ClimaInfo, 14 de março de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Os índios que não querem o mundo de Bolsonaro

No De Olho nos Ruralistas, Clarissa Beretz foi até o Xingu para conversar com o cacique Aritana Yawalapiti, um dos mais antigos e respeitados da região. Falando sobre as opiniões de Bolsonaro sobre o desejo do índio se integrar à produção do mundo capitalista, a resposta do cacique é direta: o governo tem que respeitar o modo de vida de todas as tribos. “Não precisamos plantar soja. Temos a nossa roça, mandioca, milho, pesca, caça… O governo tem uma dívida histórica com os indígenas. Tomaram tudo o que tínhamos, principalmente dos parentes de outras etnias: terra, madeira, riquezas minerais. Então, tem mais é que dar melhorias. E sem contrapartida. Queremos internet, televisão, dentista? Sim, precisamos! Mas que respeitem a nossa forma de vida.”

Aritana Yawalapiti viveu com os lendários irmãos Villas-Bôas, de quem recebeu a recomendação: “Você é quem vai tomar conta dessa terra. Quando o branco entrar aqui, ele vai vir com papéis e panos coloridos para convencer vocês. No dia em que você deixar, acabou o Xingu.” Hoje, falando pelo WhatsApp, ele organiza o grupo com o filho e outros jovens graduados para defender seu território.

 

Brasil, o país das contradições

Luís Fernando Guedes Pinto aponta na Folha para mais uma das nossas contradições. De um lado, o “Brasil desponta como um dos países que abrigam uma das maiores biodiversidades e produção de alimentos do mundo”, mas, por outro, “estamos entre os maiores desmatadores e consumidores de agrotóxicos do mundo”. Luís Fernando fala da importância da biodiversidade para a produção sustentável de alimentos, como aparece em um recente relatório da FAO. Nesta perspectiva, o país aparece em posição privilegiada por abrigar a maior biodiversidade e um dos maiores volumes de terras agriculturáveis do planeta. Seria uma dobradinha imbatível, se tanta gente não se esforçasse para achar que o meio ambiente é um obstáculo ao desenvolvimento. Ele explica que o modelo do agronegócio exportador brasileiro é idêntico ao de qualquer outro grande exportador. “Se soltarmos um produtor de milho ou de soja de Ohio (EUA) em uma plantação no Mato Grosso, ele pensará que está em casa.”

No final, o chamado é claro: uma agricultura tropical precisa se apoiar na biodiversidade. “A diversidade de microrganismos, plantas e animais deve estar presente no solo, nos campos de cultivo e na paisagem. Isto não significa que não será produtiva e eficiente. Este é outro falso mito criado pelo status quo (leia-se grandes produtores e donos de terra, empresas de maquinário, de sementes, de agrotóxicos, etc.) para não mudar o que lhes interessa.”

A torcida é para que os deputados e senadores evocados no final do texto escutem o chamado.

 

Apesar do que diz um deputado, carro movido a diesel emite mais do que os movidos a gasolina no Brasil

O deputado Coronel Tadeu ouviu, sabe-se lá onde, que carros de passeio movidos a diesel emitem menos gases de efeito estufa do que os movidos a gasolina e, por isso, dentre outras, quer liberar a vendas desses carros no país por meio de um decreto legislativo. Mesmo levando em conta a maior eficiência dos motores a diesel, o deputado esqueceu de colocar em sua conta que a gasolina brasileira tem 27,5% de etanol e, assim, suas emissões são menores no Brasil. Mas o pior da eventual liberação do uso do diesel em automóveis não seriam as emissões de gases de efeito estufa, mas sim toda a poluição que a queima de diesel joga na atmosfera na forma de óxidos de nitrogênio e material particulado. Pilhas de artigos científicos e de políticas públicas de países mais civilizados que o nosso proíbem a circulação de carros a diesel em centros urbanos. No momento em que o mundo briga para reduzir suas emissões, o deputado quer jogar todo este esforço no lixo.

 

Solar fotovoltaico continua crescendo e atraindo investimentos

Segundo os últimos dados da Absolar, a capacidade instalada das 73 usinas de geração fotovoltaicas no país passou de 2 GWp – isto é, no melhor momento do dia, com o sol a pino, elas estariam entregando uma potência maior do que Angra 1 e Angra 2, as duas usinas nucleares brasileiras, o que não deixa de ser um marco importante. Em nota, Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar, diz que os investimentos privados no setor somam mais de R$ 10 bilhões desde o primeiro leilão em 2014.

A GreenYellow, empresa controlada pelo grupo Casino, anunciou que irá investir R$ 300 milhões para acabar de montar quatro plantas fotovoltaicas e começar outras seis. No final, a GreenYellow acrescentará mais 50 MWp ao seu portfólio.

 

O custo e o trabalho que dá desmontar uma usina nuclear

Construir uma usina nuclear custa caro, talvez menos que a usina de Angra 3 custará ao Brasil, mas desmontar a usina ao final da sua vida útil também sai muito caro. Um exemplo disso é o desmonte da usina de Mülheim-Kärlich que começou em 2004 e só terminará em 2023. Uma usina de mesmo porte custaria, hoje, por volta de US$ 6 bilhões para construir e os alemães gastarão US$ 1,2 bilhões e 20 anos para desmontá-la. O governo alemão ainda não encontrou um sítio seguro para depositar o combustível nuclear radioativo dessa usina. Para piorar, esse material continua sendo perigoso durante a vida média dos seus componentes: no caso do plutônio, por exemplo, ela é da ordem de 500 mil anos. Não há como garantir a segurança de um sítio por esse tempo todo. Outro problema é com o material da planta em si – o aço, o concreto e os demais metais. Por enquanto, eles ficam estocados até que a radiação de cada peça caia abaixo de seus respectivos níveis de segurança. Depois, o material é reciclado ou disposto em aterros. Mesmo os alemães, com toda a fama de cuidado e zelo, temem que um pedaço de metal radioativo acabe virando um aparelho dentário de uma criança e que o tal nível mínimo acabe se revelando bem perigoso.

O ministro de minas e energia, Almirante Bento Albuquerque, tem dito que terminar a obra de Angra 3 é estratégico para o país. Mas ninguém fala que nós também não temos onde estocar o combustível nuclear usado. Por enquanto, o combustível usado de Angra 1 e 2 fica dentro dos reatores e o mesmo acontecerá, se e quando Angra 3 começar a funcionar. Ao que se saiba, não há planos concretos do que fazer com o combustível usado quando elas forem sendo desativadas. E talvez valha a pena abrir uma caderneta de poupança para cada usina, para o dia em que começar seu desmonte.

A notícia do desmonte da usina alemã saiu na Deutsche Welle e na Ambiente Brasil.

 

Projeto de lei quer proibir o fracking de uma vez por todas no Paraná

O projeto de lei paranaense que proíbe definitivamente a aplicação do fracking para extração de óleo e gás de folhelho acaba de passar pela Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do estado. A tramitação do projeto segue agora para o Plenário da Casa. Caso ele seja aprovado pelos deputados estaduais do Paraná, a proibição do fracking irá para sanção do governador do estado. A 350.org comemorou mais esse passo.

 

Respostas à carta dos negacionistas

A respeito da carta que um grupo de autodenominados cientistas enviou ao ministro do meio ambiente, o Observatório do Clima publicou duas matérias ótimas. A primeira, de Alexandre Costa, foi atrás de muitos dos dados e das informações que os negacionistas escreveram e mostra como estão completamente errados. Aliás, logo de cara, Costa avisa que, fossem cientistas, os autores teriam colocado a fonte desses dados e informações. A carta, assim, repete a mesma tática das fake news que o então candidato Bolsonaro postava diariamente. Para pegar um exemplo, Costa pegou a afirmação de que “há 6.000-8.000 anos (…) os níveis do mar atingiram até 3 metros acima dos atuais” para contrapor que “a literatura científica indica que os oceanos estavam na realidade em níveis mais baixos” do que os atuais. Recomenda-se a leitura tanto para quem acreditou na carta negacionista como para quem quer se precaver para debates parecidos.

No segundo artigo, Claudio Angelo conta que a carta é basicamente uma versão requentada de outros documentos que parte deste grupo publicou. E traz uma divertida investigação sobre quem são e qual a (des)qualificação dos autores.

Novo no Climainfo, outro artigo a respeito da carta.

 

O Green New Deal e a precificação do carbono

O Congresso norte-americano será palco de um enfrentamento entre duas visões distintas de como atacar o aquecimento global. De um lado, estão um grupo de democratas novatos, apoiados por um movimento de jovens que tem como figura-símbolo a deputada Alexandria Ocasio-Cortez. Junto com o senador democrata Edward Markey, a deputada apresentou  o chamado Green New Deal, um projeto inspirado em New Deal implementado pelo governo de Franklin D. Roosevelt em 1933 para tirar os Estados Unidos da Grande Depressão. O Green New Deal propõe um megainvestimento governamental para transformar a matriz energética americana em uma 100% renovável. Para seus proponentes, só o Estado tem a capacidade de forçar essa transição e viabilizar um limite ao aquecimento da temperatura terrestre abaixo dos 2oC. Do outro lado, estão os congressistas democratas mais velhos e conservadores e que contam com um número expressivo de republicanos entre eles. Esse segundo grupo propõe colocar um preço nas emissões e deixar o mercado achar o caminho e os tempos para que a transição energética aconteça.

A matéria do Inside Climate New diz que esse tema será um dos eixos das campanhas presidenciais pelo lado democrata no ano que vem. Já do lado republicano, a coisa é mais árida: Trump e cia. não querem nem ouvir falar em mudança climática. Para eles, o Green New Deal reforça o estereótipo dos democratas de defensores da irresponsabilidade fiscal e de interferirem na vida dos cidadãos.

Enquanto isso, na Holanda, o governo anunciou, ontem, que irá submeter ao Parlamento uma lei introduzindo um imposto corporativo sobre as emissões. Depois do desastre de comunicação na França, que acabou servindo de estopim para uma crise em nível nacional, os prudentes holandeses preferiram cantar a bola antes e ter tempo e espaço para discutir a medida antes de colocá-la em campo.

 

Amanhã o mundo verá seus jovens lutando contra a inação frente à crise climática

Amanhã, 15 de março, centenas de milhares de jovens de todo o mundo não irão às aulas em defesa de seu próprio futuro. Eles exigem que os líderes de governos e de corporações tomem as medidas drásticas imprescindíveis para conter o aquecimento global. No Brasil, acontecerão manifestações em cidades como Belo Horizonte, Brasília, Florianópolis, Goiânia, Juazeiro do Norte, Mogi das Cruzes, Peruíbe, Recife, Rio de Janeiro, Santa Maria, Santos, Socorro e São Paulo. No mundo, elas acontecerão em quase 100 países. Este mapa mostra onde acontecerão as manifestações no mundo.

Em seu editorial publicado ontem, o New York Times conta como esse movimento foi se espalhando pela Europa e pelos EUA. O texto termina com uma frase de Greta Thunberg, a adolescente sueca que inspirou os jovens a entrar em greve, dita na Conferência do Clima de Katowice, no ano passado: “Nós não viemos aqui para implorar aos líderes mundiais que prestem atenção. Vocês nos ignoraram no passado e irão nos ignorar novamente. As desculpas se esgotaram e o tempo está se esgotando. Viemos aqui para avisá-los de que a mudança está vindo, quer gostem ou não”.

 

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