mais rápido nesta década. O ano passado também pode ser considerado mais um ano dourado para o gás. Mas, apesar do grande crescimento das energias renováveis, as emissões globais continuam a aumentar, demonstrando mais uma vez que são necessárias medidas mais urgentes em todas as frentes”. O Financial Times salienta que “o aumento das emissões no ano passado – 560 milhões de toneladas – é equivalente à totalidade das emissões anuais da aviação. Foi o segundo ano consecutivo de aumento das emissões, após o período entre 2014 e 2016, no qual estas se mantiveram estáveis”. Birol disse também que, na Índia, “o ar condicionado se tornou um grande fator na demanda por energia. Aquecimento e refrigeração são um dos maiores impulsionadores do crescimento da demanda de energia”.

Enquanto isso, citando uma nova análise da Energy Innovation, o Guardian ressalta que “cerca de três quartos da produção de carvão dos EUA é agora mais cara do que as energias solar e eólica para o fornecimento de eletricidade às famílias norte-americanas”. O jornal acrescenta: “Os autores do estudo usaram arquivos financeiros públicos, além de dados da AIE para calcular o custo da energia das usinas a carvão e compará-los com as opções eólica e solar em um raio de 55 quilômetros. Eles descobriram que 211 gigawatts da atual capacidade de geração a carvão dos EUA, 74% dessa capacidade, estão fornecendo eletricidade mais cara do que as eólica ou solar.

E, por seu lado, a China coloca um pé no freio e outro no acelerador. No acelerador, a capacidade total das minas chinesas cresceu quase 10% no ano passado, passando de 3,5 bilhões de toneladas. No freio, mais portos chineses estão proibindo a entrada de carvão australiano e, agora, além do carvão usado para gerar eletricidade nas térmicas, os chineses estão deixando de importar o carvão de qualidade superior usado na fabricação de aço. Analistas acham que a birra contra o carvão australiano é uma represália pela posição que a Austrália tem tomado em relação às ambições chinesas no Mar da China Meridional.

 

Democratas exigem de Trump que cumpra o Acordo de Paris

O site Politico informa que os Democratas devem apresentar hoje uma proposta de legislação exigindo que os EUA cumpram com seus compromissos junto ao Acordo de Paris. Segundo o site, a proposta “é parte de uma blitz da deputada Nancy Pelosi e da liderança democrata para redirecionar a agenda da Câmara depois da entrega ao Departamento de Justiça do relatório do conselheiro especial Robert Mueller. Kathy Castor, presidente do Comitê Especial da Câmara dos Democratas sobre Mudança Climática, deve liderar hoje uma coletiva de imprensa para explicar como o projeto “manterá os EUA no Acordo de Paris pelo clima e exigirá da administração Trump a apresentação de um plano para o cumprimento das metas de redução de emissões em até 120 dias depois da promulgação da lei”.

 

Mudança do clima é tema de batalha entre Democratas e Republicanos no Congresso dos EUA

Depois do “Green New Deal” democrata e do “New Real Deal” republicano, acaba de ser retomado o “The New Manhattan Project for Clean Energy” para deixar bem claro que a mudança do clima está no centro da batalha que acontece entre Republicanos e Democratas no Congresso dos EUA. Segundo o site Axios, o senador republicano Lamar Alexander declarou nesta 2a feira que “a mudança climática é real e que as emissões humanas de gases de efeito estufa são uma causa importante – mas que o ‘Green New Deal’ dos Democratas é ‘tão à esquerda que ninguém vai levá-lo a sério'”. Como alternativa, o senador retomou seu plano de 10 pontos batizado “The New Manhattan Project for Clean Energy“, que se assenta no aumento do investimento em pesquisas tecnológicas em áreas como a nuclear avançada, a captura de carbono, os veículos elétricos e as baterias.

Enquanto isso, o New York Times informa que “o senador Mitch McConnell, líder da maioria, quer forçar os Democratas a tomar uma posição sobre o Green New Deal e seu ambicioso objetivo de vencer a mudança climática depois do surgimento de uma divisão entre democratas cautelosos e ativistas liberais que pressionam pela ação climática”. O New York Times acrescenta: “A resolução, que combina ação rápida para o estrangulamento das emissões de carbono e programas liberais de criação de empregos, fracassará nas mãos da maioria republicana. Muitos, se não a maioria, dos Democratas planejam se abster, argumentando que o Green New Deal está longe de ser uma peça legislativa completa, e que esta nem sequer passou por uma audiência”.

 

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